Capítulo 1

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Passar por esse lado da cidade, sempre me lembra cenas da minha vida que na verdade acho que nunca esquecerei

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Passar por esse lado da cidade, sempre me lembra cenas da minha vida que na verdade acho que nunca esquecerei. Pedi para que Sr. João viesse comigo, não estava disposto a dirigir pelo subúrbio do Rio, sei que as crianças pedindo nos sinais me distraem. Antes de seguir viagem paramos em uma bomboniere e enchemos as sacolas de doces e pipocas, quando elas se aproximam entregamos uma sacola de doces e uma nota de cem reais. isso tudo por eu nunca esquecer minha origem e saber que é difícil ser uma criança. Sobre meu passado lembro bem as humilhações e sofrimentos vividos, embora  não quisesse pensar nisso, mas foram esses episódios que vivi que me tornaram no homem fechado que sou hoje.

- Pare um instante. - digo para sr. João ao ver a escola que estudei.

Desço do carro e caminho até as grades, hoje sendo sábado ela parece abandonada. Olho para a esquina que eu dobrava, quando saía da escola indo ao orfanato onde vivi toda minha infância e adolescência, os garotos que não aceitavam que os órfãos estudassem junto com eles me perseguiam e me humilhavam muito. Na maioria das vezes eu não me defendia, mas quando eles mexiam com as outras crianças eu partia para cima e as defendia; fazia isso mesmo elas não gostando de mim. Volto para o carro sob o olhar atento do meu motorista e dos dois seguranças que nos acompanham.

- Está muito longe? - pergunto me referindo ao motivo de eu ter voltado nesse lugar após tantos anos.

- Não senhor, só mais duas quadras e estaremos lá.

Confesso que estou ficando ansioso para rever o Carlos, ele era o único amigo que tinha ali naquele lugar. Mesmo eu sempre ajudando e protegendo as outras crianças, elas não gostavam de mim, diziam que eu queria ser santo e era o preferido de dona Marinete. Carlos foi adotado quando nós dois tínhamos dez anos, por uma família humilde daqui de Santa Cruz mesmo, seu pai adotivo era pescador e após isso eu o vi pouco, já que ele ajudava nas pescas. Mas a semana passada minha secretária disse que um homem chamado Carlos havia me procurado e como não pegaram nenhum contato, mandei investigar e hoje estou aqui indo ver se o rapaz que há doze anos não vejo é o que o investigador disse ser.

- Chegamos patrão. - João me acorda dos meus pensamentos.

Olho a minha volta e só vejo praia, nenhuma casa e nenhum vestígio de gente por perto, as casas que vejo ficam a mais ou menos quinze minutos de onde estamos.

- Tem certeza? O GPS pode ter errado. - digo para o homem de minha total confiança que dirige para mim, ele foi meu primeiro funcionário após eu receber a herança.

- Tenho sim, circule aquela rocha e verá uma casa de sapê.

Obedeço seus comandos, mas antes eu tiro meus sapatos e arregaço a calça um pouco, teria que pisar na areia da praia e consequentemente na água também. Vejo que os seguranças me acompanham ao longe, não abro mão deles desde que fui cruelmente assaltado por um dos mendigos que acolhi. Ao fazer o percurso que me foi ordenado, vejo uma casa tão pequena que fico imaginando três pessoas morando ali. Faço um sinal para o segurança que entende e vai lá bater por mim na porta, fico mais ao longe esperando para ver se é o meu amigo mesmo.

- Ninguém aqui chefe. - ele diz já saindo da pequena casa que por sinal estava aberta. - Mas ele pode ser aquele. - aponta para o mar e vemos um barco de pesca e um homem sentado na proa olhando para o horizonte.

- É ele? - Davi meu segurança pergunta.

- Nem eu sei, está muito bronzeado para ser ele, porém o cabelo parece um pouco. Como iremos chamar? - pergunto ao rapaz que tão jovem conseguiu ser o líder de um grupo de seguranças com total responsabilidade.

Sr. João se aproxima de nós com um sorriso terno no rosto e diz que sabe como chamar a atenção do homem no mar. Aponta para mim um estilingue e eu lembro da época que era exímio nessa brincadeira, foi justamente com um que consegui deter o ladrão que roubou Sr. Ruy e me fez viver as melhoras que vivi na minha vida.

- Não demore patrão, atire logo. - Davi fala me incentivando e eu incerto de fazer ou não acabo cedendo a insistência dos dois e vou me aproximando da água para lançar a pedra, essa bate nas costas do homem e ele nos olha, nós três começamos a acenar para que venha perto e ele não conta duas vezes, mergulha e vem ao nosso encontro. Vendo-o vir até nós olho para os dois e sorrio como fazia tempo não sorria assim.

- Só podia ser você, ainda brinca com isso? - ele pergunta rindo enquanto sai do mar.

- Confesso que fazia tempo que não brincava, nem achei que ainda tinha pontaria. - digo olhando o brinquedo. - Quase não te reconheci.

- Olha quem fala, virou galã e eu que sou irreconhecível? - os dois que estão comigo sorriem e eu faço uma carranca. - Não acreditei quando Ana me contou e mostrou sua foto.

- Ainda tem contato com Ana? - lembrei que ele nutria uma paixão por ela na infância.

- De vez em quanto, ela mora no mesmo lugar, frequenta a mesma igreja. Quer entrar?

Aceito e começamos a caminhar para dentro da pequena casa, Sr. João iria entrar comigo e os seguranças ficariam fora, então acho que caberia nós três mais os pais dele lá dentro, foi o que pensei.

 João iria entrar comigo e os seguranças ficariam fora, então acho que caberia nós três mais os pais dele lá dentro, foi o que pensei

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