CAPÍTULO 14: "Fooling Myself"*

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Tinha acabado de dar 5 da tarde, quando a voz sentimental de Billie Holliday percorreu meu apartamento até minha cozinha e eu esperei impacientemente para a chaleira ferver, enquanto meus dedos batiam, mas não acompanhavam o ritmo da canção "Fooling Myself" (Me enganando). Eu não estava prestando atenção à canção, pois meus pensamentos estavam em outro lugar. Não importava: eu tinha ouvido esse disco tantas vezes nos últimos meses que as palavras estavam impressas na minha mente. Eu encarei a chaleira com a testa franzida, como se isso fosse fazê – la ferver instantaneamente e falei um palavrão quando não ferveu. Nem ligou para mim e eu xinguei de novo, mais alto dessa vez, me virando e indo para a janela da cozinha, olhando para fora sem realmente ver nada.

Meu humor estava péssimo desde que me despedi de Therese de manhã e percebi que mesmo as pequenas coisas me irritavam durante o dia. A única vez que não fiquei assim foi quando eu liguei para Abby: sua atitude irônica para tudo que ela fazia, fez com que ela me distraísse, mesmo que ela quisesse saber de tudo o que tinha acontecido entre Therese e eu desde Sexta. Eu acho que ela ficou surpresa quando eu não quis dar detalhes sobre algumas coisas, ainda mais as coisas que faziam meu coração acelerar de amor, mas ela não fez muito caso disso, o que me deixou agradecida.

Eu contei que Therese e eu iríamos a sua festa, o que fez ela dar um gritinho que me fez balançar a cabeça, enquanto eu estava sentada na minha cama, enrolando um fio de cabelo castanho de Therese que achei no travesseiro. Eu fiz questão de dizer a Abby que ela tinha que se comportar, mesmo sabendo que isso não faria diferença. Abby não podia ser domada em qualquer momento, ainda mais se estivesse nadando em álcool, mas eu sabia que pelo menos ela iria se esforçar. Ela gostava de Therese, mesmo que Therese pensasse o contrário, e eu realmente acreditava que o estado catatônico que eu fiquei desde que fiquei longe de Therese, a fez perceber como eram as coisas.

Eventualmente, a conversa continuou e discutimos sobre minhas opções sobre Rindy. Eu passei um tempo pensando sobre isso depois de conversar com os advogados e contei a Abby que eu pretendia tirar Fred e Jerry da equação completamente e mais tarde lidar direto com Harge. Ela pareceu cautelosa no começo, mas eu estava firme quanto a isso. Harge não era um homem ruim, mesmo que ele tenha feito péssimas escolhas nos últimos meses. Contudo, com todas suas falhas e ele tinha muitas, eu sabia que ele amava Rindy tanto quanto eu. Saber disso foi crucial para eu poder me erguer e dizer o que disse durante nossa reunião. Se eu tivesse qualquer dúvida, eu teria me forçado, mesmo que fosse doloroso, a continuar brigando pela custódia até o fim e viver contra minha própria natureza. Primeiro e principalmente eu era a mãe dela e eu sempre lutaria, sempre vou lutar, por tudo de melhor para minha filha.

Acho que contei para vocês antes que Harge não iria me deixar afastada de Rindy. Os últimos anos entre nós foram tensos e eu quase perdi o respeito que eu tinha por ele, mas no fim, ele era um bom pai. Seu advogado, eu sabia, faria de tudo para manter Rindy e eu separadas pelo tempo que fosse, ou em insistir em visitas supervisionadas indefinidamente, e não importa o que eu tivesse dito naquela sala, eu não suportaria isso. Se Harge pudesse me ouvir, longe dos ouvidos curiosos de Jerry e outras pessoas, se ele pudesse me ouvir sendo razoável, eu sabia que ele não deixaria Rindy afastada de mim por muito tempo. Eu também tenho uma forte suspeita, mesmo que ele insista em visitas supervisionadas no começo, que pelo bem de seu próprio ego, ele iria ceder rapidamente.

A parte de tudo, ele sabia muito bem que a promessa que eu fiz frente aos advogados não era da boca pra fora. Se ele não me desse acesso à minha filha, eu iria levar o caso à corte. Poderia ser horrível. Eu seria um alvo fácil para fofocas venenosas, mas eu não era a única com esqueletos dentro do armário. Ficaria feio, mas não só para mim. Voltava sempre para o ego, algo que eu me ressentia durante nosso casamento, mas agora era a única coisa que eu podia contar. Sua reputação não poderia ser manchada e mesmo se eu pudesse, ele não deixaria. Era um paradoxo estranho que eu me encontrava, me sentindo totalmente desamparada de um lado, mas sabendo que eu não tinha muito poder se ele se recusasse a acatar minhas condições. Ele sabia disso mais do que eu. Quando acabei de explicar tudo isso para Abby, ela estava concordando, quase me fazendo desligar para que eu ligasse imediatamente para Harge.

Por Trás Daqueles OlhosOnde histórias criam vida. Descubra agora