Andei desconfortavelmente sem falar nada com Eduardo durante algum tempo, machucando meus pés nas malditas pedrinhas da rua mal asfaltada, mordendo meus lábios e tentando pensar em algum discurso para o amigo oculto.
Dudu nunca me tratou como inferior, de forma alguma, sempre me ajuda em algumas matérias da faculdade e eu o ajudo de volta em outras, é uma troca e ele valoriza muito meu conhecimento, não só acadêmico mas de cultura pop, "informações inúteis" também. E eu valorizo o dele.
Ví Lavínia poucas vezes, sempre de longe, nunca poderia imaginar que ela pensa assim de mim. E André também... como uma burra, uma pessoa que teve menos acesso a conhecimento, que não consegue acompanhar as conversas deles. Deveria estar agradecida que eles esperaram eu sair para falar de mim? Talvez fosse só mais uma forma de demonstrarem a "classe" deles.
Parabéns pra eles, então.
Lágrimas começam a surgir nos meus olhos com esses pensamentos que eu sempre tento ignorar. Dudu teve uma educação muito melhor que a minha, e ainda tem, e as vezes eu fico perdida quando ele fala algumas coisas, e sempre tento fingir que nada aconteceu e seguir em frente.
Será que os pais dele não me acham boa suficiente para namorar com ele?
— Ah Ju, vai ficar com essa cara feia ai por quanto tempo até desabafar comigo? — Eduardo acaba com o silêncio.
— Se ficar sendo ignorante assim vou ficar pra sempre.
— Vai nada, ce ama desabafar comigo, fala aí vai.
— Você me acha burra? — falo rapidamente e com a voz baixa, já me arrependendo de ter esses pensamentos.
— O que? — pergunta com uma expressão de dúvida.
— Burra, B-U-R-R-A , ah! Pelo menos eu sei soletrar né.
— Claro que eu não te acho burra Ju, que isso?
— É que...
— Meus pais? — ele suspira alto.
— É.
Ele pega minhas duas mãos e paramos no meio da rua, aperta minhas mãos e sorri para mim, não consigo continuar fazendo biquinho quando sorri assim, tão lindo.
— Meus pais são esnobes por terem estudado muito. Assim, eu sou também, nunca notou?
— Não, Dudu, você não é, sempre me trata tão bem...
— Tudo bem Ju, eu sou um pouco sim, tento não ser, mas as vezes sai sem eu perceber — ele respira fundo e olha para o céu, parecendo estar pensando nas palavras certas para usar — meus pais sempre valorizaram muito o meio acadêmico e eu cresci assim, mas não quer dizer que é certo — faz uma pausa e respira fundo novamente — existem vários tipos de inteligência e você não é só inteligente em meios acadêmicos, melhor da sua turma, esforçada, mas também toca piano maravilhosamente, canta como uma sereia, cozinha melhor que a Ana Maria Braga, é sociável, lida bem com crianças, putz, você tem tantas qualidades que se eu ficar citando todas você não chega pra ceia hoje.
— Você tem qualidades também tipo, até que é bonitinho.
Ele sorri novamente me deixando completamente rendida, passa uma de suas mãos para minha cintura e outra para minha nuca, agarrando alguns fios de meu cabelo, seu corpo se cola no meu e eu acabo com o resto da distância entre nós. Nossos lábios se tocam e toda a tensão de meu corpo some enquanto o beijo.
— É só que seus pais são tão inteligentes e elegantes, eu quero que eles gostem de mim, quero ser como eles! É tão difícil ver pretos ricos e inteligentes por aqui, sabe? Só quero que eles gostem de mim.
— Você não precisa da validação deles pra ser uma mulher linda, inteligente e realizada, okay? Nem de ninguém.
— Obrigada meu bem.
— Nunca fique insegura ou chateada e não me conte, ok? Se não for pra te exaltar pra que eu estaria aqui?
— Pelo sexo? — digo enquanto passo minhas mãos pelas suas costas.
— Sim, de fato, acho que estou fazendo isso de namorar errado.
— Eu particularmente só estou contigo pelo sexo.
— Ah, eu sei — revira os olhos ao me responder e se afasta um pouco.
— Assim, é bom também quando paga lanche pra mim...
— Nasci pra te servir, amor.
— Ai que coisa doentia — faço careta pensando nos filmes que vimos juntos com o tanto de relacionamentos abusivos que começam assim.
— Ele mataria por ela, ela morreria por ele...
— Quando vamos lançar nosso canal do Youtube chamado "só fala bosta"? — lembro dos nossos planos de ter uma canal juntos, falar de variedades, cozinhar...
— More, acho que você não gostaria de lidar com o hate.
— É, melhor não.
— Eu acho que não conseguiria lidar com o hate — diz depois de pensar por alguns segundos.
— Ce é sensível mesmo.
— A frase "gosto de mulheres bonitas que me humilham" nunca foi tão verdade.
— Tá vendo — dou um leve tapa em sua testa e ele ri para mim.
— Te amo também, Ju.
— Você me diria se eu passasse dos limites com as brincadeiras né?
— Você me diria?
— Só depois que passasse muito e eu já tivesse guardando muito rancor.
— Ai ce me quebra.
— Mas eu queria mesmo era te quebrar de outra forma.
— Olokinho meu!
Voltei para seus braços e beijei seu rosto, seu queixo e seu pescoço antes de chegar na boca, agora, menos tensa, o beijo se tornou menos conforto e mais intensidade, quase nos esquecemos que estávamos parados no meio da rua. Quando finalmente nos afastamos, pouso minhas mãos em sua nuca e poderia ficar assim para sempre se não fosse o sentimento de algo metálico e frio em minhas costas.
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Então é Natal
RomanceO Natal é o feriado preferido de Juliana desde que se entende por gente, é completamente apaixonada pela decoração, músicas, a ideia de um velhinho bondoso que presenteia crianças, e, principalmente, rabanadas. Ju sempre sonhou em ser a anfitriã de...