ÚNICO REFÚGIO ( DEGUSTAÇÃO)

Capítulo 3

Eles dizem que é melhor ter amado e perdido

Do que nunca ter amado antesIsso pode ser um monte de merdaMas eu só preciso contar a todos vocês

Alguns erros são cometidos

Tá tudo bem, tudo okVocê pode pensar que está apaixonadoQuando está apenas comprometida.

— Ashe, moral of the story.

Miguel:

Estar de volta, na cidade em que nasci, após tantos anos longe, é no mínimo reconfortante. Cresci correndo por essas ruas, quebrando as janelas dos vizinhos, soltando pipa, correndo de pega—pega com as outras crianças do bairro. Todas as noites as mães se reuniam na calçada de casa para conversar enquanto as crianças brincavam na rua. É ótimo estar de volta ao meu lar.

Quando minha vida inteira desmoronou diante dos meus olhos, eu peguei uma jaqueta e fugi sem olhar para trás, só de pensar em casa, a ferida aberta que existia em meu coração sangrava.

Passei 10 anos em diferentes lugares, em várias missões, conheci vários países, me dediquei ao meu trabalho sem nunca tirar férias. Subi gradativamente primeiro no exército e depois devido à minha formação em direito, foi recrutado para a polícia federal, onde trabalhei em contato direto com a ABIN (agência brasileira de informação).

Só chegou aquele momento, em que a saudade da minha família começou a apertar, eu cresci com uma casa sempre cheia, numa cidade pequena onde todos se conhecem e se ajudam. A solidão da cidade grande me sufocou e cá estou eu, de volta em casa, após fugir para longe de tudo isso por tanto tempo.

— Que bom que chegou — minha mãe sorriu vindo ao meu encontro assim que passei pela porta da sala — já estava com saudades — mamãe é uma mulher pequena, magra, preta, cabelos castanhos, além de ser muito calorosa e muitas vezes têm atitudes bem infantis para a idade que tem.

— Eu estava na delegacia mãe — sorri a abraçando e inalei o cheiro inconfundível de que ela tem uma mistura de canela e castanhas — papai já chegou?

— Sim, só estamos esperando você para jantar levando — caminhamos lado a lado em direção à cozinha.

Cumprimentei meu pai com um abraço e fui para o lavabo lavar minhas mãos antes de sentar à mesa.

— Passei na obra hoje — comentei enquanto colocava purê de batata no prato — logo poderei me mudar e deixar vocês em paz.

— Prefiro que você continue aqui, Miguel — minha mãe falou, largando o garfo e me encarou. — Essa é sua casa, já fiquei tempo demais longe de você — ela suspirou. — Querido, foram longos anos te vendo muito pouco, agora que está aqui não quero tirar meus olhos de você. Já perdi tempo demais do meu filho por causa daquela metida da Isadora... — Ela nunca terminou a frase, já que parou de falar assim que percebeu estar tocando em assunto proibido.

Respirei fundo, sabendo que minha mãe tem razão por estar chateada, eu sei o quanto eles também sofreram com a minha ausência. O motivo que abandonei tudo não é algo que eu goste de falar, eu guardo as lembranças do passado bem no fundo da minha mente e me recuso a remexer em todo aquele sofrimento.

— Eu não vou a lugar nenhum, mamãe — disse tentando tranquilizar seu coração. — Estou trabalhando aqui na cidade e quero estar sempre perto da minha família a partir de agora. Mas eu preciso do meu espaço, a casa fica apenas alguns quarteirões daqui, prometo vir te ver diariamente — sorri pegando sua mão e levando aos lábios, dando um pequeno beijo e ela sorriu. — Afinal, eu sou um homem adulto, preciso da minha privacidade.