A competição
Uma semana havia se passado. Jovens fadas e fadens, conversadores, e o humano Lúcio estavam reunidos no Reino Encantado. As moças disputavam um lugar em frente aos espelhos dos aposentos das convidadas, ansiando para terem o melhor vestido, o penteado mais bonito, ou serem o maior talento musical. Branca destacava-se por tamanha beleza, a ponto de transformar um saco de batatas em um vestido luxuoso. Era tão bonita e delicada, tão perfeitamente educada e correta e elegante e feminina e comedida e mais um zilhão de "ês", que intimidava as outras garotas.
Por sua vez, existia uma figura nada parecida com a mais bela de todas. A menina travessa escondia um par de calças compridas por baixo de um vestido verde, que cobria seus sapatos brutos de corrida. Todas seguiam em fila para as bancadas, a fim de assistirem à competição dos meninos e rapazes. Eles começavam porque a maioria das atividades eram ao ar livre, e assim, faziam bom uso da luz do sol. Já a competição das meninas e moças era ao anoitecer, tempo mais fresco e propenso ao descanso, festa e boa música.
O povo que ali se encontrava não conseguia desviar o olhar de Branca e Henrique. Eram lindos, as crianças mais bonitas que já viram. O príncipe se posicionava com graça e destreza, tomando sua posição na linha de largada. Primeiro seria a corrida dos meninos de dez a catorze anos, depois a dos rapazes de quinze a dezoito. Felipe e o irmão estavam a postos, mas com Branca tão perto, Victor não conseguia se concentrar.
A rainha iria começar a contagem regressiva e Eli reparou que Aurora não estava com Estela. Olhou instintivamente para Felipe, que soltou uma gargalhada frenética, o que era um grande indicador de problemas. A avistou ao lado dele com uma capa verde que conseguiu encobrir sua identidade dos demais. Ao sentir que estava sendo observada, ela viu Eli, que balançava a cabeça na horizontal, como se pedisse para que ela não prosseguisse com seu plano.
– Três – Solange contou, alheia ao fato.
– Dois – A rainha viu Eli apavorado e acompanhou seu olhar.
– Um.
Aurora balançou a cabeça para cima e para baixo, determinada. Solange entendeu, mas era tarde demais. Todos estavam perplexos, sem saber se o pequeno corredor era um fadem ou conversador. Perguntavam uns aos outros quem era que estava atrás apenas de Henrique e Felipe. Tão pequeno, mas tão rápido! Havia um desconhecido entre os garotos, com o cabelo preso dentro da camisa.
Eli pegou a capa verde jogada no chão e seguiu na direção de Solange. Estava preocupado, mas no fundo, torcia pela menina.
– E se ela ganhar?
Solange, dessa vez, não tinha resposta. Teria que inventar uma solução na hora.
– Não sei, meu caro, isso nunca aconteceu antes
– Infringe as regras?
– Creio que não, mas ela está infringindo os costumes e convenções, que são muito mais difíceis de burlar. É esse o problema.
***
Ao contrário de quem assistia, os corredores puderam constatar que era uma menina a concorrente misteriosa. Não gostaram nem um pouco dela estar com eles, e bem na frente.
– Você não pode correr! – Gritou um fadem furioso.
– Tinha que ser a neta da bruxa! – Outro rapaz vociferou.
– Calem a boca e percam como homens! – Felipe respondeu, rindo. – Rorinha, se eu perder para você, te afogo no rio.
– Nossa, é isso que você chama de perder como homem? – Aurora rebateu alegremente.
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O Conto dos Contos - A origem dos contos de fadas
FantasiAurora é temida pelas fadas, odiada pelos conversadores, vigiada pelas bruxas e um mito entre os humanos. Seu mundo é dividido entre ambição e inocência. A guardiã do Reino Encantado precisa escolher entre ser uma bruxa como sua avó Malévola, ou seg...