Eu não me lembro realmente das horas seguintes depois do adeus devastador à Therese no Ritz. Eu me lembro de ir direto para o carro e de que houve quatro tentativas de fazer a chave entrar na ignição, graças as minhas mãos trêmulas. Eu me lembro vagamente da curta viagem para o meu apartamento e de começar a chorar logo no primeiro sinal vermelho. Quando eu estacionei, eu estava chorando visivelmente, minha respiração instável ecoando dentro do carro até que eu fui cercada pela mais triste cacofonia que já tinha ouvido.
Eu não me lembro de chegar ao meu apartamento. Mas assim que a porta se fechou atrás de mim, eu sei que fui direto para minha cama e me joguei, ainda de casaco, ainda usando meu chapéu preto, enquanto eu enterrava meu rosto no travesseiro tentando sufocar o som da minha devastação. Eu me lembro da dor, de uma energia quase indescritível, com nós no meu estômago, meu coração vazio. Eu não sei quanto tempo eu fiquei deitada ali, pensando em como eu conseguiria superar o próximo segundo, o próximo minuto, a próxima hora. Não deve ter sido muito, porque eu não tinha esquecido os meus planos para a noite e apesar de ter de ir jantar com alguns dos meus colegas de trabalho era a última coisa que eu queria fazer, eu sabia que era mais um jeito de deixar a noite em espera um pouco mais.
Eu já podia sentir a agonia ao meu redor, minha mente me provocando com muitos fracassos, me dilacerando a cada segundo. Talvez fosse covardia querer fugir para um lugar, mesmo que por só algumas horas. Eu não poderia desmoronar, mas acho que era o último resto de sanidade que eu tinha, tentando me proteger por mais algumas horas, até sentir os últimos pedaços do meu coração partido.
Até onde me lembro, passei a hora seguinte andando pelo meu apartamento como um personagem de "A revanche dos zumbis", reaplicando minha maquiagem borrada, penteando meu cabelo, enquanto eu não me permitia pensar. A única vez em que eu quase me rendi a escuridão que me atormentava foi quando eu fui para a sala e vi o disco com "Easy living" na vitrola, sua capa alegre me forçando a enfrentar tudo o que eu perdi. Eu fiquei parada por um momento, fechando meus olhos para a memória do sorriso sincero de Therese quando ela me deu o disco, a lembrança da sua mão na minha, tão forte que eu quase podia sentir.
Eu tropecei para fora da sala, me encostando na parede tentando recuperar o que eu tivesse de equilíbrio, antes de me endireitar, pegando meu casaco e saindo de novo. A viagem para o hotel Plaza foi menos chorosa, ainda bem, enquanto eu conseguia me controlar. Eu cheguei um pouco cedo, mas apesar de paciência não ser uma das minhas virtudes, fiquei feliz por ter que esperar por meus companheiros de jantar. Eu passei esse tempo reconstruindo minha máscara, aquele rosto que eu mostrava para todos, menos para pessoas próximas. Quando Xander, Malcolm e Nancy apareceram eu tinha um sorriso perfeito no lugar.
Por tudo que é sagrado, eu não me lembro o que pedi para comer. Talvez só uma salada - nunca consigo comer quando estou estressada e "estressada" mal esconde o colapso que eu queria afastar. Eu me lembro de me arrepender em ir com meu próprio carro. Eu teria que tomar apenas um copo de vinho. Pelo menos, eu tinha um bom abastecimento de conhaque no meu apartamento. Recentemente, alguns copos à noite havia se tornado um ritual. Eu percebi que nessa noite provavelmente eu precisaria dessa automedicação muito mais.
Eu realmente tentei me ater à conversa a meu redor. Eu ainda não tinha começado a trabalhar na loja de móveis e eu queria tentar e usar essa oportunidade para conhecer mais sobre a empresa para trabalhar melhor. Eu já conhecia Nancy, a compradora chefe, do tempo da minha própria loja com Abby. Foi ela quem contou sobre essa oportunidade de emprego para Abby. Eu tinha conhecido Xander e Malcolm, o gerente e o gerente assistente respectivamente, durante minha entrevista na semana passada, e os dois pareciam ser legais. Apesar das minhas boas intenções para esse encontro, eu me vi tendo que usar as mesmas táticas que eu usava para as festas sem fim em que eu ia com Harge. Por todas as intenções e propósitos, eu estava presente e comprometida na discussão animada que acontecia na mesa. Um sorriso aqui, uma concordância ali, até mesmo uma leve risada de vez em quando. Na verdade, eu estava em outro lugar. No Ritz, para dizer a verdade.
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Por Trás Daqueles Olhos
FanfictionO que há por trás daqueles olhos? Nas próprias palavras de Carol e Therese, mergulhando em seus pensamentos, esperanças e medos. Começando do último encontro delas no filme até... Quem sabe?