20 • All of me

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''Talvez devêssemos parar de tratar um ao outro como amigos.''

A frase que acabei de vomitar é inconsequente. Ela ecoa pelo quarto e, depois de um tempo, retorna aos meus ouvidos apenas para martelar nos lugares mais recônditos de minha cabeça. Afinal, o que eu estava pensando?

O que eu posso estar querendo que aconteça a seguir? O que estou esperando? Uma resposta? Uma risada? Um chute nas bolas?

Um chute nas bolas. Definitivamente um chute nas bolas.

Fecho os olhos quando o silêncio se prolonga por tempo demais, forjando uma tentativa tosca de fugir da responsabilidade do que acabei de dizer. Estou com vergonha, uma que tenho a alegria de poder dizer que senti pouquíssimas vezes em minha vida. Mas ela está aqui agora, e me lembrar de sua ínfima participação em meu passado não alivia nem um pouco seus efeitos no presente.

Eu estou porcamente escondido pelas mãos, refletindo sobre a necessidade de ouvir uma resposta quando Yoongi sai do banheiro.

- Aquela privada é horrível - é o que ele resmunga quando passa por nós, sem parecer notar a nuvem de tensão e desconforto que satura o ar a nossa volta.

E se Jungkook pretendia responder, bem... ele não pode mais. O momento deixa de ser oportuno, e de repente estou ocupado arrumando um colchão para mim, já que Yoongi faz questão de dormir na cama e só há espaço para que duas pessoas durmam confortavelmente.

Talvez seja melhor assim, penso. Pelo menos, vou poder relaxar o corpo e absorver o ar normalmente sem ter que controlar o ritmo com que o puxo para dentro. Então, como prêmio de consolação, ao menos terei uma boa noite de sono.

Certo?

Mas estou errado.

E descubro isso ao longo da madrugada que se arrasta lentamente, mantendo-me como refém enquanto suas horas esmagam meus olhos e consomem meus pensamentos até que a única coisa que reste de mim seja o grande par de olheiras escuras que encaro no espelho ao amanhecer.

- Cara, você tá horrível... - Yoongi faz questão de enfatizar logo que desperta pela manhã, mas meu humor está ainda pior do que minha aparência, de modo que simplesmente o ignoro e dou as costas para o que quer que ele estivesse planejando dizer a seguir.

Quando o alarme toca, é unânime e silenciosamente deliberado que Jungkook vá embora antes que meu pai acorde, de forma que não conseguimos sequer mencionar o assunto do dia anterior. Yoongi o acompanha, e a última coisa que sei é que os dois caminham juntos na direção em que se encontra o ponto de ônibus mais próximo.

Talvez tenha sido melhor assim. É muito provável que, se ele me perguntasse, naquele momento, o que quis dizer com ''talvez devêssemos parar de tratar um ao outro como amigos'', eu respondesse que deveríamos nos tratar como inimigos.

Pelo resto do dia, me ocupo com tentativas patéticas de fazer um pão de batata recheado com queijo. São necessárias quatro fornadas até que eu finalmente me dê por vencido e aceite que sovar massas não é uma das minhas melhores qualidades.

E então, eu checo o celular pela caralhésima vez, com esperanças de ver o ecrã brilhar com uma mensagem dele, mesmo que meus ouvidos atentos não tenham captado nenhum som minimamente parecido com o assovio das notificações.

Qual é! Eu tive que silenciar todos os meus contatos para não ficar iludido a cada notificação que apita no celular. Isso não pode ser saudável.

- Ei.

Minhas mãos tremem e o celular pula dos meus dedos quando ouço a voz de alguém que se aproximou sem que eu percebesse.

- Oi... - aperto as sobrancelhas, confuso. - Hoseok?

Rose-Colored Boy ❧ TaekookOnde histórias criam vida. Descubra agora