TRINTA E UM

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Estou sentada na poltrona antiquada do meu quarto terminando de ler um romance. O vidro quebrado, que eu disse a minha mãe que havia sido um acidente, fora substituído. Mas decidi deixar a janela aberta para que o frescor da noite adentrasse.

Apesar deste frio que constantemente assola Covey East, o tempo tem alternado entre os extremos com uma certa frequência. Do calor insuportável para um frio de bater os dentes. Então antes de sair de casa amanhã seria difícil prever qual tempo teríamos que enfrentar no restante do dia, ainda mais escolher uma roupa que se adequasse a ambos. De qualquer forma esse seria um problema para depois, porque a minha prioridade hoje era outra.

Estive lendo nos últimos quarenta minutos ou pelo menos, tentando. Não demorou mais que isso para que o meu cérebro não conseguisse mais se concentrar nas palavras. Era como elas se estivessem se embaralhando, flutuando ao redor e tudo o que faço é observar a escuridão lá de fora, o céu nublado e sem estrelas.

Hoje mais cedo quando visitei o meu avô ele me disse que uma sombra estava espreitando a casa, provavelmente me esperando. E apesar de ter lido o seu prontuário médico, os termos esquizofrenia, delírios e alucinações não significavam absolutamente nada. Não quando eu tinha um quadro semelhante e a cada dia que passava estava ainda mais convicta de que não sou tão louca, que as coisas que acontecem comigo tem uma verdade, por mais absurda que pareça.

Ainda falta um pouco mais de uma hora para que a minha mãe chegue do trabalho, mas não importava o que eu fazia para o tempo passar mais rápido, ler um livro, assistir TV, organizar o meu guarda-roupa, nada mudava o fato de que as palavras do vovô não saiam da minha cabeça, elas permaneciam ali, rondando em meus pensamentos.

Novamente sem sucesso coloco um marcador na página dezesseis do quinto livro que tentei começar a ler e o devolvo na escrivaninha, junto com os demais.

Fico de pé e alongo o corpo por causa do longo período de tempo que passei sentada de tocaia em frente a janela. Porque por mais que eu não quisesse admitir era exatamente isso que eu fazia aqui. Foi o que estive fazendo desde que a lua apareceu no céu. O esperando. Torcendo para que com um pouco de sorte ou azar a sombra aparecesse outra vez.

Com os olhos fechados inclino a cabeça para trás, subindo os braços o máximo que consigo, sentindo todo o meu corpo estralar.

Imagino que se Duncan sabia da criatura de olhos amarelos sendo que eu sequer cheguei a lhe contar sobre, a probabilidade de também acertar sobre a sombra era grande. Muito grande. Por isso eu já tinha me decidido, passaria a noite inteira acordada se fosse preciso.

Um barulho no jardim me deixa alarmada, e no segundo seguinte, meus olhos estão abertos vasculhando todos os cantos.

Talvez a sombra voltasse, era o que não parei de pensar depois que retornei do St. Bárbara. Ela poderia querer vir terminar o que meu avô impediu.

Abro melhor as cortinas e noto um movimento sutil no canto esquerdo. Meus olhos deslizam rapidamente por cada centímetro do jardim e da floresta do outro lado da rua. Ainda estou vasculhando a floresta com o olhar quando eu imagino ter visto de soslaio uma sombra negra se esconder atrás do tronco da árvore em frente a minha casa. E o mais aterrorizante nisso é que eu poderia jurar que a pessoa ou seja lá o que se escondesse ali mantinha seus olhos fixos em minha direção. Mais como uma sensação do que uma certeza propriamente dita.

Em vez de esperar que ele viesse me pegar, alcanço a lanterna que costumo guardar na minha gaveta de meias e em um ímpeto de coragem desço rapidamente as escadas.

Sei que essa ideia não era boa, talvez uma das piores que já tive, para ser sincera. Mas alguma coisa estava se escondendo ali, algo que o meu avô avisou que viria me buscar. Algo que por mais que me assustasse muito, eu precisava enfrentar, querendo ou não.

Desejo ProibidoOnde histórias criam vida. Descubra agora