Livre 2.

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- Aonde vamos? - Perguntei após algum tempo. Estávamos afastados de casa.

- Assopra ali. - Desviou de minha pergunta, apontando para o vidro do carro.

O carro continuava em movimento, já passávamos de Kensington. Soprei o vidro do carona e parecia ter surgido alguma coisa. Soprei mais e aquela palavra surgiu novamente. TAPTOS.
Mas ao invés de me irritar, lembrei do que ele disse outrora. Nem sempre requer compreensão, só precisamos sentir. Me permiti sentir. Transformei aquela palavra, na minha palavra particular e instantaneamente comecei a ter apreço por ela. Sorriso brotou em minha face, fazendo com que outro brotasse na sua. O efeito da palavra, de uma palavra ininteligível, mas que se fazia presente por ter um significado em suas entrelinhas misteriosas.

- Ainda não desisti de descobrir o que isso significa. Mas agora, já não me deixa inquieta, gosto dessa palavra. - Comentei ao acaso.

Desisti de perguntar onde iríamos. Ele andava cheio de surpresas e mistérios, resolvi não quebrar o encanto do que quer que ele estivesse aprontando.

- Que bom. Só o fato de ela existir somente em nosso mundo, já torna tudo diferente. Mas, gostaria mesmo que você descobrisse. - Seus olhos miravam a estrada, pareciam mais radiantes agora.

- Uma dica? - Pedi. Talvez a leveza do momento o fizesse ser mais piedoso.

- Nope. É fácil Lin. Tão fácil quanto foi amar você.

Ele me olhou por uma fração de segundo. Porém, seu sorriso torto se manteve ali. Meu coração se encheu de emoção, que foi levada até meus dutos lacrimais e os fez escorrer três gotas sutis.
Desviei minha atenção para a janela do carro, e então uma espécie de Déjà Vu aconteceu. Conhecia aquele lugar, embora não recordasse de estar aqui antes.
Bailey estacionou rente a calçada. Desci do carro de olhos fixos no padrão daquelas grades pretas que contornavam toda a extensão do parque. Ele tomou minha mão, e me puxou para o interior do local.
O parque não era tão grande. Tampouco precisava, era todo ornamentado com flores diversas e cercas vivas. Árvores em locais estratégicos, um parquinho infantil e mesas e bancos para piquenique.

- Que lugar lindo. - A sensação de que já estive aqui antes, era intensa mas resolvi não falar sobre isso ainda.

- Vamos deitar aqui.

Ele sentou na grama e apoiou-me para que sentasse junto. Deitamos um ao lado do outro, absorvendo a luz fraquinha do sol.

- Era uma vez uma garotinha de cabelos loiros e olhos azuis esverdeados que mais pareciam brigar para ver quem seria a cor dominante.

Comecei a prestar atenção em seu perfil. Ele falava de olhos fechados. Como se assim, conseguisse lembrar com mais facilidade.

- E havia um garoto de olhos castanhos, que se encantou pela garotinha desde a primeira vez que a viu, ainda bebê. Era um sentimento puro, de criança, como se ela fosse uma irmã. Ele participou de todos os momentos importantes de sua vida. Ele lhe ensinou a falar seu nome, mas ela não conseguia pronunciar direito, ele se irritava mas continuava a amá-la com seu coração infantil. Ele lhe ajudou a andar e ficou mais feliz do que ela quando a viu chegar ao outro lado do percurso.

Comecei a chorar ao ouví-lo dizer aquilo. Eu não sabia de sua participação nesses anos da minha vida.

- Ele sabe de cor todos os presentes que lhe deu ao longo de seus dezessete aniversários e sabe que ela ainda possui boa parte deles. Ele lhe deu seu primeiro chocolate, escondido da mãe. E quase apanhou da sua quando a pequenina apareceu toda suja de marrom. Ele a levava de volta pra casa quando ela fugia da sua e aparecia de repente na cozinha vizinha, pedindo biscoito.

𝐁𝐨𝐫𝐧 𝐓𝐨 𝐌𝐞  ͟͞➳ 𝓙𝓸𝓪𝓵𝓮𝔂 𝓐𝓭𝓪𝓹𝓽𝓪𝓽𝓲𝓸𝓷Onde histórias criam vida. Descubra agora