Shawn
– Era meu tio favorito. Pobre tio Willie! Vou sentir muito a falta dele.
Girei os olhos para cima, de tédio, e entornei o resto do meu chopp num gole só, ouvindo Drew, meu melhor amigo, sentado no banco do bar ao meu lado, tentando seduzir uma das garçonetes.
– Ohhh, pobrezinho, você deve estar arrasado! – disse-lhe ela, acreditando naquele papo furado e passando as mãos pelos cabelos dele, para consolá-lo.
– Devastado. Estou praticamente de pau duro de tanto luto.
– O que foi que você disse? – perguntou a garota. – Não consegui ouvir o final da frase, a música está alta demais.
Dei uma risada de deboche e olhei por cima da cabeça da garçonete, tentando fazer contato visual com Drew, com uma cara que expressava claramente: "Não acredito no que você acabou de dizer!"
Ela deu um beijo na bochecha dele, Drew deu um tapa na bunda dela e os dois se separaram. Drew girou o banco e tomou, lentamente, um gole da cerveja.
– Seu tio Willie morreu faz dois anos. E você odiava o sujeito – lembrei a Drew.
Ele bateu a caneca de chopp no balcão com força e se virou para ficar de frente para mim.
– Será que você já se esqueceu da tremenda cara de pau dos malucos do filme Penetras bons de bico, Shawn? O luto é o afrodisíaco mais poderoso que existe, meu camarada.
Drew era meu melhor amigo desde o jardim de infância. Mesmo assim, algumas das coisas que ele me dizia ainda me deixavam atônito. Mas a verdade é que era um bom amigo, me dava a maior força nos momentos de sufoco e dor; isso me ajudava a fazer vista grossa e desconsiderar seu jeito detestável e seu comportamento de "galinha" com as mulheres em geral.
Drew chamou a garçonete e pediu duas doses de tequila. Se continuássemos naquele ritmo, eu sairia do bar em cima de uma maca. Meus órgãos já começavam a entrar em falência múltipla por haver poucos vestígios de sangue em minha corrente alcoólica, e tive a impressão de ter ouvido um pequeno duende dentro do meu cérebro dizendo: "Perigo, alerta vermelho!", enquanto esculhambava com minha visão.
Drew e eu trabalhávamos na mesma fábrica de automóveis e tínhamos sido transferidos recentemente da unidade de Toledo, para outra que ficava a algumas horas de viagem, em Butler. Quando morávamos em Toledo nós dividíamos um apartamento, mas depois de dois anos ouvindo-o comer toda a população feminina das páginas brancas, das páginas amarelas e de mais oito diretórios de diversas empresas em um raio de quase vinte quilômetros, decidi que deixar de dividir um espaço exíguo com ele era uma necessidade em minha vida. Ainda faltava esvaziar toneladas de caixas na nova casa em estilo alojamento que eu tinha alugado, e já começava a me arrepender por ter deixado Drew me convencer a afogar minhas mágoas no balcão de um bar.
Se bem que ele me conhecia o bastante para ter certeza que àquela hora, se eu estivesse em casa, não estaria esvaziando porra de caixa nenhuma. Certamente estaria sentado sozinho, olhando para a foto da minha ex-namorada feito um pamonha, me perguntando por que eu desperdiçara tantos meses da minha vida ao lado dela.
A bartender despejou as doses, deixando a bebida transbordar. Drew agarrou ambas com sofreguidão, me entregou uma e ergueu a outra no ar. Relutante, fiz o mesmo com a minha e tentei me concentrar na difícil tarefa de manter a mão firme enquanto o resto do bar adernava.
A mão vazia de Drew voou e me agarrou pelo cotovelo, me sacudiu com força e derrubou um pouco da tequila na minha mão.
Opa, acho que era eu que estava tombando de lado, não o bar.