Liar ~ Shawn Mendes

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Bella

Faz 5 dias desde que Shawn foi decretado morto. Os exames ainda não foram concluídos, mas dona Karen pediu para não fazerem. Criar esperança para depois sentir ela escapando entre os dedos, é uma das maiores dores que qualquer pessoa pode sentir.

O enterro simbólico dele vai ser amanhã. Por mais que eu quisesse evitar, vou ter que ir. Mesmo que meu coração insista em pensar na pequena possibilidade de ele estar vivo, vou por respeito.

Não dormi mais que 1 hora, essa noite, o que parece fazer parte da minha rotina agora. Meu quarto nunca foi tão solitário e cruel, um lembrete doloroso das noites em que ele escapava do quarto dele para se aninhar a mim, aqui na minha cama.

Saí da cama, vendo o relógio dar 3 horas da manhã e saio. Meus pés me levam ao quarto do Shawn. Não estou com cabeça para desviar do destino, ou para pensar o por quê disso. Apenas vou.

O cheiro dele no quarto dói como se eu tivesse sido apunhalada pelas costas. Não luto mais contra as lágrimas. Não tem mais razão pra isso.

Depois de 5 dias, as coisas estão quase voltando ao normal, exceto que o silêncio faz parte dos nossos dias, agora. Nem os soldados passam pela casa o tempo todo, agora.

Ninguém se encara ou sorri demais.
Todos estão na própria batalha para não desabar. Sei disso porque cada um parece estar sendo consumido pela tristeza.

Olhos fundos, vermelhos de cansaço, os ombros curvados, de exaustão e fraqueza, e, o principal: os olhos nunca se encontram.

Teddy me deu um tempo das sessões, o que é um alívio. Ela é muito amiga dele e não quero lidar com mais uma pessoa que o amava, sendo despedaçada, dia após dia, pela própria dor.

No momento, só Camila ainda tenta passar por isso ao meu lado.
Sei que ela não tinha tanto apego à ele, mas ele morreu tentando salvar a irmã dela. Ele só foi para Toronto por causa da promessa dele e eu sei que isso a atormenta intensamente.

Mas o mais agoniante é que ninguém faz absolutamente nada, exceto pelo enterro, mas a investigação em si, não.
Estamos todos nos afundando nos nossos sentimentos, na nossa tristeza, e ninguém está lutando para se salvar. Ninguém sequer está lutando.

Shawn ficaria irritado de nos ver desistindo assim. Ninguém diz nada, mas eu sei que estão desistindo.
Se não fosse Leslie, sempre correta e forte, nem comida teríamos direito. Mas nem adianta, se ela não desce. Não tem gosto nem me atrai.

Deito na cama dele e me aninho nos cobertores. O cheiro é tão forte que parece que ele esteve aqui há alguns minutos, mas não. Ele não esteve e nunca vai estar aqui de novo.

Aqui é mais meu quarto do que o meu próprio. Todas as noites eu venho aqui e fico, esperando que o cheiro dele possa, de alguma forma, me livrar com os pesadelos.

De certa forma, eu também causei tudo isso.
Ele não teria conhecido Camila se não fosse por mim. Nem teria conhecido Yatra. Tudo de ruim que cercou a vida dele, foi culpa minha.

Eu o matei.

Agitada e cansada, acabo dormindo ali, sentindo o pouco dele que ainda tem nessa casa.

Acordo com uma conversa.
A porta ficou aberta, então todo o barulho da casa eu posso ouvir daqui.
McCann já está dando ordens.

"Samuel, avise aos soldados para que comecem os treinos mais cedo essa semana. E que se enfrentem também. Temos um longo e violento caminho pela frente."

Abro os olhos e me levanto.
McCann pretende fazer algo, finalmente. Suspiro, aliviada.

Desço as escadas, sem ligar para a minha aparência.
Meu sangue ferve nas veias por excitação e meu corpo parece desperto, finalmente.

"Me deixe participar."
McCann se vira para mim. Seus olhos azuis são severos e, a julgar pela forma na qual ele cruza os braços musculosos e grossos no peito largo, ele não está disposto.

"Isabella, você não tem treinamento para isso."

Tento respirar, me acalmando.
Como dizer a ele que eu preciso disso para não me afundar? Para não perder o rumo? É como se fosse uma saída de emergência de um prédio pegando fogo. A única saída que me deixaria viva.

"McCann, eu sou uma excelente aluna, você mesmo disse isso. Posso aprender o que você quiser e posso dedicar meus dias inteiros a isso."- Ele mal ergue uma sombrancelha, duvidando. Claro. Eu era a amada do Shawn, como já peguei um deles dizendo.-" Yatra está nisso, eu sei. E ele me quer. Por isso ele fez... Isso com o Shawn. Cada movimento, cada decisão, tudo gira em torno de um único objetivo: eu. Eu deveria estar nessa porque eu causei isso."

McCann suaviza levemente a expressão e põe a mão no meu ombro, da forma mais reconfortante que ele poderia fazer.
"Bella, você não o matou, e sabe disso. Não se castigue pensando o contrário."

Eu murcho, exausta, de repente. 5 da manhã. Mal durmi 3 horas.
"McCann, estou implorando. Quando já me viu implorar?"

Eu o olho, cansada demais para ser orgulhosa. Ele suspira. Entendo sua indecisão, claro.
Shawn é... era seu chefe e eu era a sua protegida. Shawn jamais me colocaria em perigo assim, mas ele não está aqui e a decisão não é dele.

É do McCann.
Ele me observa.
"Um soldado jamais implora, Ferretti. Coma algo e se prepare para treinos rigorosos. Se reclamar, está fora. Estou praticamente treinando um bebê, então não vou ter paciência com você."

Abro um meio sorriso, discreto e satisfeito.
"Esse bebê aqui derrotou um dos seus melhores homens, McCann. Não sou tão idiota quanto pensa."

Ele esboça um sorriso.
"Jared, leve Bella para por a roupa de treinamento. Se vai ser uma de nós, seja direito."

Assinto.
Pego minha maçã, meu café da manhã desde sempre e sigo o soldado, que caminha tranquilo ao meu lado. Está quase amanhecendo e paisagem é linda.

Ele pega meu olhar e sorri também.
"McCann gosta de você. Do jeito dele, mas gosta."

Eu rio.
"Ele tem uma forma estranha de gostar."

Ele ri junto.
"Tem. Ele passou por muita coisa, especialmente depois de Will..."
Eu paro.

"O que tem Will?"
O soldado coça a cabeça, confuso e sem graça. Revelou algo que não deveria.

"Will era o irmão dele. Você não sabia?"
Ah, Meu Deus. Então McCann vai até o fim do mundo para vingar o irmão.

Por isso o olhar meio estranho dele.
McCann não está me levando junto porque minha ajuda seria útil.
Está me levando porque eu seria uma armadilha perfeita.

Cerro os olhos, voltando a caminhar na direção do galpão.
No final das contas, eu não sou uma atiradora, sou a arma que vai nos salvar.