18 • Guilty

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As primeiras vezes são quase sempre inesquecíveis.

Ainda me lembro dos primeiros amigos, do primeiro tombo de bicicleta, da primeira nota baixa, dos primeiros dias como universitário. Da primeira briga suicida na cantina do colégio com alguém grande demais, forte demais.

Lembro de quando me declarei e beijei alguém pela primeira vez, de quando fiz xixi nas calças e de quando, ao errar, precisei me arrepender.

E no meio de tantas outras primeiras vezes tão peculiares, tão minhas, eu ainda me lembro da primeira em que disse "eu te amo".

Foi para minha mãe, no auge dos meus cinco anos, enquanto ela se esforçava para me entregar uma definição do verbo que fosse capaz de comportar toda sua grandeza e significância.

Depois, disse para meu pai. Porque, apesar de seu jeito introvertido e rabugento, eu o amava. É, eu o amava. E ainda amo, acima de qualquer uma de nossas diferenças.

Desde cedo, no entanto, luto contra essa dificuldade em expor minha vulnerabilidade. Luto com a sombra das minhas dúvidas, com o medo e com a incerteza que são alimentados por meus gremlins¹ internos.

"Eu não sou bom o suficiente" ou "não sou digno de amor" não são as únicas coisas que eles repetem vez atrás de vez sobre meus ombros e dentro de minha consciência.

O que eles dizem, e o que me esforço para contrariar todos os dias, é que não sou capaz de amar ou de me entregar por completo a qualquer emoção. Que não sou capaz de levar o sentimento adiante depois de verbalizá-lo pela primeira vez. Que nunca fui.

Talvez esse pensamento autodestrutivo tenha base fixa em minhas primeiras experiências românticas completamente frustradas. Não para mim. Mas para todos aqueles que já passaram por minha vida e que, invariavelmente, acabaram saindo com menos do que trouxeram quando concordaram em estar ao meu lado.

Mãos abanando seria o termo. Mas, mais precisamente, eles saíram com saldo negativo. Trouxeram amor. Levaram um pé na bunda. Levaram desafeto e a certeza de que Kim Taehyung não sabe amar. Não sabe demonstrar. Sabe menos ainda se importar devidamente com qualquer um que desperte sentimentos mais profundos.

Às vezes, me lembro de minha mãe dizendo que a vida implora por contato humano. Implora por ser vivida em toda sua potencialidade, com todos os erros e acertos possíveis e inevitáveis. Ela dizia para não guardar o que sinto dentro da minha caixinha mágica e, por algum tempo, sinto que deu certo.

Até o acidente, eu dizia e fazia muito mais do que, hoje, penso ser possível. Mas então as coisas mudaram, e de repente a habilidade de me expressar se converteu em um emaranhado de sentimentos confusos que, por ficarem presos tão no fundo, sequer conseguem ser alcançados na maioria das vezes.

Então, quando Jungkook olha nos meus olhos e me pergunta o que sinto por ele, é quase automático o modo como me pego intimidado, ansioso e incerto.

Porque, tão de repente, ele me tira de minha zona de conforto e me obriga a ter que lidar com essa minha falta que é a incapacidade de expressar o que sinto na mesma proporção que me esvazia do poder da fala e me sufoca em minhas próprias incertezas.

Eu me pergunto, por fim, se estou mesmo apaixonado por ele ou se é só mais um de meus mecanismos destrutivos tentando massacrá-lo como fez com todos os outros desde que me entendo por gente.

E sinto medo, porque Jungkook está longe demais de merecer passar pela mesma fila de decepção que meus outros casos românticos enfrentaram.

Por tudo isso, talvez, minha resposta imediata a sua pergunta tão inesperada sai praticamente chutada da garganta, de modo que Jungkook parece perceber o momento exato em que ergo minhas defesas internas e armo meu rifle de assalto.

Rose-Colored Boy ❧ TaekookOnde histórias criam vida. Descubra agora