Um mês depois
50 South St, Morristown, Nova Jersey, Estados Unidos – 17:48 PM
- Eileen, não é bem assim... – Daniel falou, depois de perceber que aquela ligação da namorada não era uma quando qualquer outra. – É claro que eu me importo com você, que eu quero passar tempo com você.
- Mas não é o que parece. – a menina parecia triste do outro lado da linha, como se tivesse algo a incomodando e que não tivesse como consertar. – É como se não tivesse mais espaço pra mim na sua vida.
- É claro que tem, não fala besteira. – o rapaz pediu, vendo que a namorada estava levando o assunto para o lado que ele não queria.
- Não é besteira, é a verdade. – Daniel ouviu Eileen suspirar e ficar em silêncio por alguns segundos. – Você seguiu sua vida. É como se tivéssemos seguido caminhos diferentes, no sentido totalmente literal, Danny. Você tem a sua vida por aí, com o Dylan, com seus pais, com seus amigos. Estamos em fusos completamente diferentes, enquanto você está trabalhando, eu estou indo dormir e parece que nada funciona. É uma sucessão de desencontros, como se tudo conspirasse
- A gente disse que ia fazer funcionar. – o rapaz falou, ouvindo uma risada sem humor do outro lado em resposta.
- Sim, dissemos. Mas eu estou cansada de fazer isso sozinha. – foi o momento dele ficar em silêncio, porque não tinha percebido como estava agindo errado com ela. – Se eu não te ligar, não te procurar, é capaz de ficarmos dias sem nos falarmos. E como podemos manter um relacionamento assim? Como podemos fazer isso dar certo dessa forma? Não tem como, Danny, não tem.
- Eu estou errado com você, eu sei.
- Mas eu não quero que você saiba que está errado, porque isso é simples, é fácil demais. – ela o interrompeu, como se não quisesse ouvir mais desculpas do rapaz. – Eu queria que você tivesse feito algo, que tivesse lutado pela gente. Que tivesse lutado por mim. Que se importasse...
- Nós podemos mudar isso. Eu posso mudar isso. Posso organizar meus horários, ir até aí, passar um final de semana com você. Só nós dois e mais ninguém.
- Você não pode achar que passar um final de semana comigo vai mudar tudo. Nós não nos vemos há meses, não nos falávamos há três dias. Isso porque eu fiz um teste para saber se você sentiria falta ou, ao menos, teria o interesse em me procurar. Então não será um final de semana que mudará isso. Você pode vir, ficaremos bem por dois ou três dias, ok. Mas e depois? Voltaremos ao que temos agora? Não posso me contentar com tão pouco. – Eileen parecia muito segura do que falava, como se não estivesse querendo decidir alguma coisa, mas sim comunicando uma decisão. E Daniel não sabia o que responder, porque ele estava errado. Na verdade, ele vinha errando com a namorada há tempos.
Ele nunca tinha sido capaz de corresponder todo o sentimento e compartilhar dos planos que a menina fazia. Sempre que ela falava do futuro, fosse sobre uma viagem, morar juntos, casamento ou filhos, mesmo que fosse apenas comentando ou falando superficialmente, Daniel não conseguia retribuir no mesmo entusiasmo. Parecia que alguma coisa o tratava, impedia que ele planejasse, até mesmo, sequer vislumbrasse um futuro juntos. Então esse tipo de atitude da menina não deveria surpreendê-lo, mas, ainda assim, o deixava triste, porque deixava claro a sua incapacidade de ter um relacionamento saudável, onde alguém não acabasse magoada, machucada. E o que o deixava mais triste é que era sempre a outra pessoa que ficava assim. Ele era sempre o errado.
- Eu não sei o que falar pra você. – Daniel falou por fim, Da de tentar amenizar a situação.
- Até porque não há o que falar. Eu só queria que... – a voz da menina embargou, como se ela se segurasse para não chorar. – Eu só não queria que as coisas terminassem assim.
- Eu também não. – eles ficaram em silêncio por longos segundos, que pareceram horas. Nenhum dos dois parecia querer ser o responsável por dar o primeiro passo para o que parecia inevitável.
- Então acho que é isso. – Eileen falou, quebrando o vazio entre os dois. – Eu não queria parecer grossa ou algo do tipo, só queria pensar mais em mim mesma para variar. Ser um pouco egoísta.
- Você não está sendo egoísta. Eu errei demais, nunca consegui corresponder aos seus sentimentos da forma que você merecia. Na verdade, eu acho que nunca mereci o que você sentia por mim. Então peço desculpas por ter sido tão babaca, tão idiota, tão...
- A gente foi feliz, Danny. – a menina o interrompeu, com o tom de voz mais baixo e suave, como se contasse um segredo. – Infelizmente nem tudo funciona da forma que a gente espera, mas obrigada.
- Obrigada pelo o que? – o rapaz perguntou, confuso, tanto pela mudança da voz da menina, quanto pelo agradecimento.
- Pelo o que a gente viveu. Seguiremos separados agora, mas os meses que passamos juntos aqui foram incríveis. Você é uma pessoa muito incrível, a forma que você se importa e ama sua família e seus amigos te torna muito especial.
- Você também é incrível, Eileen. Obrigado por me deixar fazer parte da sua vida.
Ella terminou de subir os degraus até o andar onde Daniel morava, tendo o envelope com o documento que ela redigiu para a entrada do pedido de paternidade. Bateu na porta algumas vezes e não ouviu resposta, mas tinha um barulho diferente. Tentou abrir a porta e percebeu que a mesma estava aberta, só que quando tentou entrar viu uma coisinha sair correndo de dentro do apartamento, querendo correr mais rápido do que as suas patas permitiam. O filhote de beagle tinha mais orelha do que qualquer coisa e era mais do que lindinho. A menina correu atrás dele, conseguindo alcança-lo sem muita dificuldade.
- Menino, aonde você estava indo, hein? – a menina murmurou para o cachorrinho, que mordiscava seus dedos com os dentinhos finos que estavam crescendo. Ele a olhou com seus grandes olhos castanhos, fazendo com que ela sorrisse de forma automática. – Ou melhor, de onde você saiu? – falou consigo mesma.
Entrou no apartamento, chamando pelo amigo, mas não ouviu nada em resposta. Por um momento pensou que ele não estaria em casa, mas logo lembrou que a porta estava aberta e Daniel não deixaria tudo aberto e sairia. Caminhou pelo corredor, seguindo até o quarto do rapaz, encontrando o mesmo sentado na cama, encarando a parede à sua frente. Alguma coisa tinha acontecido. Ella sentiu o coração apertar de preocupação, se aproximando rapidamente.
- Danny? – falou, sentando ao seu lado. Ela colou o cachorrinho no chão, que saiu correndo pelo corredor, como se perseguisse alguma coisa. – O que aconteceu? Tá tudo bem?
- Ely? Não te ouvi chegar, desculpa. – o rapaz encarou a amiga, mas visivelmente mais feliz por ela estar ali. – Eu estava distraído.
- Eu percebi. Mas me fala, o que aconteceu? – Daniel olhou para a menina, suspirando em seguida, sem saber o que falar. Ele estava tentando digerir e entender o que tinha acontecido.
- A Eileen terminou comigo.
- O que? Como assim? – a menina perguntou, confusa. Dentro dela tinha uma confusão de sentimentos. Ela estava preocupada com o amigo, não queria vê-lo triste ou sofrendo. Mas também tinha uma pontinha de felicidade no fundo do seu coração. Algo que ela não queria sentir e até mesmo se envergonhava. Ela deveria colocar seus sentimentos e sua cabeça em ordem, não deixar que esse tipo de coisa sequer passasse pela sua mente. Era errado, inaceitável. – Aconteceu alguma coisa? Vocês brigaram?
- Não, a gente não brigou. Foi só... – ele suspirou, encarando o teto e depois voltando os olhos para as próprias mãos. – Eu não estava sendo o melhor namorado do mundo. E ela merece algo melhor.
- Entendi. – Ella falou, não sabendo se deveria dizer qualquer outra coisa, demonstrar apoio ou apenas ficar ali ao lado dele. – E você quer conversar sobre isso? – colocou sua mão por cima da do rapaz, sorrindo de lado, mostrando que ele podia contar com ela, como sempre.
- Eu só queria saber se um dia eu serei capaz de ter um relacionamento normal com alguém. – perguntou, sem querer saber realmente a resposta. – Porque parece que eu sempre encontro uma forma de estragar tudo. Nunca dou atenção suficiente, nunca sou o suficiente. Sempre acabo magoando as pessoas, como se não me preocupasse com nada além de mim, mas não é verdade.
- Acho que você não pode se culpar tanto assim. Relacionamentos à distância são complicados mesmo. Não vê que nós dois, apenas amigos, nos distanciamos muito enquanto você estava na Alemanha? Conviver é muito importante, mesmo que seja para brigar. – riu, arrancando uma risada leve dele também. – Para um relacionamento funcionar, precisa de uma relação. E para ter uma relação, as duas pessoas precisam estar totalmente dispostas a fazer aquilo dar certo e funcionar. Enquanto você estava na Alemanha, sua vida girava ao redor de tudo o que você dividia com a Eileen. Mas quando você veio para casa, suas prioridades mudaram. É certo? Não sei, mas ninguém pode te culpar ou julgar por colocar seu filho como sua nova prioridade, por exemplo. – a menina fez um carinho no dorso da mão do rapaz, que a virou para que pudessem entrelaçar os dedos. – Pelo menos vocês foram felizes enquanto estavam juntos.
- Sim, é isso que importa, não é? – o cachorro voltou arrastando uma meia na boca, interrompendo a conversa dos dois. Largou a peça perto dos pés do rapaz e começou a latir, como se esperasse que alguém brincasse com ele. – Não, Bob, minha meia não é seu brinquedo. Cadê suas bolinhas?
- Bob? – a menina perguntou. – Aliás, um cachorro? Não bastava um filho? – ela riu, vendo o cachorro deitar e começar a roer a meia, como se quisesse destruí-la. Ella esticou o braço e retirou a peça de sua boca, fazendo um carinho em sua cabeça, para que ele não ficasse triste.
- Eu vi num livro, entre os vários que comprei, que é muito interessante e bom para a criança ter um animalzinho durante o crescimento. Pois ajuda no seu desenvolvimento físico, psicólogo e mental. Fora que é certo que o Dylan terá um melhor amigo para sempre. – Daniel sorriu de lado e viu a amiga repetir o gesto. Ele estava sempre a surpreendendo positivamente. Buscando formas de se preparar, sem medo de participar de verdade da melhor. Era por essas coisas que ela não teve medo de deixá-lo fazer parte da vida do Dylan. Porque quando Daniel quer fazer algo, ele faz direito.
- E por que Bob? – Ella perguntou, ainda mantendo o sorriso bobo nos lábios.
- Bem, já tínhamos o Dylan, faltava o Bob. – o rapaz tentou ficar sério, mas a menina apenas balançou a cabeça, sem acreditar na piadinha que ele havia feito.
- Bob e Dylan. Bob Dylan.– ela repetiu lentamente, vendo-o jogar a cabeça para trás e gargalhar alto, como se nem parecesse que ele estava triste há poucos minutos atrás. – Ai, Danny, você é muito bobo. E quero só ver como você vai se virar para cuidar de um bebê, um cachorro, um apartamento maior e ainda trabalhar.
- Você me ajuda com isso. – respondeu, piscando um dos olhos na direção da menina, que balançou a cabeça lentamente, como se negasse.
- Nada disso, cada um com os seus problemas. – falou rapidamente. – Não é mesmo, Bob? – chamou a atenção do cachorro, que estava deitado próximo aos pés da menina. E bocejou, fazendo um barulho engraçado, que ela aceitou como se fosse em concordância. – Enfim, vou falar sobre o que realmente me trouxe aqui hoje, e acho que vai ajudar a te deixar mais feliz. – continuou, pegando o envelope que trouxe e entregando para o rapaz. Ele abriu e puxou uma série de documentos de lá de dentro.
- O que é isso? É do processo? – perguntou, visivelmente interessado e ansioso.
- Sim, Lilly passou lá em casa ontem de noite e deixou isso comigo. São as primeiras papeladas do processo de reconhecimento de paternidade, agora precisamos fazer o documento que vai cancelar o que você assinou na clínica e também o que eu assinei, para que esse pedido não acabe gerando problemas para eles.
- Isso é complicado?
- Lilly disse que não, mas que será necessário que a gente assine esses documentos.
- Ah, mas isso é simples. – ele comentou, já animado com a história. – E quando que podemos assinar?
- Calma, ela precisa fazer ainda. E como é um favor, precisamos esperar que ela tenha um tempo pra isso.
- Eu sei, eu sei. Mas é que eu fico ansioso, sabe? Parece que vai tornar tudo real. – Daniel confessou, como se fosse um segredo que ele carregasse em seu peito.
- Mas já é real, Danny. Dylan é seu filho e não será um documento que vai tornar isso verdade ou não. – Ella tentou acalmá-lo, vendo-o respirar fundo por um instante.
- Fico muito feliz quando você fala essas coisas pra mim, sabia? Porque eu sei como você queria isso, que todo esse momento materno fosse só seu. Mas não apenas aceitou dividir comigo, como apoia e faz tudo o que pode para me ajudar. – o rapaz girou o corpo para ficar de frente para a amiga, segurando suas mãos e olhando em seus olhos. – Você é a pessoa mais maravilhosa que eu já conheci.
- Para com isso. – pediu, abaixando o rosto, sentindo o mesmo quente. Devia estar completamente vermelha.
- Hey, é sério. – Daniel colocou uma das mãos no queixo da menina, fazendo com que ela o olhasse. Por uns alguns segundos o rapaz lembrou da sua visão e a imagem dos lábios de Ella tocando os seus invadiram sua mente. E ele se pegou pensando em como seria se, daquela vez, fosse real. Mas tudo durou poucos segundos, como um vislumbre de um sonho bom e o despertar para a realidade logo depois. Os olhos do rapaz brilhavam, talvez de medo, expectativa, desejo, ansiedade, nervosismo. A menina precisou respirar fundo algumas vezes, mais para conseguir lembrar como era respirar, do que para qualquer outra coisa. Ela sentia toda e qualquer parte do seu corpo tremer por conta do toque do rapaz. Daniel não precisava fazer muita coisa para despertar essas reações na menina. Ella sabia e se odiava por isso. Ela perdia o controle sobre si mesma.
- Acho que eu já vou. – Ella disse baixo, com a respiração entrecortada, como se estivesse nervosa.
- Tudo bem. – o rapaz falou, se afastando um pouco e colocando as mãos ao lado do corpo. Ele sentiu como se tivesse ficado perto de perder o controle e feito algo que poderia se arrepender. – Amanhã eu passo lá para buscar o Dylan depois do trabalho.
- Certo, até amanhã então. - a menina se abaixou e deu um beijo no alto da cabeça do rapaz e sumiu pelo corredor, com Bob correndo todo desengonçado logo atrás dela.
Daniel deixou o corpo cair na cama e cobriu o rosto com as mãos. Ele precisava tirar esse tipo de ideias de sua cabeça por diversos motivos:
1. Ele tinha acabado um namoro de quase dois anos minutos atrás, ele não podia pensar em outra pessoa dessa forma tão rápido;
2. Ella era sua amiga há mais de vinte anos, ele deveria respeitá-la;
3. Precisava para de deixar que a ideia dos outros influenciasse na forma que ele via as coisas. Não é porque as pessoas veem eles dois como um casal, que eles devem ser;
4. Ele precisava dar um jeito na sua vida, já que desde que decidiu ficar em Morristown, foi como se tudo tivesse virado de cabeça para baixo;
5. E além de tudo isso, Daniel tinha certeza que estava ficando louco. Era a única explicação para tudo o que andava pensando.
Tudo isso que ele anda imaginando, que sua mente criava, essas vontades repentinas, são tudo fruto dessas ideias loucas que colocaram em sua cabeça. Porque precisava ser isso. Ou ele teria um enorme problema pela frente.
42 Moris Ave, Morristown, Nova Jersey, Estados Unidos – 22:39 PM
Ella estava no quarto, se preparando para dormir. Dylan já estava no berço, dormindo tranquilamente, então a menina se permitiu tirar alguns minutos para si mesma. Tomou um banho quente, demorando e relaxante. Ou pelo menos tentou relaxar. Já tinha colocado o pijama e penteava os cabelos. Mas ainda estava com a imagem de Daniel na cabeça, os olhos Ely brilhando para ela e aquela força que emanava dele a puxando para perto. Voltou a passar a escova pelos fios, com um pouco mais de força dessa vez, como se assim fosse capaz de tirar qualquer pensamento de sua cabeça. Claro que não seria possível, mas ela estava tentando de tudo ultimamente.
Entre escovadas e suspiros, Ella ouviu o barulho vindo da su janela, como se alguém estivesse batendo na persiana externa de madeira. Pensou que tivesse mesmo enlouquecido, até ouvir novamente. Imaginou ser um bicho, um pássaro talvez, mas pássaros não seriam capaz de chamar pelo seu nome. E aquela voz... Ela reconheceria aquela voz em qualquer lugar.
Levantou da cama quase correndo, tropeçando no meio do caminho e foi até a janela, abrindo a mesma e encontrando Daniel sorrindo do outro lado, debruçado na janela do seu antigo quarto, como faziam quando eram adolescentes e ficavam acordados conversando a noite quase toda, mesmo depois que seus pais mandavam que fossem dormir. Aquela sessão nostalgia levou a menina num turbilhão de emoções, como um grande tobogã, onde o final era longe e ninguém sabia bem onde era.
- O que você tá fazendo aí? – perguntou, rindo para disfarçar o nervosismo.
- Minha mãe me forçou a dormir aqui hoje, disse que quem tá triste não pode ficar sozinho. Tive que ir em casa buscar o Bob, porque se ele ficasse lá sozinho, não teria apartamento quando eu voltasse. – Daniel riu de lado, parecendo um pouco melhor. – Aí achei que seria legal te chamar pela janela, como nos velhos tempos, como se não tivesse passado, sei lá, dez anos desde a última vez que a gente fez isso.
- Realmente, faz muito tempo que a gente não conversa pela janela assim e você lembra por quê?
- Não... – o rapaz respondeu, se fazendo de desentendido.
- Ah, mas eu lembro. Você estava de castigo e queria sair pra ir atrás da sua namoradinha da escola...
- Da Anne. – completou, lembrando milagrosamente.
- Então inventou de pular do seu quarto para o meu e sair escondido pela minha janela, porque se fosse pela sua, seus pais veriam. E o que aconteceu? – Ella perguntou, com uma expressão de superior, a que o rapaz amava e odiava na mesma proporção.
- Eu caí e quebrei o braço.
- E? – ela pediu que continuasse, levantando as sobrancelhas, reprimindo um sorriso.
- E falei que você me puxou e eu caí. – confessou. – Tá, eu sei que foi errado, mas foi quase uma vida atrás. Você ainda tá chateada?
- Claro! Sua mãe acreditou e ficou quase um mês sem falar comigo. – a menina esbravejou e Daniel começou gargalhar.
- Eu contei a verdade depois. – respondeu, ainda com vestígios de riso em sua voz.
- Sim, porque eu obriguei. Enfim, como você tá?
- Bem, eu acho, só estou um pouco chateado. Porque por mais que você não sinta aquele amor intenso pela pessoa, sempre fica aquela tristeza no fim de um relacionamento. Mas essa nossa conversa já me alegrou bastante...
- Então você não amava a Eileen? – a menina perguntou, focando a atenção em apenas uma parte da resposta, com o coração acelerado, mais nervosa do que deveria estar.
- Eu sentia um carinho muito grande por ela, a gente fazia bem um ao outro, fora que é bom ter alguém para dividir, seja lá o que for: os problemas, as felicidades, as dificuldades, ainda mais num lugar distante, onde você não conhece ninguém. Mas aquele amor que todo mundo quer sentir, que conseguimos ver e perceber só de olhar pra pessoas, como... – ele ficou em silêncio por um instante, como se buscasse uma forma de explicar. – Como Anthony e Noah. Sabe como conseguimos ver e sentir o amor entre eles só de ver como falam, como sorriem, na forma que se olham?
- Sim, a gente consegue ver como eles se amam só pelo olhar. – Ella concordou. – Mas você não pode se cobrar tanto ou esperar sempre por algo assim. Um amor assim é raro. Daqueles que acontece uma vez na vida, quando se tem sorte. Às vezes temos que nos contentar com quem nos faz bem...
- Então você não ama o Benjamin? – a pergunta do rapaz a pegou de guarda baixa. Ela não estava pronta e nem mesmo preparada para falar sobre o que sentia. Porque nem mesmo sabia.
- Eu... – ela mordeu o lábio inferior, pensando no que responder ou numa desculpa para não responder nada. – Eu tenho que ir, ele vai chegar daqui a pouco.
- Então você vai fugir? – Daniel brincou, mas o seu tom deixava subentendido que ele tinha percebido que a amiga não queria responder. – Mas é uma pergunta tão inocente...
- Extremamente inocente. – a menina apertou os olhos e o encarou, com a expressão acusatória.
- Eu falei sobre os meus sentimentos, então o justo seria você falar também. – o rapaz cobrou, vendo a amiga rolar os olhos, não muito interessada naquela troca de confissões.
- Não tem muito o que falar, Danny. Cada caso é um caso, não posso comparar o meu relacionamento com o Benjamin ao seu com a Eileen.
- Não estou pedindo para você comparar, estou te fazendo uma pergunta: você o ama? – a voz de Daniel fraquejou no final da frase, quase o denunciando e mostrando toda a sua vulnerabilidade quando se tratava desse assunto.
- Eu não posso responder isso. – Ella falou, só que todas as suas tentativas de escapar de uma resposta já eram uma resposta. Uma forma de dizer, sem palavras, que não. Que ela não amava o Benjamin. – Mas é o que você falou: todo mundo quer alguém para dividir a vida, para te abraçar na cama ou esquentar seus pés numa noite fria. E se você tiver sorte, isso tudo vem acompanhado de um amor arrasador.
- Hmm, então essa é sua forma de dizer que não? – o rapaz riu, vendo o rosto da amiga corar. – Fica tranquila, esse será um segredo nosso.
- Não é isso. – ela disse rapidamente, olhando para trás, como se estivesse com medo de alguém ouvir. – É complicado demais, Danny. Não posso simplificar as coisas com "você ama ou não ama", quando foi ele quem esteve do meu lado em vários momentos que eu precisei muito. Que me apoia, que faz tudo o que pode para me ajudar e que cuida absurdamente bem do meu filho.
- Eu sei que não é isso o que você quer ouvir agora e, por favor, não me leve a mal, mas o que você sente parece mais gratidão do que amor. Tudo o que você listou, o Anthony, o Noah, a Lilly e até mesmo o Scott também fazem e você não namora com eles. Depois que a Eileen despejou em cima de mim todas as frustrações que causei a ela, eu acho que passei a pensar de uma forma menos romantizada, se é que é possível, as relações. Porque nós vemos pessoas empurrando relacionamentos com a barriga por comodismo, culpa, medo, gratidão. – ele apontou para a amiga, a usando como exemplo. – O que acaba impedindo que a gente viva relações baseadas em amor de verdade. E até que ponto isso vale a pena? – a sinceridade do rapaz atingiu Ella bem no fundo, porque ela não estava esperando nada disso. – Mas eu não estou falando isso como um incentivo para você tomar nenhuma decisão ou fazer qualquer coisa. Você, mais do que ninguém, sabe o que sente e sabe o que faz. Eu só... quero que você seja feliz. Independente de como, com quem. Só que seja feliz.
"Só quero que seja feliz..." a frase de Daniel ecoava na cabeça da menina enquanto estava deitada e tentava dormir. Ao seu lado, Benjamin estava tranquilo, com os olhos fechados, a respiração tranquila e a expressão serena, de quem não tinha nada com o que se preocupar. Era assim que Ella gostaria de estar, mas sua cabeça borbulhava. Já deveria passar das duas da manhã e ela, provavelmente, era capaz de passar e repassar tudo o que conversaram horas atrás, sem trocar nenhuma palavra. Porque tudo o que o rapaz falou a atingiu muito forte, de uma forma que não esperava.
Será que ela estava com Benjamin por gratidão? Por comodismo? Por medo de ficar sozinha? Ou será que ela, realmente, gostava dele? Gostar, porque amar, estar apaixonada, ela sabia que não estava.
Lá no fundo sabia que nutria um sentimento muito especial pelo rapaz, que surgiu em sua vida num momento em que precisava de alguém ao seu lado, de apoio, de alguém para confiar. Mas se parasse para pensar e imaginar sua vida daqui há dez, vinte anos, não se imaginava casada ou com uma vida construída com Benjamin. E isso a deixava arrasada, porque sabia que isso fazia parte dos planos dele. Então se pegou pensando: será que o mantinha por perto por medo da solidão? Por medo de ninguém se interessar por ela? Por medo de não ser mais amada? Será que ela era tão egoísta assim mesmo? No mínimo ela deveria levar em consideração os sentimentos do rapaz, ainda mais por ser tão especial e importante num período tão difícil de sua vida.
Mas ao pensar nisso, outra coisa veio a cabeça de Ella: Benjamin se tornou tão importante pra ela, justamente quanto Daniel não estava por perto. Ele ocupou um espaço em sua vida e em seu coração, que acabaram vazios com a partida do rapaz. Não poderia ser coincidência que esses sentimentos tenham se tornado tão confusos justamente após a volta de Daniel. Talvez fosse verdade o que ela sempre tentou negar a si mesma e que todo mundo sempre soube: ela usou Benjamin, de certa forma, para ocupar o espaço e vazio que Daniel deixou. Ela sempre negou isso, com todas as forças, de todas as formas. Até porque, um era seu amigo e o outro seu namorado. Eram coisas diferentes. Mas talvez não fossem e isso estava começando a fazer sentindo em sua cabeça, para o seu próprio desespero.
Num momento de lucidez, Ella começou a listar todas as coisas estranhas que tem acontecido com ela em relação a Daniel: a sensação de estar completa novamente, o nervosismo ao falar com o Daniel ou ao apenas ouvir sua voz, a forma que o coração acelera com o mais simples toque ou quando o seu olhar cruza com o dele. Como ela não conseguia ouvir ou falar sobre a Eileen, sem que isso acabassem o seu dia ou que fizesse surgir um mal-estar estranho, que começava perto da boca do estômago e subia até a altura do peito, mais conhecido como ciúme. Como se, de repente, milhares de borboletas ganhassem vida dentro dela só de olhar para o rapaz e vê-lo sorrindo em sua direção. Ou como o seu coração parecia que iria explodir de tão rápido que batia de apenas trocarem um simples abraço.
Se qualquer um listasse duas ou três coisas dessas pra ela, Ella não teria dúvidas em afirmar qual era o "problema" que essa pessoa sofria. Mas como era ela e, pior ainda, como era o Daniel a razão de tudo, era como se uma cortina de fumaça estivesse cobrindo os seus olhos por todo esse tempo. E agora que estava enxergando claramente, preferia continuar por trás da cortina. Era difícil pra ela até mesmo colocar em palavras a conclusão que havia chegado, mas era tão simples, tão fácil, que se achou burra de não ter percebido antes. Olhou para o lado, vendo Benjamin dormindo tranquilamente e além de burra, se sentiu suja. O que ela iria fazer agora? A verdade é que Ella estava, sim, apaixonada.
Mas estava apaixonada por Daniel.
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Dylan
RomanceElla e Daniel se conhecem desde os cinco anos de idade, melhores amigos desde que se entendem por gente, não poderiam ser mais diferentes e se amar mais. Ele é todo metódico e organizado. Ela é desprendida e sonhadora. Ele pensa no futuro. Ela quer...