A alavanca no final do armário fez a parede atrás deste se afastar silenciosamente, o suficiente para que eu e Emory nos arrastássemos pela parede de pedra, para fora daquele lugar. Se a princesa pareceu preocupada ou incerta pela mãe naquela sala com o próprio herdeiro negro, não deixou transparecer. Ela manteve o queixo levantado enquanto avançávamos por túneis úmidos do castelo, passagens subterrâneas que nos levaram direto ao meio da floresta. Meu coração ainda se apertava de covardia, medo de deixar meus outros irmãos e os príncipes para trás, me perguntando se todos eles seriam suficiente para deter Kai, agora que eu sabia de seus poderes. A grama despontava por nossos pés, a mata cada vez mais fechada conforme Emory nos levava cada vez mais ao centro da floresta. Percebi que chegávamos ao nosso destino quando escutei as vozes esganiçadas das irmãs de Jasper discutindo com o pobre cocheiro. Na verdade... só uma delas.
— A essa altura elas já se foram, ou vão por outro caminho! Não aguento mais esperar! Já é quase madrugada!
Emory sai de dentro da floresta na minha frente, adentrando a clareira em que seus irmãos pequenos e as irmãs de Jasper nos esperam, falando a faladora infeliz. Eu não fazia ideia de como estava minha cara, mas não devia estar muito boa pela reação que Jannet teve. A irmã boa e não tão chata se aproximou de mim, os olhos preocupados a cada passo, até que seus braços me apertassem contra ela em um abraço lento. Eu não sei porque, talvez pela exaustão mental ou corporal, mas aceitei o abraço e enterrei a cabeça no pescoço da garota. E chorei. Cada lágrima que não havia derramado antes saiu naquele momento, o momento em que parei de me concentrar em fugir e me lembrei de tudo o que meu irmão havia feito. Ele... falou sobre o sangue dos meus irmãos, os irmãos DELE!
— Vamos.
Emory passou um braço por cima dos meus ombros me guiando até a carruagem que já abrigava seus irmãos. A princesa mais nova sentada pacientemente ao lado do irmão, mal percebeu quando entramos, se mantendo concentrada no movimento do pequeno príncipe ao seu lado, nos dedos dele conforme manuseava uma pequena peça de prata. Uma peça de prata em formato de dragão em uma das mãos, enquanto estendia a mão para pegar a outra peça, que repousava no colo da princesa, uma princesinha de prata. A carruagem tomou partida assim que a porta da carruagem se fechou, me confinando a uma viagem de sabe-se-lá quantas horas entre Emory e Jannet , com a amada Jeanna na minha frente.
— Mas e... e os príncipes?
Emory e Jeanna trocam um olhar tenso por cima da minha cabeça .
— Minha mãe avisou que... enquanto os príncipes testavam sob juramento, não podiam usar seu poder em máximo potencial. Mas agora que estão livres, não tenho dúvidas que eles podem fugir em segurança.
— Então por que saímos primeiro?
A minha pergunta prece surpreender Emory, porque a princesa encolhe os ombros ao meu lado, quase imperceptivelmente, olhando para os próprios irmãos com cautela.
— Precisavam me tirar de lá...
Abro a boca com o questionamento entalado da garganta, mas o estalido de metal contra o piso de madeira me faz parar. Todas nós olhamos para o pequeno príncipe, o qual eu nem me lembro o nome. O garoto tinha cabelos e pele escuros como as duas irmãs, o rosto sério demais para aquela idade. O dragão de prata estava caído ao seus pés, a irmã com os olhos negros arregalados conforme observava o irmão que se levantava petrificado.
— O que está fazendo? Vai cair!
O garoto não escutou, ele permaneceu olhando para frente, para a parede cinza da carruagem conforme forçava os músculos da coxa para se ajustarem ao movimento da carruagem ao se colocar de pé. Emory fez menção de agarrar o irmão antes que algo desse muito errado, mas algo a fez parar. O pequeno menino encarou a irmã ao seu lado e ela gritou. Quando ele se virou para nós entendemos o porque: suas pupilas estavam vermelho carmesim.
— Kali, doce Kalishta.
Um calafrio percorre meu corpo quando noto o jeito de falar de Kai mesmo através da voz fina e jovem do garoto que pronuncia cada palavra. Uma gargalhada escapa de sua garganta, tão sinistra que poderia ter feito a carruagem estremecer.
— Acha que pode fugir de mim irmãzinha?
O garoto da um passo à frente com um sorriso demoníaco estampado no rosto. Ele não vacila, seu apoio firme e forte graças ao controle de Kai, um apoio que nenhuma criança normal teria.
— Acha que qualquer um de vocês pode fugir? Não, não podem. É só pensar . Eu sinto o país inteiro enquanto você sente apenas Kibtaysh. Acha que é paril para mim? Aprendi alguns truques observando sua dança com Lúcios na neve.
Por alguns momentos o garoto apenas me analisa, minhas reações, minha surpresa. O dia em que Lúcios mudou de forma, se prevendo tanto com Kai que acreditei profundamente. E ali estava ele: me dizendo que também poderia fazê-lo. Era para nós separar? Nos fazer duvidar uns dos outros? A partir dali ele podia ser qualquer um, poderia se infiltrar sem que desconfiassem. Meu coração se apertou, junto com a esperança que se esvaia por meus dedos.
— Ah Emory, parabéns, conseguiu imunidade contra mim. Não vou te machucar devido à situação, não precisava fugir... boa sorte. Vão precisar.
A pupila do garoto volta a ser negra alguns segundos antes que ele desabe sobre o banco, sua irmã mais velha correndo até ele com os braços estendidos. Ninguém ousa dizer uma palavra sequer conforme a carruagem sacoleja e nos leva pela mata entreaberta. O sol começou a nascer e nenhuma de nós havia falado, ou dormido. Apenas os príncipes menores repousavam, jogados um no outro com expressões completamente calmas.
— Emory, — Jeanna quebra o silêncio, mais seria do que eu jamais havia visto— por que está imune? E por que precisava tanto sair do palácio mesmo que isso significasse sacrificar os príncipes?
Sacrificar... eu ainda não havia pensado nessa palavra. Me arrepiei só de pensar na possibilidade de Kai tirar s vida de alguém, a vida de pessoas que eu aprendi a amar. Havia mágoa na voz da princesa quando ela respondeu, talvez uma grama de culpa transparecendo suas expressões.
— Porque eu estou grávida...
VOCÊ ESTÁ LENDO
O herdeiro negro
Proză scurtăDepois de juntar todos os herdeiros do país dourado, os cinco amigos e mais alguns agregados entram em uma missão para fortalecer a si mesmos e retomar o controle das mãos do herdeiro negro. Mas intrigas e confusões esperam pelos príncipes e princes...