Capítulo 14
- Onii-chan, você vai se atrasar! - Não respondo as ordens da Natsu, apenas fico escondido embaixo das cobertas. Vou ficar quietinho, vai que ela desiste.- Onii-chan! - é, não vai desistir.
- Me deixa, Natsu! Eu não vou pra escola! - la é o último lugar pra onde eu desejo ir. Quero ficar assim, trancado no meu quarto, sem ninguém para me machucar.
- Você já faltou duas semanas, Akira Kobayashi! - me sento na cama, cheio de raiva. A última coisa que eu quero no momento é a Natsu me dando ordens. - Você precisa ir, vai reprovar desse jeito e…
- Que se dane! - interrompo minha irmã, saio da cama irritado. - Quero ficar sozinho, deixe-me, Natsu! - bato a porta na cara dela. - Eu quero só ficar em paz, isso é pedir muito? Eu quero ficar no meu quarto, protegido de todo mal nesse mundo...
Resolvo voltar a deitar, já com vontade de chorar. Eu sou um bebê chorão, chorar é a coisa que mais fiz nessas duas semanas.
Qual o motivo desse papo depressivo? Alex. Aquele maldito passou de todos os limites, me bater eu até aguentava, mas agora assediar? Ele é um nojento. Me pegou desprevenido e aproveitou disso para abusar do meu corpo. Por sorte ele não fez mais do que me tocar, porque se tivesse ido até o final, eu estaria completamente morto por dentro. Eu fiquei com vergonha por ter sido tocado daquele jeito, então me escondi no vestiário do ginásio. Quando o Cauã e o Igor me encontraram, fiquei muito feliz. Aqueles dois sempre sabem me defender. Depois que fiquei sozinho com o Cauã, contei tudo que aconteceu e ele ficou muito raiva, me obrigou a ir na diretoria entregar aquele tarado, isso foi bom, na verdade. Alex foi expulso do colégio, o que me deixa mais tranquilo.
Eu preciso superar isso logo, mas é assustador. Traumas recentes acabam comigo, ainda mais quando eu lembro do meu trauma do passado: ser jogado de uma escadaria e quebrar as pernas. Acho difícil encontrar alguém com tanto azar na vida quanto eu. Primeiro se quebrar todo e agora assediado? Queria que o Alex fosse maior de idade, assim eu lhe jogaria na cadeia. Mas infelizmente, ele é da minha idade. Terceira coisa ruim que acontece comigo: eu não paro de pensar no Danilo. Ele aparece em meus sonhos, me abraça, me... beija.
Ai, que vergonha!
Quer saber? Eu vou voltar a dormir.
Passo horas dormindo e quando acordo, percebo um par de olhos me encarando.
- Aah! - dou um grito de susto.
- Pra que gritar? - começo a reconhecer aquele par de olhos de Neko. - Akira, levanta. - grito de susto mais uma vez. - Para de gritar, idiota. Sou eu, o Cauã. - suspiro aliviado. Já estava pensando que era um sequestrador.
- C-Cauã? O que faz aqui? - me sento, assustado. Meu coração parece que vai sair pela boca.
- Seu amigo não para de mandar mensagem pra saber de você, então… - pega o celular e aperta alguns botões. - Diz que tá tudo bem. - joga o aparelho já minha mão. Vejo que está chamando um número, o do Danilo. E sim, eu decorei o número dele. Eu sou bom em decorar números de telefone, é um super poder útil e não útil. - Não! Não tenho coragem! - tento de devolver o celular, mas Cauã não aceita de jeito nenhum..
- Tá chamando. - sorri de lado. Aquele seu sorriso de convencido de quando ganha uma partida de vídeo game.
- Te odeio, Cauã. - a chamada é atendida. Meu corpo congela no lugar.
- Alô? Cauã? - meu corpo trava quando escuto a sua voz. - Alguma notícia da Japa? Fala rápido, tô num intervalo do treino.
Não? O que eu falo? Eu….
- Danilo… - digo num sussurro. - Sou eu.
- Japa?! - grita tão alto que faz meu ouvido doer. - Você tá bem? Tava preocupado.
Sério? Nem percebi...
- E-Estou bem. Não precisa se preocupar. - coço a nuca. - Desculpa por te preocupar.
- Idiota! Você me matou de preocupação! Sumiu do nada sem me dizer o motivo e depois, o Igor disse que você quebrou o celular e se machucou... Tem ideia de como eu queria saber como você estava?
Minhas bochechas esquentam, devo estar parecendo um pimentão.
- Obrigada por se preocupar, Danilo. Mas eu estou bem…
- Eu sei que não! O Cauã disse que você não vai à escola há duas semanas. Você é idiota? Tá querendo reprovar?
Eita. Ele tá bravo mesmo.
- Eu vou voltar, idiota! Só estou tomando coragem.
- Você é completamente corajosa, Japa. Só de você conseguir dizer que vai voltar, já mostra sua força de vontade. Vou ficar feliz se voltar mesmo para a escola.
- E-Eu... para de me deixar sem graça, baka! - falo uma palavra japonesa que significa idiota.
- Não vem falando em japonês, não!
- Você que provocou!
- Eu só estou tentando te animar! Sou péssimo nisso, dê valor ao meu esforço!
- Ele tá todo vermelho, Japa! - alguém diz no fundo da ligação.
- Thiago, cala a boca antes que eu quebre suas pernas!
- Seus amigos são engraçados. - comento rindo. - Mas o mais engraçado é você. E… você é também é muito fofo...
- N-não sou.
- Ficou mais vermelho ainda! E gaguejou! - mais uma vez escuto outra voz no fundo da ligação.
- Fiquem quietos!
- Danilo, você incrível. Me sinto mal por não te contar algumas coisas… - comento em tom melancólico.
- Tipo?
Que eu sou homem.
- Ah, esquece. Um dia te conto. Acho que agora você precisa ir, não é?
- Não, não! O Danilo fica mais um pouco, né, Lucas? - essa é a voz do Bruno?
- Claro. É a primeira vez que o nosso Danilo namorada sério, então temos que ver isso.
- "Primeira vez que namora sério"? - repito a frase por instinto. - Ele namora muito?
- Não!
- Sim! - várias vozes dizem. - Semana passada ele está beijando aquela menina do terceiro, né?
- Bruno, quieto! - Danilo grita. Sinto meu sangue ferver de raiva. - Japa, nao acredita neles?
- Tarde de mais. Você por acaso está tentando me iludir, Danilo?
- Não! Claro que não! Não liga pro que eles falam!
- Então minhas suspeitas estavam certas. - fico meio triste ao pensar nisso. - Se você pensa que vai conseguir alguma coisa comigo, pode ir desistindo. Eu não gosto de homens. - desligo a chamada.
Cauã me encara sem reação, mas depois começa a rir, o que me dá um susto enorme. Ele está mesmo rindo, ou estou vendo errado? Caramba, que sorriso lindo! Agora eu entendo porque o Igor é tão apaixonado por ele.
- Maldade, Akira. - continua rindo.
- Que? Por quê?
- Você certamente gosta de homens.
…
Danilo
- Eu não gosto de homens.
Chamada encerrada.
O time todo está me olhando, alguns sem reação. Mas o pior sou eu, que estou travado no lugar com o coração partido. Escuto todos comentarem, enquanto fico em silêncio.
- Ih, Danilo, deu ruim! - Lorenzo zoa com a minha cara. - A menina gosta da mesma fruta que você!
- Quem diria que o rei teria tanto azar no amor. - Eu vou matar esse Thiago.
- Sinto muito, Danilo. Você parecia mesmo gostar dela. - diz Lucas.
Todos ficam falando sem parar, me deixando meio zonzo.
- Calem a boca! - não aguento mais ser o assunto do time, então saio correndo do ginásio. Vou para os fundos da escola, me sentando.
Ela gosta de mulheres? Lésbica? Não acredito. Não tenho nada contra isso, mas tinha que ser justo a Japa? Eu pensei que… sei lá, que ela estava interessada em mim também.
Pelo jeito foi um engano. Que merda. Bem quando eu estava tendo quase certeza que gosto mais de mulheres do que de homens.
- Danilo! - o mais baixo do time, Bruno, aparece na minha frente, com o rosto preocupado. - Sério que você está chorando aqui no fundo da escola?
Toco meu rosto e sinto algo molhado. Arregalo os olhos, sem acreditar que estou chorando. O que deu em mim? Eu nunca choro!
- Entrou algo no meu olho. - uso a desculpa mais óbvia de todas.
- Você tava gostando mesmo dessa menina, né? - Bruno se senta ao meu lado. - Mas eu acho que ela só disse aquilo porque ficou com raiva de você.
- Mas eu não fiz nada de errado. Eu acho…
- Você se trancou no vestiário com uma menina semana passada. Sabe se lá o que vocês fizeram lá dentro. - coro ao lembrar.
Acho que não preciso contar que a boca da garota foi para no meu…
- Eu…
- Acho você precisa de um conselho de alguém mais experiente. - Samuel aparece, com sua pose de mãe do time.
- Da onde você surgiu? - pergunto assustado. Eu desviei o olhar por alguns segundos e ele já apareceu na minha frente.
- Sei quando um dos meus jogadores precisam de ajuda. E dessa vez eu sei bem o que te dizer. - senta ao meu lado direito. - Danilo, você é meio que…
- Rodado. - Bruno completa.
- Eu?! Eu sou rodado?! - tá aí uma coisa que nunca imaginei ouvir.
- Não é bem isso. Você só… fica com meninas de mais?
- Mas eu não fiquei com tantas! - digo indignado.
- Sério? Semana passada você ficou com três, se não me engano.
Isso tem uma explicação: eu estava carente e aceitei tudo que apareceu na minha frente. Só não beijei um homem. Eu ainda não entendi meus sentimentos, se gosto de homens ou não. E enquanto eu não entendia, resolvi sai beijando geral para ver se gosto mesmo de mulheres. Resultado? Não importa quem seja, se não for a Japa.
- É que… droga.- volto para o assunto. - Fiquei. Mas isso não quer dizer que eu seja rodado.
- Não, claro que não. Cada um fica com quem quiser e não precisa se importar com que os outros pensam. Mas, Danilo, uma menina correta como a Japa não vai querer namorar você sabendo dessa fama.
- Mas como ela ficou sabendo? Ela mora em São Paulo.
- Mulher tem o dom de descobrir as coisas. É tipo um sexto sentido, como o sentido de mãe.
- Você sabe porque tem isso. Samuel, você é praticamente nossa mãe.
- Obrigado. - sorri. - Agora nós poderíamos pensar em um jeito de te ajudar com a sua crush.
- Mas se ela gostar de mulheres, não vai ter como.
- Só por uma saia. - reviro os olhos ao ouvir esse comentário do líbero.
- Tenho uma ideia! - o albino diz.
- Qual? - pergunto, com um pouco de esperança.
- Danilo, por que você não vai pra São Paulo essa semana? Pode aparecer do nada na escola dela e aí vão poder conversar direito. Faça uma surpresa!
- Eu…
- Não acho que é uma boa ideia! - Bruno quase grita. - É que… ela pode ficar brava.
- Sim, pode. Mas é o único jeito dos dois se acertarem.
- Mas…
- Você tá certo, Samuel. Só vai ser difícil sair de casa. Minha mãe não é a mais boazinha.
- Então é melhor desistir disso. - Nós dois olhamos para o baixinho sem entender o porquê dele estar contra. - Merda. - sussurra.
- O que você tem? - Samuel pergunta.
- N-nada. Acabei de me lembrar que vou embora com o Adrian, tenho que ir! - sai correndo sem falar mais nada.
- O deu nele?
- Parece que hoje o Bruno vai dormir na casa do Adrian, então é normal estar meio ansioso.
Minha mente demora processar a informação.
- Entendi… Sabe, ainda não entendo como os dois… é…
- Fazem amor? - concordo balançando a cabeça. - Qual parte você não entende?
- Tudo. Sentir atração por homem ao ponto disso? E pior, ter algo dentro de si… - e também não entendo como um cara do tamanho do Adrian entra no Bruno. Mas prefiro não comentar isso e se possível, nem imaginar.
- Danilo, não é tão confuso quanto você pensa. É natural. Você simplesmente começa a ter a necessidade de ter corpo daquela pessoa colado no seu, fica querendo seus beijos sempre, amar incondicionalmente. Você primeiro sente essas coisas, só aí você percebe que é amor. E quando é amor, não importa o sexo da pessoa. É maravilhoso amar alguém.
Quando ele termina, estou vermelho. Samuel sabe mesmo como aconselhar alguém.
- A-Acho que entendi. Mas a Japa é mulher, então acho que sou hetero. - sou o hetero mais gay do universo.
- Você nunca vai saber se não testar. Só não saia fazendo com qualquer um, é perigoso. Usar proteção sempre, ok? - Se levanta, sem se importar com o quanto me deixou sem graça agora. Bate a poeira das roupas e logo continuo. - Tá na hora de ir embora.
- Sim. Obrigado, Samuel. Você é uma ótima mãe de time.
- Ainda não entendo de onde tiraram esse apelido. - dá risada. - Se eu sou a mãe, quem é o pai? - fico sem saber como responder isso, mas enfim respondo:
- O Lucas.
- Ah, tá. Entendi. Cada uma… - sorri. - Eu vou indo. Até e boa sorte.
- Obrigado.
Agora vou ir para casa. Amanhã vai ser um grande dia na... escola da minha japinha.
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A distância de um coração
Teen FictionDanilo é como qualquer outro garoto de sua idade, animado, se diverte com seu clube de vôlei, namora algumas pessoas... entretanto, de uns tempos para cá, se encontra com uma pulga atrás da orelha: qual seria sua sexualidade? Até que um dia ele con...