After You [CONCLUÍDA]

× novo passo ×

"Vi o mundo girando em meus lençóis
E mais uma vez não consigo dormir
Saio pela porta e subo a rua
Olho para as estrelas
Olho para as estrelas caindo
E me pergunto onde
Foi que eu errei"

(James Blunt - Same Mistake)

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— A empresa vai falir se você continuar dando uma de Robin Hood. - Milan diz, parecendo irritada com a minha decisão.

— Tudo bem. - dou de ombros.

Ela me encara cética, como se eu não soubesse sobre o esquema que ela e Elizabeth armaram em minhas costas. Ver uma das minhas melhoras funcionárias mentindo e me traindo de forma deslavada era algo que eu já esperava.

Porque as pessoas são assim. Eu já fiz isso.

— Tudo bem? Você não se importa de voltar para a sarjeta? - questionou, rindo.

— Essa editora foi fundada manchada com sangue de pessoas inocentes, Milan. Acho justo que acabe falindo honrando a vida de cada família que deixei morrer. - digo, sabendo que ela e sua ganância jamais entenderiam o que eu quero dizer.

Consigo ver a Camila de anos antes em Milan, e agora entendo tamanha decepção. Meus pais quando souberam de tudo dias atrás mal conseguiram olhar pra mim.

Me afoguei no trabalho para não ter tempo de pensar, pois pensar me sufoca. Decepcionei todas as pessoas que amo, e agora estou sozinha, arcando com o peso disso.

Descobri os milhões de dólares desviados por Milan e Elizabeth, que arquitetou direitinho o golpe, que teria dado super certo se eu não tivesse escutado uma ligação entre as duas.

Agora tenho um plano.

Promover mais eventos beneficentes para autores iniciantes, e fazer alguns jantares em orfanatos. Existem outras possibilidades também, mas organizar tudo sozinha está me matando.

— Isso é loucura. - comenta.

Loucura? Ela sequer se importa com a merda que fiz.

— Loucura é fechar os olhos enquanto há pessoas passando fome e crianças sendo abandonadas. Isso é loucura. - constatou, passando as mãos nas têmporas.

Odeio essa dor de cabeça maldita.

— Falar disso agora é fácil, não acha?

— As pessoas mudam, Milan. Ninguém precisa se agarrar a escuridão a vida inteira, e eu estou farta de ficar presa na merda do meu passado. - argumento, e ela continua me observando sem entender onde quero chegar - Estou abrindo mão do que tenho pra me redimir. Cansei de ser vazia e... Solitária. Quero que um dia meus pais possam olhar pra mim e ter orgulho. Não que isso seja possível depois do baque que foi a revelação, mas... Sonhar ainda é grátis. - suspiro.
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Quando terminei de assinar a papelada e a reunião deu-se por encerrada, finalmente consegui respirar sem parecer que morreria a qualquer momento.

Estava feito.

Milhares de crianças e famílias carentes seriam beneficiadas com brinquedos, comida e cursos. Investi cada centavo que ganhei com a editora nisso, incluído o dinheiro que guardei para emergência.

Seria a maior ação social promovida em Seattle e eu estava orgulhosa de mim, depois de anos.

Meus pais ainda não falam comigo, nem mesmo Lara, então no meu tempo livre caminho pela cidade. Apesar do tanto de coisa que vem acontecendo, me sinto mais leve.

Estou emocionalmente e fisicamente esgotada, mas com a meta cumprida. Agora basta aguardar as coisas acontecerem.

Entro em uma lanchonete e peço um café forte, enquanto aguardo pelo líquido quente, observo duas crianças com seus pais sentadas numa cadeira, dividindo sorvete.

Sorrio ao lembrar de Abby.

Sinto falta daquela garotinha corajosa e fofa. Do seu sorriso e jeito de encantadas as pessoas ao seu redor. Sinto falta do que ela me fez ver.

E sinto falta do pai dela.

Não tenho notícia deles há dois meses, pode ser que nem estejam mais na cidade, e meu peito dói só de imaginar que as coisas nunca mais voltarão ao que eram.

Fiz o único bom que conheci me odiar, e talvez eu mereça um prêmio por isso. Lamento dando ter partido seu coração depois de vê-lo seguindo em frente. Agora tudo o que posso fazer é desejar que os dois estejam bem.

— Camila? - uma voz me chama e eu me empertigo.

Luciana, melhor amiga de Shawn se aproxima e quando faz menção de sentar na cadeira de frente pra mim, assinto.

Não posso negar que uma parte de mim deseja arrancar dela qualquer informação sobre Shawn e Abby, mas mantenho o que sobrou do meu juízo.

— Como você está? - indaga.

Depois de ser devidamente servida, começamos a conversar sobre diversos assuntos, e ela logo aponta que andou acompanhando todas as minhas ações nesses últimos meses, e que está feliz por mim.

Não falamos sobre Shawn durante boa parte do diálogo, e eu temia que a qualquer momento ela fosse dizer que ele está com outra pessoa.

— Acho que você deveria falar com ele. Já se passaram três meses, os pensamentos são outros, e ele tem visto seus esforços. - disse.

— Ele não vai me perdoar. Nunca.

— Só vai saber se falar. Vocês dois se amam, Camila. Está na hora de seguir em frente. A Abby ainda fala de você, e Shawn tem dias que está numa fossa que só Deus... - garante - Só quero ver meu amigo feliz. E sei que se conversarem, vão se resolver. - diz.

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Refleti sobre a conversa com Luciana durante o caminho até o apartamento, e decidi escutar sua sugestão. Talvez ainda haja esperança. Talvez Shawn possa me perdoar e eu possa lhe provar que não sou mais aquela mulher ruim.

Tomo um banho rápido, troco meu vestido justo por calças, horas e uma jaqueta. É agora ou nunca.

Saio de casa, entro no veículo e dirijo até a casa dele. Pelo menos ele ainda mora no mesmo lugar. Assim que estaciono escuto o barulho de uma festa numa casa do outro lado.

Fico imaginando Shawn se irritando com os adolescentes barulhentos enquanto tenta colocar Abby para dormir depois do banho. Consigo vislumbrar os dois juntos, ela sorrindo enquanto se aninha em seus braços pra assistir algum filme da Barbie.

Saio do veículo, e quase escorrego na neve. Caminho em direção a casa, mas paro de andar. Talvez não seja uma boa ideia.

Já atrapalhei demais a vida dos dois, e acho que ambos merecem ter um final feliz, mesmo que sem mim. Pondero sobre continuar ou não, e sendo a boa frouxa que aprendi a ser, me viro pra voltar pra casa.

Então eu os vejo atravessando a rua.

— Tia Camis?