Sozinha

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- onde você estava? Nossa, eu estava morrendo de preocupação! – Luan falou extremamente exaltado. – você sai assim e não fala nada?!
- fala baixo! – falei, considerando que Alice dormia no meu colo. – eu fui ao parque com ela. Sempre vou! – ele suspirava fundo como alguém que realmente estava em desespero.
- eu disse que ela poderia ter ido pro parque! – Joana disse se levantando e saiu.
- e o celular, não leva? Quer me matar do coração? – falou raivoso. Olhei pra sua expressão de raiva e senti medo. O que me trazia certas lembranças de como meu pai era agressivo.
- eu esqueci Luan, desculpa. – falei subindo as escadas e ele veio atrás.
- da próxima avisa, fiquei preocupado! – coloquei Alice em seu berço e apaguei a luz saindo, ainda com Luan me seguindo. – Duda... – me virei pra ele. – desculpa. – ele sabia o quanto eu odiava seus momentos de raiva. E eu tinha motivos sérios pra odiar que gritassem ou me tratassem com fúria.
- tudo bem. – sorri fraco e ele me abraçou.
- me abraça! – falou, levando em conta que eu não estava retribuindo seu abraço. – vai! – falou rindo e eu não pude recusar. Amava seus abraços mais que qualquer coisa. Talvez não amasse mais que seus beijos, mas eu tinha aprendido a me contentar apenas com os abraços. – desculpa, desculpa mesmo. Eu fiquei morrendo de medo de ter acontecido algo com vocês.
- quando sua esposa volta? – perguntei ao nos separarmos, mudando de assunto.
- acho que na próxima semana, é ação de graças essa quinta-feira lá nos estados unidos. – arqueei as sobrancelhas.
- e você não foi por quê? – da ultima vez ele tinha ido. Ele respirou fundo.
- eu disse que tinha umas gravações pra fazer...
- e tem?
- não. – riu. – eu preferi tirar esse tempo pra ir ver meus pais com a Alice.
- é, me parece bem mais divertido do que ir ver a família dela. – ele riu.
- as coisas não são boas entre a gente... – pela cara, ele queria conversar. Mas eu não queria. Eu tinha que ficar distante. Apenas. Não queria conversa. Não queria nada.
- vai ficar tudo bem, sempre fica...
- mas eu não gosto do jeito que sempre fica. – eu não sabia o que fazer. Partiu meu coração ver aquela carinha triste de quem precisava conversar. Mas eu estava cansada de vê-lo sofrer em um momento e no outro saber que ele estava com ela de novo.
- vem, vamos conversar lá no quarto. – e nós fomos. Sentei perto da cabeceira e ele veio pelo outro lado, deitando no meu colo.
- eu... Eu queria que as coisas fossem diferentes.
- diferentes como?
- queria que a gente não brigasse tanto, queria que ela fosse menos egoísta, menos esnobe...
- mas foi desse jeito que você conheceu ela, ela sempre foi assim.
- queria que ela aceitasse a minha filha.
- a filha de vocês. – o corrigi.
- não, minha filha. Ela é mais sua filha do que da Bianca.
- não, Luan. Não confunde as coisas, eu sou babá dela, trabalho aqui, sou paga pra isso.
- eu nunca vou poder pagar pelo que você faz... Você faz papel de mãe e eu nunca vou conseguir retribuir isso. Você não tem folga, não tem férias, não tem descanso...
- para de falar assim...
- mas é verdade. Enquanto ela passeia por ai com as amigas dela, carregando meu sobrenome e gastando o meu dinheiro.
- falando assim, nem parece que um dia desses vocês estavam se amando. – deixei escapar um tom ciumento sem querer.
- a gente não se ama, Duda. – falou me encarando, mas eu não o olhava.
- Luan, isso é uma fase. Vocês só precisam de um tempo um do outro. Um tempo livre, sabe? Sem dar satisfações, sem cobranças... E depois quem sabe um momento só os dois, uma viajem... Pra acender a relação de vocês. – eu estava fazendo de tudo pra tirar ele de mim. E o melhor era incentivar que ele e a mulher dele fossem felizes. Ficamos quietos por um tempo...
- eu disse a minha mãe que iríamos passar essa semana na casa dela...
- eu acho uma boa ideia, faz tempo que Alice não vê seus pais.
- é, eles sentem falta dela... E de você também. – sorri.
- eu também, mas...
- o que foi?
- eu acho que prefiro ficar, dessa vez.
- o que? Por quê?
- é suas férias, com sua filha, sua família... Eu prefiro ficar aqui com minha mãe, entende?
- mas... Mas você também é minha família. – meu coração acelerou, ele tinha mesmo dito aquilo? – se quiser ficar, tudo bem. Você precisa mesmo de férias, mas eu queria muito que você fosse. Não só pela Alice. – por dentro, senti meu coração se encher. Eu era importante para ele. Mas precisava começar a me acostumar com a ideia de não ter mais Alice, precisava ir me afastando aos poucos pra não doer tanto mais pra frente. Além disso, seria uma semana pra afastar-me também do Luan e do sentimento que eu tinha por ele e que não morria.
- obrigada, Lu. Mas eu prefiro mesmo ficar. – sorri fraco.
- tudo bem... Me ajuda com a mala pra Alice?
- claro!

[...]

- que horas vocês vão? – perguntei enquanto arrumávamos a mala juntos.
- amanha a tarde, lá pelas 16h.
- e quando voltam?
- em uma semana, Duda.
- se acontecer alguma coisa, qualquer coisa, você promete que me liga? Se a Alice chorar ou se machucar... Se ela ficar doente, ou... – ele me interrompeu.
- Duda! – riu. – fica calma! Eu ligo se algo grave acontecer.
- melhor, me liga todos os dias pra me contar como ela esta, o que vocês fizeram, qualquer coisa, ta bom? – ele riu ainda mais. Parou de mexer nas roupinhas e veio ate mim.
- Dudinha, olha pra mim. – ficamos frente a frente. – eu sei que é a primeira vez que você fica longe dela, mas eu vou cuidar bem da nossa princesa ta? – beijou minha testa e voltou para o armário de Alice. – e é você que não quer ir.
- tem que me ligar assim mesmo, Luan! – ele riu. Depois, eu fui ajudá-lo com a mala dele.

[...]

- tchau Lu...
- tchau Duda!
- tchau meu amor! Vou sentir saudades! – peguei Alice no colo e beijei seu rosto.
- Aice vai pra onde? – ri.
- pra casa da vovó!
- Tuda vai pra casa da vovó também?
- não, a Duda fica. – ela cruzou os bracinhos. – eu te amo, ta?
- Aice quer ficar com Tuda!
- o papai vai ficar triste... – ela olhou pra ele que carregava as malas até o carro. – fica boazinha, ta? – ela assentiu visivelmente triste. Eu não sabia que ela entendia as coisas ao ponto de ficar triste por saber que eu não iria. Dei um beijo nela e a coloquei na cadeirinha.
- eu não ganho beijo? – Luan perguntou e eu ri. Estiquei-me e beijei sua bochecha, dando depois um abraço.
- vai com Deus.
- e você fica com ele, se cuida! – assenti. – vê se descansa, vai visitar a sua mãe. Não fica sozinha ai nessa casa, ta bom? – eu concordei. – certeza que não quer ir?
- tenho Lu... – ele deu um beijo na minha testa e entrou no carro. Ficamos nos olhando, vi Alice me olhar triste do banco de trás. Com certeza questionava o porquê de eu não estar indo. Observei eles irem e senti meu coração apertado. Já estava com saudades da minha pequena. Ela com certeza sentiria minha falta, nunca tínhamos nos separado antes.

Entrei e fechei a porta. Já estava sentindo um vazio sem minha menina pra cuidar. Tinha vontade de chorar. Pela primeira vez em dois anos eu estava sozinha.

Mesmo sem estarOnde histórias criam vida. Descubra agora