Não sei qual é a sensação de encontrar o verdadeiro amor. Nem tenho certeza que existe, apesar de pessoalmente crer que é real. Tudo que posso dizer é: se você existe, saiba que estou pacientemente esperando por você.
É assim com todas as pessoas que acreditam em amor verdadeiro, e também é desta forma com aquelas que não acreditam e mesmo assim o encontram.
Seriam Clementine Desfleurs e Ícaro Carvalho destinados um ao outro? Quem pode afirmar, afinal?
O fato é que Clementine e Ícaro tiveram mais uma noite mal dormida.
Clementine sempre fora um pouco cética em relação ao tal amor romântico. Se acreditava em amor? Bem, não era uma religião. Ela conhecia o amor porque amava o irmão e o filho, mas nunca realmente amara a um homem. Não que ela achasse que estava amando Ícaro, no máximo poderia chamar aquilo de paixão, mas temia. Temia por não ter controle e porque era grande demais para conter.
Detestou o fato de passar a noite em claro, sentada em uma cadeira de balanço enquanto olhava para a lua e relembrava o que tinha acontecido. Queria arrancar aquilo de si, mas não conseguia. Até tentou deitar no colchão algumas vezes, mas parecia ter percevejos.
Sempre que fechava os olhos podia ver a face de Ícaro após o beijo. Os olhos brilhantes, pupilas dilatadas e a expressão séria. Enquanto ficava acordada, mesmo que a contragosto, Clementine revivia o instante maravilhoso no qual as bocas se encaixaram e começaram a trabalhar em sintonia gerando nela calores e arrepios que apenas a abstinência de um vício poderia causar.
A razão de Clementine pedia para abandonar tudo aquilo, mas o coração queria reviver a sensação sublime. E nesta luta interna assistiu ao nascer do sol.
O majestoso sol que coloria de vermelho e laranja o céu diurno sobre a fazenda Basto Mato onde Ícaro já ordenhara as vacas, supervisionara outros serviços que estavam sendo feitos por outras pessoas e escovara Reinante.
Quando o sol finalmente nasceu, Ícaro estava sentado no alpendre da área dos fundos, olhando para a antiga senzala que fora reformada para ser uma espécie de edícula. Agarrado em uma garrafa de licor de jenipapo, o homem cantarolava baixinho enquanto refletia sobre todos aqueles sentimentos que surgiram do nada.
Não era comum que os homens falassem de amor, por esse motivo não tinha muita certeza do que pensar, entretanto era inegável que sentiam amor. E com intensidade.
Beijar Clementine fora ao mesmo tempo um passo para se libertar das correntes que o prendiam e para prender em outras que desconhecia. Para ele era impossível explicar como se sentia. Era como um feitiço que o fazia pensar nela o tempo inteiro, e às vezes as lembranças não eram tão boas quanto ele gostaria. O imbecil francês era uma pedra na bota de Ícaro e seria bom se livrar dele.
— Filho. — Perpétua, ainda de camisola comprida e com um xale sobre os ombros estava com uma mão sobre o ombro de Ícaro. — Acordou muito cedo.
Ícaro encheu os pulmões com o fresco ar da manhã e depois soltou com força.
— Ainda não dormi. — Confessou.
— E está bebendo? — Perpétua tomou a garrafa da mão do filho. — Não foi isso que ensinei a ti, Ícaro. Vai se tornar um vagabundo se continuar nesse caminho. Não criei um homem sem rumo.
— Me deixe, mãe. — Ícaro tombou a cabeça entre os joelhos.
— Lembra como ganhou essa terra? Um bêbado dado ao vício do jogo. Nunca esqueça. — A mãe advertiu.
A resposta de Ícaro foi o silêncio absoluto e Perpétua estranhou.
— Tem algo acontecendo? — Questionou.
— Não. — O homem tentou se levantar, mas as pernas bambearam.
Junto à sobriedade da conversa com a mãe, chegou o cansaço.
— Pois eu acho que tem... — Ela insistiu. — Se não estou enganada, está relacionado com o beijo que você deu na tal francesa.
Ícaro virou-se tão rápido para a mãe que ficou tonto, perdeu o equilíbrio e caiu do nível da área ao chão.
Perpétua cruzou os braços no peito e riu.
— Como a senhora sabe? — Ícaro perguntou enquanto se levantava do solo.
— Meu filho, todos que tinham olhos viram. Ou você acha que pode beijar uma pessoa no meio do quintal sem nada bloqueando a visão e ninguém vai perceber? — Perpétua gargalhou da inocência dele.
— Por que não contou? — Ele inquiriu envergonhado.
— Não era da minha conta. — Respondeu simplesmente. — Agora trate de tomar um banho e dormir. Mais tarde vão terminar a obra e você precisa de energia para supervisionar.
Ícaro acatou a ordem da mãe, mas primeiro avisou que nos próximos dias ela precisava ir até a cidade para encomendar roupas e alguns móveis.
— Selecione também algumas pessoas para trabalhar aqui, mãe. E quero fazer uma grande festa, portanto, já é tempo de a senhora ter jóias. — Falou. — Mais tarde combinamos tudo.
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Tesouro de Clementine (Donas do Império - Livro 2) [Concluído]
Ficción histórica[Romance] Dizem que sorte é quando a oportunidade encontra o preparo. A marquesa de Diamantais ofereceu para senhorita Desfleurs a oportunidade de esconder-se em uma de suas propriedades mais suntuosas. Sem melhores opções, a desesperada grávida ace...