Cap.20-Drogada

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O coração estava acelerado, minhas pernas cansadas de tanto correr, a planta do pé com certeza sangrava, os pulmões ardiam de tanto dióxido de carbono contido neles, não aguentava mais.

Risos...

Risos distantes e misturados, ouvia eles gritarem meu nome e dizerem que era culpada de tudo que estava a acontecer comigo, olhei para o céu escuro, a lua avermelhada combinava com o vestido rasgado que usava da mesma cor.

As lágrimas rolavam em meu rosto e assustada tentava recuperar o fôlego, apenas as árvores da mata densa me encaravam, estava perdida, se calhar eles tivessem ficado para trás, todos aqueles lobos que me perseguiam, estava a salvo agora.

Comecei a andar devagar, senti uma mão tocar em meu ombro e assustada virei-me, os olhos azuis que tanto amava me encararam, era ele...

-Miguel...-sussurei emocionada enquanto ele tocava o meu rosto.-És mesmo tu?-perguntei como em todos outros dias desde que aquele pesadelo começou e a resposta foi a mesma de sempre:

-Tu sabes que eu não sou real...-disse baixinho com o sorriso no rosto.

Senti a água fria bater em meu rosto seguida da sensação de afogamento, o quê?

Abri os olhos cuspindo a água e com esforço procurava o ar, foi só mais um pesadelo. Tremendo como em todas as manhãs limpei as gotículas de meu rosto, a raiva era a única coisa que percorria em minhas veias.

-Acordou girassol?-perguntou Raquel deixando o balde de ferro no chão com alguma água no seu interior.

Os sapatos amarelos vibrantes e as unhas bem feitas lembravam-me do dia em que nos conhecemos, nunca poderia imaginar que era ainda mais maluca que Luís e Liana juntos.

-Raquel...-disse com a voz fraca, meu estômago roncava e aquela sensação de tontura não me permitia raciocinar direito.

-Toma, deves estar com sede!-disse como sempre entregando o copo com água.-Vamos e não a deites fora, tu sabes o que aconteceu da última vez.-disse sorridente e sem muitas opções segurei no copo olhando para o conteúdo.

Eu sabia que ela estava a drogar-me mas não tinha escolha, aquela era a única água que ela dava para mim e da última vez que arrisquei atirar o copo não recebi nem a maldita refeição do dia, se é que poderia chamar-se refeição àquilo.

-Raquel, eu preciso beber água de verdade.-disse dando um gole, a cada dia o sabor da tal substância se fazia sentir ainda mais forte.

-Existe água mais pura que a água benta?-perguntou narcótica e eu a encarei confusa.-Essa é a água da tua salvação Mel , a única que tu necessitas para te redimires dos teus pecados.-sorriu.

-Hoje eu estou de bom humor Amélia.-disse com aquela energia exagerada.-Por isso trouxe-te um presente.-continuou arrastando a tal coisa que tinha um pano escuro cobrindo-lhe por cima.

-Taram!!!-disse retirando o pano para mostrar o espelho.

Olhei para a mulher que me encarava ao espelho, seu cabelo encolhido e maltratado, as olheiras e a pele pálida, seminua com a mesma roupa interior da gala, a corrente em meu pé esquerdo e as mãos atadas pelas algemas, deitada no velho colchão fedido que com certeza tinha percevejos.

Uma fina lágrima escorregou de meu olho, não fazia ideia de quanto tempo se tinha passado, se dois dias, uma semana ou um mês, a minha percepção de tempo e espaço estava muito alterada por causa da maldita droga que Raquel colocava na água.

Amélia 2 [CONTINUA]Onde histórias criam vida. Descubra agora