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Bella

"Que cheiro horrível é esse?"- Apesar de ter que madrugar para uma entrevista que a Camila arranjou pra mim, estou de bom humor. Dou um abraço nela, que me da uma careta. Ela sabe que eu to brincando.

"Sou eu, fazendo o café da manhã, ingrata. Depois leva um soco e não sabe porque."

Eu rio e pego café.
"Não sei o que é mais estranho: eu acordando cedo ou você cozinhando."

Ela revira os olhos, virando os ovos mexidos. Só de sentir o cheiro meu estômago ronca alto.
"Vai colocar uma roupa decente e rebocar essa cara de muffin amassado porque deu trabalho pra arranjar essa entrevista pra você."

Me afundo na cadeira.
"Ah nãaaaaao..."- Esqueci de avisar que eu sou a rainha da preguiça?

Ela bate a espátula de silicone na minha mão.
"VAI LÁ AGORA, ISABELLA FERRETTI. OU EU TE DEIXO PASSAR FOME."

Ergo as mãos, me rendendo.
Subo rapidinho para o meu quarto e me arrumo. Não exagero,optando pelo meu terninho cinza, a calça jeans e a blusinha preta, meus Adidas. Faço uma make leve, já que quero causar uma boa impressão, borrifo perfume, mas não muito e desço.

A mesa já estava servida. A chave do pai da Cami não estava na bancada, como antes. Ele já foi trabalhar. A mãe dela provavelmente foi na floricultura. Eu praticamente nunca encontro com eles, o que é meio estranho, como se eles estivessem fugindo de mim.

Dou de ombros mentalmente.
Lógico que eles não estão fugindo de mim. Não teriam me deixado ficar se não quisessem me ver, não é mesmo?

Como tudo e pego a bolsa. Confiro se o currículo e os meus documentos estão nela e saio, não sem antes deixar a Camila me dar a bênção dela. Não sei porque ela adora fazer isso. Talvez seja a forma dela de me deixar tranquila.

Pego o ônibus mesmo, que está vazio por ser 8:10. Sento no fundão, apesar de não haver mais ninguém de passageiro e ponho os fones, enquanto encosto a cabeça na janela. Adoro ouvir música enquanto a cidade amanhece aos meus olhos, e é exatamente o que eu faço durante os 20 minutos.

×××
O prédio é de luxo, coberto com vidro. O sol refletia na vidraça e a visão do edifício era realmente agradável. A luz tampava o nome da empresa, mas eu não me importo.

Preciso do trabalho pra pagar para eles tudo o que estão fazendo por mim e para seguir com a minha vida também. Não posso mais fingir que ta tudo bem e ficar esperando as coisas acontecerem.

Ajeito a bolsa no ombro e empurro a porta também de vidro. A recepção do prédio parece de filme, bem decorada, leve e perfeita. Eu poderia morar ali tranquilamente, de tão confortável e ajeitado.

Dou meus dados para uma das recepcionistas, que me leva até o último andar e me guia por um corredor longo.
"Espere aqui, por favor."

Eu me sento na poltrona de couro. A vista é linda e o luxo nesse andar é ainda maior. Esculturas de mármore eram vistas em vários pontos, tão perfeitas que pareciam pessoas de mármore.

Os ruídos leves da fonte deixavam o cenário ainda melhor.
"Srta Ferretti?"- Eu me viro para a recepcionista, que sorri.-" Sr Mendes pede que entre."

Sr Mendes? Mendes de tipo Shawn Mendes? Não pode ser. É muita coincidência.

"Com licença. Poderia me informar qual o nome da empresa? Eu esqueci."- Ela ainda sorria educadamente.

"Mendes Co, Srta Ferretti."- Ela percebe meu choque e fica alerta.-" Algum problema?"

Forjo um sorriso e luto para manter a compostura. Não posso estar tão transparente assim quando tiver que lidar com ele na sala dele. Quando estiver só eu e ele.

Nos últimos dias, só ele esteve na minha cabeça. Principalmente por causa da história dele. Eu tenho total acesso e isso me deixa confusa. Entre tantos empresários importantes, por que justamente ele? E ainda tem a confusão da boate. Nas câmeras, ele sai de lá me carregando, mas no hospital, me disseram que foi o Yatra que me encontrou e me levou até lá. O reconheceram. Ele deu entrada comigo.

"Não, nenhum. Obrigada."
Ela sorri novamente, parecendo aliviada. Ela é treinada para lidar com quais tipos de situações? Parecia prestes a fazer algo antes da minha resposta. Não quero imaginar a resposta para a minha pergunta.

Eu respiro fundo e empurro a porta enorme de madeira cara. A placa de ouro informava que Sr Shawn Mendes é o presidente da empresa. Com o que eu vou ter que lidar? Por trás da porta, está o homem que, de certa forma, apesar de saber a história dele, eu não sei nada sobre.

E ali está ele, tão bonito quanto eu me lembrava. Aqui, no mundo dele, parece ainda mais destemido e à vontade. Ele tem tudo e todos nesse prédio nas mãos. Quem não se sente poderoso assim?

Shawn se levanta da poltrona de couro e, com passos longos, logo está na minha frente. Seus olhos brilham de tentação e perigo. Ele está tão perto que sinto a sua respiração quente e intensa no meu rosto, devido a nossa diferença de altura.

Parece assustador e divino, ao mesmo tempo. Todo de preto, com a camisa aberta dois botões e o mesmo sorriso presunçoso de sempre, ele estende a mão.

"É um prazer finalmente conhecê-la, Isabella. Eu sou Shawn. Temos muito o que conversar."

Ele coloca a mão nas minhas costas, carinhosamente me guiando até a cadeira na frente da mesa dele. O gesto foi espontâneo e doce, o que me deixa mais a vontade, apesar do desconforto.

Sou uma completa desconhecida pra ele. Ele só sabe meu nome e algumas outras informações básicas, mas não sabe sobre mim de verdade. Não tanto quanto eu sei sobre ele.

Mas ele ainda me deixa muito curiosa.
Shawn sempre parece esconder mais do que demonstra e isso me deixa ansiosa sobre ele, como se eu quisesse desvendá-lo, descamar os seus medos e segredos até que não haja nada que me assuste nele.

"O que aconteceu naquele dia?"- Minha voz sai sussurrada, enquanto ele se servia de algo semelhante a whisky. Essa hora? Talvez ele seja ainda mais problemático do que eu imaginava.

Shawn observa a vista.
Me pergunto sequer se ele ouviu a minha pergunta.
Antes que eu a repita, mais confiante e mais alto dessa vez, ele se senta e me observa com cautela, unindo as mãos em cima da mesa. No dedo, o anel de ouro maciço com um 𝓜 me chama atenção.

"Por onde quer começar, Isabella?"
Sua voz é carregada por alguma mistura perigosa de emoção e seus olhos estão sombrios. Em algum momento ele e Yatra se encontraram. É esse encontro que o deixa tão pesaroso?

"Pelo começo. E me chame de Bella."
Ele sorri com o que eu acrescento. Seu sorriso é divertido e travesso, como o de uma criança pronta para arranjar alguma confusão. Ele nunca vai me chamar de Bella, só para se divertir comigo.

É assim que ele joga?
É uma pena pra ele, porque nesse jogo, eu já sou profissional.

Liar ~ Shawn MendesOnde histórias criam vida. Descubra agora