LUIZA
Ao sairmos do carro, as pessoas da fila do cinema ficam olhando para nós. Olho para o Marcos e vejo seu desconforto com a situação. É como ele havia dito, as pessoas olham para ele com ar de pena e nem sequer disfarçam. Uma raiva me bate. Eu não poderia ficar sem fazer nada. Essa é a noite de Marcos e precisa ser especial para ele.
Quando chegamos à bilheteria, o homem me cobra apenas uma entrada.
— Não, mas somos dois — digo, apontando para Marcos. O homem olha de Marcos para mim e diz:
— Ele não pode entrar.
— Como é que é?
— Bem, o cinema não está adaptado para alguém como ele.
— Escuta aqui, — digo enraivecida — mas que espécie de preconceito é esse! Sei muito bem que lá dentro tem espaço suficiente no corredor para ele ficar!
— Bem, é que…
— “É que” nada! Ele é gente como todo mundo aqui, tem os mesmos direitos, previstos em lei, entendeu?
— Ok, entendi.
— Ótimo. Venha, Marcos, vamos entrar.
Não pago nada ao homem. Simplesmente, entro com Marcos no cinema. Sentamos mais para os fundos, pois Marcos prefere assim. Instalo-me numa cadeira da ponta do corredor e ele fica ali, ao meu lado.
O filme é “Juntos e misturados”, uma comédia romântica que conta a história de um viúvo e uma mãe separada, com dificuldades em lidar com seus filhos. Eles se conhecem num encontro fracassado e a primeira impressão que tem um do outro é muito ruim. Por mão do destino, eles acabam indo para o mesmo lugar ao levar seus filhos para uma viagem inesquecível, como nunca tiveram. E ali descobrem o amor e que juntos e misturados, ficam bem melhor.
Ver Marcos rir com o filme é a melhor coisa que poderia ter acontecido para mim. Todo o esforço por ele vale a pena. Percebo então, que o amo de verdade. Meu coração já é todo dele e bate feliz quando ele está feliz. Sorrio feito boba observando-o sorrir. O sorriso dele é a coisa mais linda e preciosa que já vi.
O filme acaba e vamos para casa. Subimos pelo elevador, que Marcos sempre usa, paramos de frente para o outro no corredor dos quartos e ficamos nos olhando.
— Obrigado, me diverti muito! — ele diz.
— Eu também.
Respiramos fundo ao mesmo tempo.
— Tenho algo para você — ele fala.
— Algo para mim?
— Sim, entre — ele aponta para o seu quarto.
Quando entro no quarto, vejo no criado-mudo um buquê de flores dentro de um vaso com água, para não murchar. São lírios brancos, minhas flores preferidas. Como ele soube? Olho para Marcos e vejo que ele não sabe disso, apenas comprou-as. Mas isso é uma prova de que estamos ligados, sem sequer nos dar conta.
— São lindos! — digo emocionada.
— Não mais que você.
Lágrimas escorrem de meus olhos ao fitá-lo e ver ali algo a mais, que faz seus olhos brilharem. O mesmo “algo” que eu sinto por ele. É esse “algo” que nos une, nos impulsiona para os braços um do outro. Sento no seu colo e o beijo. Um beijo profundo, no qual coloco todos os sentimentos que se passam dentro de mim nesse momento.
— Luiza, fique aqui comigo essa noite, por favor — ele diz, com um olhar intenso e ansioso.
— Eu fico.
Ele puxa as cobertas da cama e com esforço, consegue passar para a cama apoiando-se com os braços.
— Você não precisa ter medo de mim, não vou fazer nada que não queira. Só deite aqui comigo. Durma comigo.
Deito ao seu lado e ele me abraça, aconchegando minha cabeça em seu peito másculo. Ficamos assim em silêncio durante alguns segundos.
— É tão bom não se sentir solitário, depois de tanto tempo… — ele murmura baixinho.
Olho para ele e vejo uma profunda emoção em seu semblante. Ele está feliz em apenas estar comigo. Isso me deixa emocionada e apaixonada. Não consigo segurar o beijo que vem em seguida. Começa terno, lento e vai ficando frenético, sensual. Nossas mãos vão deslizando pelos nossos corpos, acariciando suavemente e despindo peça por peça de roupa.
Ele olha para mim, como para ter certeza de que é isso mesmo que quero e eu o agarro pelo pescoço e o beijo outra vez. Nossos corpos se movem ritmicamente, no compasso da paixão. Vamos ficando cada vez mais desejosos e ofegantes. Até que algo acontece e a “dança do amor” termina.
— Tudo bem, não se preocupe — digo a Marcos, tentando acalmá-lo. Deito-me aconchegada em seu peito e acariciando seu abdômen.
— Não está nada bem! Eu devia ter previsto! O que me deu na cabeça de tentar fazer amor com você! Sou mesmo um idiota! Idiota completo!
— Não diga isso! Você não é um idiota, muito pelo contrário… é o homem mais carinhoso, mais romântico que já conheci.
— Mas um homem que nem consegue segurar sua ereção por tempo suficiente para dar prazer a si mesmo e à mulher que ele ama!
— O que? — pergunto, em dúvida se eu tinha ouvido direito.
— O que, “o que”?
— Você disse que me ama? Isso é sério?
— Céus, você só pegou essa parte?
— É a mais importante para mim.
Ele respira fundo, tentando se controlar.
— Sim — ele responde.
— Sim?
— Sim, eu te amo — ele diz olhando em meus olhos.
Eu o beijo emocionada. Lágrimas escorrem entre nossos lábios, todas vindas de meus olhos.
— Não chore, meu amor — ele fala, limpando minhas lágrimas com suas mãos.
— Marcos, eu te amo mais do que tudo. Eu não sou sua ex-namorada.
— Eu sei.
— Você precisa ter paciência com isso. Logo tudo voltará ao normal.
— Será mesmo?
— É dali que vem seu medo de namorar?
— É óbvio! O médico já havia me dito que isso poderia acontecer, mas não tive coragem de testar para comprovar.
— Então, fui a primeira depois do acidente.
— É.
— Certo.
— Que droga de vida! — ele grita, dando um soco no colchão.
— Calma, Marcos. Te amo pelo que você é, não por causa disso. Vamos ser pacientes. Teremos outras tentativas.
— Outras tentativas? Mas e se eu nunca conseguir levar até o fim?
— Vai sim, meu amor — digo, acariciando-o no rosto, olhando em seus olhos. — Nós vamos conseguir. Por enquanto, vamos nos amando alma com alma, coração com coração…
E me deito em seu peito, abraçando-o fortemente e suspirando.
— A propósito… você estava linda hoje, minha bruxinha…
Ele me beija na testa e eu sorrio.
Dormimos assim, no aconchego do amor.
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De Volta à Vida
Short StoryEle, um cadeirante revoltado e isolado. Ela, vem para "balançar seu mundo". Juntos, viverão uma história de amor e superação.