Os dias de Fredrick se seguiram iguais. Acordava, preparava o café da manhã para si e para Allissa, então, ia trabalhar. Pelas manhãs, lecionava para turmas de medicina e durante as tardes, praticava a ortopedia em um hospital de alto padrão. Era bastante comum que seu ofício de professor e de médico se misturassem, já que, por vezes, recebia o dever de orientar os alunos residentes em seus primeiros atendimentos.
Em seu tempo livre entre um e outro emprego, comia e conversava com seus colegas de trabalho que eram, em geral, homens e mulheres com mais ou menos a mesma idade e casados, embora houvesse um ou outro divorciado ou viúvo, como ele próprio. Contentavam-se em falar de seus trabalhos (que resumia o assunto em discutir se o país deveria ou não adotar um sistema de saúde gratuita para a população de baixa renda), reclamar das gerações atuais e das próximas (atitude típica dos mais velhos) e comentar sobre suas famílias.
— É algo com a Allissa, não é? — indagou o doutor Leroux, que estava sentado a frente de Freddy, no refeitório da universidade.
— Não, Lerry, — Fredrick não conseguia pronunciar corretamente a palavra Leroux, por isso apelidou o amigo de Lerry — Allissa está bem. E eu tô bem!
— Não caio nessa, Fred... — Leroux nunca decidia se chamava Fredrick apenas de Freddy ou de Fred. — Você tá estranho desde o aniversário dela. — doutor Leroux e doutor Warren se conheciam há muitos anos, fizeram amizade ainda quando eram médicos residentes no mesmo hospital e um assistiu o outro crescer na carreira e na vida — Sendo a melhor amiga da sua filha, Sam não me diz nada, mas eu sei que ela sabe de algo, então só posso deduzir que tem a ver com a Allie. — ninguém diria que aquele homem baixinho, meio careca e nada atlético acabaria casado com uma linda modelo escocesa. Samantha Osgood Leroux tinha, por sorte, herdado a beleza da mãe, contudo, também foi agraciada e punida, ao mesmo tempo, com o bom humor do pai — Sou seu amigo ou não sou? Vamos, pode me contar o que houve. — e tal como Sam era a melhor amiga de Allie, Lerry era o melhor amigo de Freddy.
— Ok! — Fredrick não queria chatear o amigo — É que... bem...
— Fica tranquilo, amigo... eu vou te apoiar. — Lerry se esticou e deu um tapinha no ombro de Freddy.
— Eu... acompanhei a Allie e a Sam até uma casa noturna... como te falei, para comemorar o aniversário, enfim... — Fredrick sentiu as mãos começarem a suar por causa do que estava prestes a dizer — Quase não acreditei quando vi... hã... quando vi a Allie beijando outra garota.
O cu de Leroux caiu da bunda.
— Freddy, eu não imaginava, nossa... — o doutor de sobrenome francês quase engasgou com a comida — O que fez a respeito?
— Ora, nada. Era aniversário dela, afinal. — Fredrick estava dividido entre bater com a cabeça na parede por mentir ou entregar um Óscar de melhor ator para si mesmo por conseguir improvisar histórias com tanta naturalidade — É que, sabe como essa molecada é...
— Se sei? Essa geração está perdida, meu amigo! — exclamou Lerry — A juventude está ficando cada vez mais depravada...
— Sim, sim... — Freddy cortou o amigo antes que ele começasse a falar "na minha época" — Não sei se isso era só uma coisa de momento ou se é... pra valer...
— Como assim, coisa de momento ou pra valer? — o melhor amigo ficou confuso.
— Quero dizer... A Allissa é lésbica? Ou estava só se divertindo? — Freddy apoiou o queixo em uma das mãos e fitou o nada — E... outra questão é... vai acontecer de novo?
— Escuta, Fred... — Lerry falou após respirar fundo — Se a Allie costumava namorar garotos, então talvez o nome correto seja bissexual, é o que dizem, né? — corrigiu — Ah, sei lá. Não entendo essas coisas, tipo, quando a gente era mais novo, não tinha tanto isso, sabe? Esse negócio de homem beijar homem e mulher beijar mulher e, não sei se era assim para você, meu amigo, — o médico deu uma risada estranha — mas eu costumava ter que batalhar muito para conseguir beijar alguém. A gente tinha que paquerar, ir à casa dos pais e pedir permissão para levar para sair, lembra disso? Essa molecada faz tudo parecer fácil, se agarram em festas como cães no cio, ficam com qualquer um... não, eu não acho isso uma boa coisa...
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De Dentro Para Fora
RomanceFredrick Warren é um médico bem sucedido e já beirando os 50 anos. Viúvo e pai de uma jovem de 21 anos, jamais acreditaria se lhe dissessem que ele se pegaria louco de amores por uma pessoa em uma balada. Acreditaria menos ainda, caso lhe dissessem...