19. Cereja do bolo

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Era diferente estar no apartamento de Jaebum.

Diferente porque, dessa vez, eu usava minhas próprias roupas invés das suas, e havia mais algumas mudas delas dentro do seu guarda-roupa. Enquanto eu guardava-as, pensava que poderia facilmente me acostumar a fazer aquilo repetidas vezes: andar pelo seu quarto como se fosse familiar, colocando minhas coisas nos lugares onde elas sempre pareceram pertencer. O aquecedor do cômodo era velho, esquentava o lugar bem porque o cômodo era pequeno, mas ele não era empoeirado. O apartamento inteiro dele era feito de móveis e aparelhos velhos, com sutis marcas de uso e algumas peças faltando, mas eram mais limpos e bem cuidados do que eu jamais havia visto.

A cada dia que passava, eu notava uma nova divergência entre nós dois, e aquilo estava tomando uma considerável parte do meu tempo. Passando os olhos pelo seu quarto, desde os lençóis embolados na cama e o tapete não muito felpudo perto da janela, pude notar que eu nunca havia me preocupado com a quantidade de gasolina que o carro que me levava para qualquer lugar que eu quisesse tinha, ou com o quão cheia a geladeira estava para que eu encontrasse algo bom o suficiente para comer.

Enquanto deitava na sua cama, de bruços para cima, fitando o teto, me perguntei se a possibilidade de perder tudo o que tinha — minha família, meu sobrenome, meus cartões de crédito —, por acaso faria alguma diferença para mim, porque às vezes eu sentia que nada era meu de verdade, era tudo do Choi Youngjae que abria um sorriso fingido enquanto tinha uma câmera apontada para o rosto. Eu não poderia sentir falta de algo que nunca significou nada para mim, certo?

— Você não costuma falar pelos cotovelos — meus pensamentos foram interrompidos pela voz de Jaebum — mas tá calado demais.

Com as duas palmas das mãos juntas, apoiei elas entre o travesseiro e minha bochecha, me virando para ele.

Jaebum colocava tranquilamente o cadarço em um all star branquinho que havia acabado de lavar, sem dificuldade alguma. Aquela era uma cena que eu também não tinha o costume de reproduzir, pois eu sequer percebia quando meus calçados sujavam, já que eles sempre apareciam impecáveis e limpos no meu guarda-roupa pela manhã. Ele tinha que cozinhar sua própria comida se quisesse sobreviver e limpar sua própria casa, tornando-a um lugar digno para morar.

Abri a boca algumas vezes, em tentativas falhas de formular uma pergunta, mas nenhum som saía dela realmente. Vinha fazendo aquilo muito, hesitando.

Acompanhei com os olhos ele deixar o tênis em cima da mesa de madeira, o cadarço preso acima da língua por um nó. Ele caminhou na minha direção e me empurrou para o outro lado da cama, deitando ao meu lado na mesma posição em que eu estava inicialmente, agora com os olhos fechados e as mãos entrelaçadas sobre o tronco.

— Pode perguntar — ele enfim disse, simplório.

Pisquei algumas vezes diante da minha transparência. Como sempre, minha mente borbulhava e eu batia os dedos sobre meu peito, procurando as palavras.

— Não é nada demais. De verdade — assegurei. — É só que... Você conhece todo o meu drama familiar com o meus pais e também o Bambam e eu, mas eu sinto que não sei quase nada sobre você, sabe? — Tentei ser cuidadoso. Não era algo que vinha me incomodando em exagero, mas acontecia de eu pensar aquilo. E eu não queria parecer invasivo à princípio, mas as palavras simplesmente escapuliram como se aquele fosse o momento perfeito.

Jaebum ficou em silêncio por alguns segundos.

— Só que eu tenho o melhor beijo da sua vida.

Ri pelo nariz. Ele não perderia a oportunidade, pelo menos não agora quando aquilo estava tão óbvio.

— É, além de você ter o melhor beijo da minha vida.

Ele se mexeu para deitar de lado, com as mãos embaixo da bochecha igual a mim. Era como se tivéssemos cinco anos, prestes a contar um segredo um para o outro.

Bad decisionsOnde histórias criam vida. Descubra agora