Capítulo 15

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Vila Magnólia, São Paulo — 07.11.1989

Querido Bernardo,

Ontem você segurou meu rosto entre as mãos como se eu fosse seu maior tesouro. Eu vi como seus olhos brilhavam naquela meia-luz da madrugada e pensei: "Tudo que preciso está bem aqui". Minha felicidade está na ponta dos seus dedos, no modo como tocou meus lábios antes de me beijar. Como se fosse um segredo. O nosso segredo.

Eu fiquei na ponta dos pés pela primeira vez. Na ponta dos pés para beijar o rapaz por quem eu sou ridiculamente apaixonado. E isso deve soar patético vindo de um garoto que ainda está aprendendo a amar outro garoto, mas eu não me importo.

Eu perdi o ar pela milionésima vez quando você me beijou. De novo, de novo e de novo. Meu coração bateu de um jeito estúpido quando seu olhar sonolento encontrou o meu pela última vez na noite passada, seu queixo meio apoiado no meu ombro enquanto você lutava contra o sono. E não me importaria de vê-lo daquele jeito todos os dias pelo resto da vida.

Porque eu quero ficar com você, Bernardo.

Enquanto o nosso "para sempre" durar.

『▪▪▪』

Bernardo atravessa a sessão de filmes musicais como se fosse a primeira vez que visita uma videolocadora. Elas estão por toda parte e são bastante populares, principalmente quando se está à procura de alguma obra estrangeira.

O garoto olha para todos os lados deslizando a ponta dos dedos sobre as capas coloridas. Há milhares de fitas com nomes desconhecidos e atores mais desconhecidos ainda. Ele não parece se importar. Preciso segurar em sua camiseta para que Bernardo não acabe indo parar na sessão de filmes eróticos por engano, atrás de uma cortina vermelha nada discreta. Não tenho boas lembranças. Da última vez, fui enxotado dali quase a pontapés ao tentar alugar um filme proibido para menores.

Ele pega Os Embalos de Sábado à Noite e cutuca a minha cintura.

— Esse é sobre dança, Caio.

O baixinho sabe que adoro dançar, mesmo nunca tendo me visto fazer isso antes.

— É o mesmo ator de Grease — digo após dar uma espiada na capa. — Ele deve ser popular. Podemos levar esse também, se você quiser. — Dou batidinhas no bolso da bermuda, para que o ruído agudo das moedas tente convencê-lo de que tenho dinheiro mais do que suficiente. — Você é quem manda, chefinho.

— Podemos levar esse na próxima.

Concordo com a cabeça, esboçando um sorriso.

— Isso significa que vai ter uma próxima, certo? Você me deixa tão ansioso, Bernardo. — Solto um suspiro exagerado. — É por isso que gosto de você.

O garoto rapidamente cobre minha boca com a mão, olhando para o homem atrás do balcão na entrada, que parece muito mais entediado tentando desenrolar o filme de uma fita do que interessado na nossa conversa.

Dou risada contra a pele da sua palma e ele sorri de volta, franzindo a testa com sua expressão reprovadora.

— O que eu faço com você, Caio? — ele murmura quase para si mesmo, estalando a língua.

Apenas me beije para o resto da vida, é o que quero dizer. Mas não digo nada. Apenas dou de ombros e caminho ao seu lado até o caixa, a fita de Grease – Nos Tempos da Brilhantina contra o meu peito numa espécie de abraço.

— Você precisa aprender a suportar as minhas idiotices — digo enquanto saímos da videolocadora com o filme dentro da sacola e muitas moedas a menos nos bolsos da minha bermuda.

Querido BernardoOnde histórias criam vida. Descubra agora