O inverno quase se acabava e eu mal havia tocado neve. Elliwe mantinha qualquer estação longe do alcance, sempre na temperatura perfeita e chuvas quando necessário. Era um pouco frustrante pensar que não veríamos a neve começar a derreter para dar espaço para o nascer das flores tímidas. Estávamos ocupados demais com encontros bestas que carregavam em si o peso da vida de meu reino.
— No que está pensando?
Finn me observa atentamente com seus grandes olhos azure enquanto beberica de seu chá negro. Ele está especialmente bonito hoje, os cachos angelicais de seu cabelo especialmente enrolados na coroa de sempre, a roupa bem alinhada e o rosto luminoso. Ele parece um anjo.
— Estou pensando que, se tivéssemos nos casado antes da festa de Vlad isso não estaria acontecendo.
Finn pousa sua xícara no pequeno prato de apoio e cruza as mãos acima do joelho cruzado. Ele se parece especialmente com um reinasse posição. Contenho o ímpeto de abrir a boca de admiração e mordo a língua para me concentrar no que ele tem a dizer.
— Então nesse caso seriam sete príncipes lutando por Emory, incluindo seu amado Jasper.
Estávamos afastados desde que havíamos chegado naquele lugar, e com a competição tudo piorou. Devido ao seu fracasso na primeira prova, nosso tempo juntos era curto e quase nulo, nos forçando a viver uma vida às escondidas resumidas nas visitas que ele fazia ao meu quarto no meio da madrugada. Mas imaginar ele lutando por outra mulher... ainda me dava calafrios.
— Estou segura de que entraremos em um acordo Finn.
Minha amizade com Finn crescia cada vez mais, quanto mais eu o conhecia e testemunhava de sua bondade e bom caráter, mas eu Desejava que ele ganhasse, apesar do amor que sentia por Jasper. Porque no fundo eu sabia que ele seria um rei melhor.
— Precisa estar certa de que consegue um acordo com o ganhador. Só se passou uma prova, não sabe se vou ganhar.
Me encosto na cadeira derrotada, bebendo o chá quente sem me importar na dor da queimação da garganta. Finn me fita intrigado, provavelmente tentando ler meus pensamentos. Mas então uma sombra toma conta de sua expressão, e antes que eu possa prever, ele segura meu queixo por cima da mesa para que eu olhe para ele.
— Kalishta, tem algo muito errado aqui. Preciso que me prometa que vai tomar cuidado com todos, tudo bem? Todos! Você é a peça mais importante do tabuleiro!
Seu polegar acaricia minha bochecha em um tom de preocupação, como se ele realmente se importasse com meu reino. Subitamente me lembro da vez em que Edwin me suplicou ajuda pelos olhos na carruagem, provavelmente sob o feitiço de alguém que conhecia as leis de Rithan, o feitiço do silêncio. Me lembrei de como a voz de Lúcios se parecia com a do homem que ameaçou meu irmão na floresta, e como ele havia instantaneamente se aproximado de Kai desde o princípio. Sua magia era diferente, ele não controlava apenas os elementos, eu vi com meus próprios olhos seu rosto mudar. O que mais aquele homem era capaz de manipular? E quanto ao sumiço de Alex e o ataque que fizeram a mim meses atrás nesse mesmo castelo? Os atacantes deixaram claro que aquilo não se tratava de um ataque aleatório, mas sim algo planejado que contava com informações de alguém de dentro. Cheguei a desconfiar de Jasper e Edwin mas quem mais saberia de cada passo nosso? Alguém que provavelmente se passaria como bom irmão para ajudar Edwin, o futuro rei, alguém com interesse na queda de meu reino, que faria qualquer coisa incluindo se casar comigo e raptar um de meus irmãos para conseguir. Um a um os fatos foram se conectando e as teorias tomando forma em minha mente. O tempo todo fora Lúcios, desde os pequenos ataques às aldeias mais afastadas, até a ideia do sequestro e depois o ataque. Mas ele assim como os outros pensava que Kai era o herdeiro, por isso se preocupou em conquistar meu irmão e não a mim. Cada cochicho cúmplice começou a fazer sentido, a forma que Kai se distanciou de mim. Porque se Kai conseguisse se casar com Emory e Lúcios comigo, ele teria controle sobre três reinos.
— Finn... eu acho que tem algo de muito errado....
Meu sussurro foi interrompido pela abertura das portas enormes que davam para o jardim onde estávamos . Retirei minha mão de cima da de Finn assim que percebi o quanto estávamos próximos. Ele também se afastou conforme Lúcios desfilava para perto da pequena mesa de chá onde estávamos empoleirados. Ajeitei a saia do enorme vestido tentando mascarar o rubor em minha face, sufocando os pensamentos que insistiam em me fazer queimar aquele homem vivo. Mas se ele fora capaz daquilo tudo, eu precisaria ser cuidadosa. Tinha uma grande vantagem sobre ele por ter descoberto tudo sem deixar que ele soubesse que sou a herdeira. Mais um palpite se formava em minha mente conforme ele sorria exibindo aqueles caninos afiados: ele era o herdeiro negro.
— Seu tempo acabou príncipe Finn. Vamos Kalishta? É minha vez de diverti-la.
Lutei contra o ímpeto de dar-lhe um soco na cara pela ousadia estendendo a mão para que ele a envolvesse. Lancei um olhar para Finn que só o príncipe entendeu, um olhar que dizia que eu havia entendido nossa conversa. E então sem mais delongas, o príncipe negro me arrastou para dentro do palácio em passos lentos, como se sentisse minha sapatilha formando bolhas nos meus calcanhares.
— Pés sensíveis certo?
Me segurei o máximo que pude para não estremecer com o tom grave de sua voz, afastando as lembranças da floresta.
— Sim.
Lúcios para subitamente me fazendo encara-lo confusa. Então ele faz algo que eu nunca em mil anos imaginária o príncipe manipulador fazer. Lúcios se virou para mim e se ajoelhou aos meus pés.
— Calma princesa, seu pedido de casamento será melhor que isso. Agora me de seu pé.
Fechei a boca tintinando os dentes, envergonhada por tê-la escancarado pela ação do príncipe. Ergui um pouco a bainha da saia, o suficiente para esticar um dos pés até o príncipe, que retirou a sapatilha com cuidado como se fosse um artigo raro de arte. Então estendeu a outra mão fazendo sinal para que eu estendesse o outro pé. Ainda um pouco relutante, deixei que ele retirasse a segunda sapatilha, sentindo alívio por todo o corpo quando meus pés se encontraram livres. Flexionei os dedos aproveitando a liberdade, concentrada demais para notar o quanto o príncipe me olhava intrigado.
— Não deixe de andar descalça se isso te faz bem.
Aquilo amenizou o ódio e me ajudou a pensar. Se era assim que o príncipe queria, assim iria ser. Eu entraria em seu jogo e deixaria que ele pensasse que está me conquistando como faz com todos ao redor. Mas sou mais esperta. Quando o príncipe caísse, nem saberia o que havia o atingido.
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O herdeiro negro
Short StoryDepois de juntar todos os herdeiros do país dourado, os cinco amigos e mais alguns agregados entram em uma missão para fortalecer a si mesmos e retomar o controle das mãos do herdeiro negro. Mas intrigas e confusões esperam pelos príncipes e princes...