Seis Letras 3.

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Assim que cheguei na casa dela, nem bati, já fui entrando mas não havia ninguém. Corri para a minha casa, mamãe estava no telefone com alguém, assim que me viu desligou o aparelho e já foi logo falando.

- Vai pro hospital. A Joalin está lá com a mãe...

- Merda. - Cortei. Sabia que havia algo errado. - O que houve com ela?

- Com a Lin nada, graças a Deus. Parece que ela recebeu uma ligação do pai e a Joh teve princípio de ataque cardíaco.

Paralisei. Pai? Aquele filho da puta molestador, mas se ele ao menos cogitou chegar perto de minha Lin...

- Corre filho. - Vanessa me tirou do transe.

Me enfiei no carro e voei para o hospital.
Entrei correndo na recepção, quase esbarrando nas pessoas. Pude ver Sina, Noah e... Shivani? Desde quando?

- Cadê a Joalin? - Perguntei olhando para os três.

- Ela tá no quarto. Não quer arredar o pé de lá. - Noah foi o primeiro a falar.

- Cabeçuda. O médico já avisou que a mãe está fora de perigo, mas é teimosa mesmo. - Sina completou.

- Tenho que ir falar com ela...

Antes que me afastasse um par de mãos segurou meus ombros.

- Calma aí bro. - Noah se pôs a minha frente. - Acho que é melhor esperar um pouco, não sei bem o que houve mas a Lin não tá legal não.

- Então ela pode estar precisando de mim.

- Errado de novo. Senta aqui com a gente e espera, me escuta cara. Sou podre pra dar conselho, mas quando resolvo fazer, é porque a coisa tá foda mesmo.

Respirei fundo. Aceitando o conselho dele. Se foi mesmo o pai dela, abalada era apelido.
Já estava no quinto copo de café, o chão a minha volta quase furado de tanto andar no lugar. Foi quando ela apareceu no corredor, cabisbaixa. Tinha os olhos fundos, sem brilho, abraçada a si mesma em um casaco de flanela púrpura do avesso. Meu coração despencou no peito. Queria abraçá-la e lhe dizer que ninguém lhe faria mal.
Quando ela chegou perto, seus olhos opacos vaguearam por todos nós, ela não reagia, só olhava. Corri até seu corpo pequeno e a abracei, beijando o topo de sua cabeça. Mas, ela se afastou, era difícil de acreditar mas parecia enojada. Pensei ser pelo sumiço da tarde, com o telefone descarregado, comecei a explicar antes que ela pensasse asneira.

- Lin. Eu estava realizando as tarefas que você me passou. Não percebi que estava sem carga no celular desculpe.

Ela não me olhou. Estava perdida em algum lugar que eu desconhecia.

- Lin. - Levantei a mão para tocar-lhe o rosto.

Mas ela segurou meu pulso e seus olhos eram apavorados.

- Não. - Uma lágrima escorreu.

Ela não queria que a tocasse. Me perdi ante aquela situação, não lembrava de lhe ter feito nada que pudesse trazer aquele tipo de reação. Ela sumiu corredor adentro, enquanto a observava caminhar a passos rápidos. Sentei em uma poltrona qualquer, logo Noah sentou ao meu lado.

- Cara, não é nada contigo. Sério, essa parada do pai dela assustou pra caralho. - Suas palavras não faziam sentido.

- Mas o que eu tenho haver com isso? - Pus a mão na testa quase arrancando os cabelos junto.

- Tudo. - Bufou. - Lá na escola todo mundo diz que ela tá contigo por causa das coisas do pai. Porque ela gostou. - Me estufei no mesmo instante, isto era ridículo. - Não, calma, eu não acho isso, porque a conheço. Mas pensa. Acho que o subconsciente dela pode ter balançado e agora a ligação foi o estopim.

Então basicamente ela estava mesmo com nojo de mim. Algo na sua cabeça estava associando as coisas. O passado e o presente conflitando minha pequena. Porra. Literalmente estava desabando.

- Bailey. Cara. Tu não vai chorar né? Eu não sei o que fazer quando um cara chora, puta merda, vou chorar junto...

- Calma Urrea. Só to me sentindo um merda, só isso. - Mas sentia a porra dos meus olhos ardendo.

- Não posso fazer muito. Posso ser um merda também se isso ajudar. - Me deu uma cotovelada fraca.

Nesse momento uma enfermeira passava com um copo de água.

- Hey. Muito obrigado, meu amigo estava mesmo precisando. - Noah e sua cara de pau, tomaram o copo da mão da mulher.

- Mas essa água é pro doutor Caleb. - A mulher magrela resmungou.

- Então volte lá na cozinha e pegue outra já que você pode fazer isso e eu não.

A mulher soltou fogo pelas ventas, mas não revidou. Noah veio até mim com o copo, foi bem maneiro da parte dele, mas não queria água. Torci o nariz e ele fez careta.

- Aquela mulher se agarrou tanto na água, que peguei abuso dessa porcaria. Eu disse que podia ser um merda também. - Jogou o copo de água na lixeira e ficou amuado na poltrona vizinha.

- Quer beber? - Sugeri.

- Só se for agora.

Não tinha muito o que fazer. Pensar só piorava tudo. Recorrer a bebida não é lá muito correto. Mas foda-se, se aliviasse um pouco já era lucro.
*
*
*
Joalin Loukamaa.
*
Eu sabia que era ele. Sentia seu cheiro, via suas feições finas, ouvia sua voz rouca e distinta. Mas algo me bloqueava, as coisas se misturaram na minha mente, eu sabia que seria passageiro. Mas por enquanto, talvez por algumas horas, dias, não poderia contar. Eu não conseguia ficar perto de Bailey. E não poderia magoá-lo muito mais do que isso, porque ele não tinha culpa, não merecia meu desprezo. Eu via isso como uma defesa do meu cérebro, na tentativa de manter-me sã, intacta. Para que mais uma vez eu pudesse superar sem sequelas. A polícia disse que tinham pistas quase concretas sobre meu pai e que dariam a resposta amanhã.
Eu não esperava por mais nada. Só esperava que o tempo tratasse de curar logo essas feridas para que pudesse virar a página de uma vez e ser feliz ao lado do homem que amava. Eu o amo tanto que dói ter que afastá-lo, conto que ele compreenda meu ponto de vista e consiga me aguardar sem pressões.
Joh estava dormindo no quarto. Acho que vou vê-la de quinze em quinze minutos.
Quando saimos do hospital dei de cara com Shiv. Isso me despertou um pouco. Ela me pediu perdão, disse que não podia fazer muito, mas faria o que pudesse. Pois é, alguém traduza isso porque também não entendi. O fato é que ela me abraçou e não pude desvencilhar, acho que nem quis também. A deixei chorar um pouco em meus ombros para depois partir com minha mãe.
Estava distraída em pensamentos quando um bater fraco na porta chamou a atenção. Ela fora aberta, revelando um Bailey receoso. Realmente, ainda não me sentia pronta para tê-lo tão perto.

- Não se preocupe. Não vou demorar, nem precisa falar comigo. Só vim te trazer uma coisa e vou embora.

Ele punha a mão aberta na frente do torso, para acalmar. Não sei que impressão lhe passei, mas estava calma, só precisava de tempo.

- Aqui.

Ele esticou a mão e soltou um pedaço de papel dobrado que caiu em meu colo. Observei aquele movimento como se fosse em câmera lenta. Ele deu-me uma última olhada, triste. E se foi, trancando a porta sem fazer ruído.
Peguei aquele papel mínimo entre os dedos. Analisei a folha de caderno comum com linhas vermelhas. Não havia nada escrito por fora. Desdobrei-o devagar, seu tamanho retangular não passava da palma de minha mão. O que me intrigou era o conteúdo, reli aquelas palavrinhas muitas vezes, até de trás pra frente mas não entendi.
Aquelas seis letrinhas tiraram minha concentração em coisas que não queria pensar. Apenas seis letras.
*
*
TAPTOS.

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soft🙁

𝐁𝐨𝐫𝐧 𝐓𝐨 𝐌𝐞  ͟͞➳ 𝓙𝓸𝓪𝓵𝓮𝔂 𝓐𝓭𝓪𝓹𝓽𝓪𝓽𝓲𝓸𝓷Onde histórias criam vida. Descubra agora