dois

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Jake Lowell

   A floresta estava silenciosa, apesar do canto dos pássaros e o farfalhar das folhas quando uma rajada de vento as atravessava. O solo era familiar sob minhas botas, a terra úmida e pegajosa, a grama curta que estava crescendo depois das geadas e do clima congelante de Gracefall. O cheiro de pinhos esmagados e madeira ao meu redor impregnou-se em meu nariz. Era reconfortante. A caminhada de volta até minha casa durou alguns minutos a mais por conta do ritmo vagaroso das minhas passadas.

Um de meus irmãos, Adam, estava parado na soleira da porta, como se estivesse me esperando. Ou esperando para me dar um sermão — por sua expressão dura e indiferente. Quando me aproximei, ficando frente-a-frente com ele, suas íris azuis me perscrutaram. A desaprovação evidente em cada linha de seu rosto, desde o nariz reto e salpicado com uma constelações de sardas com as narinas um pouco dilatadas até o vinco profundo que se formava entre suas sobrancelhas cor de cobre.

— Que merda você foi fazer na casa dos novos vizinhos?

Ah. Era isso. Marjorie, a nova vizinha, não poderia descobrir que meus irmãos não haviam pedido para que eu me apresentasse e que eu não estava lá contra minha vontade, como demonstrei. Na verdade, fui movido puramente por uma parte curiosa e animalesca de mim. Foi impossível ficar longe. Quando percebi, já estava com o punho cerrado em frente sua porta, dando algumas batidas sobre a mesma. E logo que ela apareceu... Resolvi ser um babaca, para que mantivesse distância segura — já que eu não era capaz de estabelecer isso entre nós, aparentemente. Duvidava que ela fosse aparecer na festa, mais tarde.

— Fui me apresentar. — Dei de ombros.

Adam respirou profunda e intensamente, como se tivesse que conter um impulso dentro de si de apertar o meu pescoço. Ou decepar a minha cabeça. Nós sabíamos que o homem que morava a alguns metros de distância era um caçador. E nós nos mantinhamos longe deles. Pelo menos até agora. Antes de eu estragar tudo indo até a porta da casa de um deles e me apresentar para sua filha.

— Você é mesmo um idiota, Jake. — Ele balançou a cabeça negativamente, movendo o maxilar quadrado para frente e para trás. Ele se aproximou, enfiando o dedo indicador bem no meio do meu peito. Não me movi um centímetro. Só retribuí o olhar gélido. Ele rangeu entre os dentes, o som saindo parecido com um rosnado: — Mantenha-se longe. Sei que você consegue fazer isso. Não arrisque tudo por um rabo de saia.

Soltei uma risada de escárnio que pareceu deixá-lo ainda mais emputecido, se possível.

Antes que seu punho pudesse se conectar com o meu maxilar, ou que o meu pudesse acertar o seu nariz, nosso outro irmão, Keac, nos interrompeu:

— Ei, crianças, sem brigas!

Dei um passo para trás. Keac era o mais velho dentre nós três. Ele tinha vinte e dois anos, enquanto Adam tinha vinte e eu, dezenove. Meus dois irmãos compartilhavam os mesmos cabelos acobreados, a cor se assemelhava a uma chama alaranjada. Era muito diferente dos meus fios loiros que beiravam à translucidez. Entretanto, nossas íris eram inconfundíveis. Os Lowell's tinham olhos safiras, um azul gélido e pálido meio sem emoção.

— Você soube que o Jake está fazendo amizade com caçadores? — Adam cuspiu a última palavra como se fosse o pior xingamento do planeta.

Keac me lançou um olhar indecifrável. Não sabia se ele estava com raiva ou não. Suas íris passearam por meu rosto cautelosamente e vi quando algo se iluminou em sua expressão. E eu o odiei por ter percebido tão rápido e também me xinguei mentalmente por não ser tão bom em esconder as minhas emoções para ele.

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