Quando todos se foram do quarto, Ícaro finalmente se virou. Enfim a ereção que o obrigara a ficar de costas para todos já tinha desaparecido. Sem cerimônia ele andou até a cama e se sentou enquanto Clementine alinhava as vestes para que ficassem perfeitamente arrumadas, como no início da festa. Ela agia como se estivesse sozinha, pois estava deveras concentrada.
Ícaro limpou a garganta antes de começar a falar.
— Então... — Ele olhou para o teto. — O que faremos agora?
Clementine olhou para ele como se não entendesse o que Ícaro queria dizer.
— Ora... — Ela começou reticente, como se procurasse palavras certas para não magoá-lo. — Não há o que fazer. O que sugere? Casamento? Não sou uma mocinha virginal flagrada pela família.
— Eu sei. — Ícaro soou firme. — Entretanto é inegável que tem afeto por mim.
— Afeto? Talvez. — Clementine admitiu enquanto voltava a olhar para o próprio reflexo no espelho. — Atração? Certamente. Não posso negar diante dos fatos.
— Você tem coração, Clementine Desfleurs? — Ícaro perguntou com o orgulho um pouco ferido.
— Oui. — Foi tudo que ela disse.
Então um silêncio pesado se estabeleceu até que Ícaro resolveu se expressar em totalidade.
— Não se sinta obrigada a retribuir minha confissão, mas a verdade é que tenho grande afeto pela senhorita. — Falou de vez.
Não tinha o que perder.
Clementine estremeceu diante daquelas palavras porque algo irracional dentro de si tremeu ao ouvi-las. Olhou para ele sem saber o que dizer, mas com o coração acelerado.
Ícaro era bonito? Sim. Desejável? Sim. Educado? Grosseiramente, porém era mais do que poderia esperar de alguém com uma trajetória de vida como a dele. Todavia o fator essencial que fazia dele alguém atrativo era o fato de o homem se relacionar bem com Émile. Como mãe zelosa, Clementine tinha o filho por prioridade.
A mulher sentiu que racionalizava demais aquele sentimento, contudo era assim que tudo funcionava desde que se lembrava. Sempre colocava na balança. Se Ícaro fosse o homem perfeito e ela o deixasse escapar por ele não se encaixar em seus cálculos, não havia o que fazer.
Entretanto Ícaro se encaixava perfeitamente no cubo calculado que era a vida de Clementine. Naturalmente, sem esforço. Não era um odioso nobre carregado de pompa de título, nem alguém nascido livre que se considerava superior aos demais. O homem era sempre sincero e só sabia ser assim, lutava pelo que desejava e tinha ideais bem próximos aos dela. Acima de tudo ele era adaptável, tentar cozinhar mostrava isso. A família de Ícaro era boa e jamais se tornaria um incômodo.
Ele cabia perfeitamente em todos os cálculos dela e podia ser escolhido tanto de maneira racional como sentimental.
Quando se deu conta de tal fato, Clementine sentiu as pernas perderem a firmeza e se agarrou à beira da penteadeira. Viu o próprio reflexo e ficou assustada com a forma como tinha corado.
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Tesouro de Clementine (Donas do Império - Livro 2) [Concluído]
Ficción histórica[Romance] Dizem que sorte é quando a oportunidade encontra o preparo. A marquesa de Diamantais ofereceu para senhorita Desfleurs a oportunidade de esconder-se em uma de suas propriedades mais suntuosas. Sem melhores opções, a desesperada grávida ace...