Capítulo 13 - Irmãos & Aquela Coisa Dentro Do Armário - Part 1

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     Levanta-se da mesa. As sobrancelhas estão tensas, a boca pressionada e as narinas abertas mais do que o normal. A respiração de Marcela treme

Marcela ama a tia Bia e adora que ela esteja em sua casa junto com seu marido e filho, mas a presença de Carlos na mesa a enoja. É um sentimento crescendo da base do estômago e ficando preso na garganta.

Os pais a encaram com reprovação, Carlos pede com os olhos que Marcela se sente novamente à mesa de jantar posta e sua tia não poderia estar mais confusa. Matheus está pronto para opinar quando dá as costas a todos sai da casa, batendo a porta.

Dentro do elevador, conta ansiosa até os números zerarem e chegar no térreo. Está se tremendo de frio e raiva. Torce para que a garota loira que saiu de lá chorando há poucos minutos não tenha ido muito longe. Eu deveria ter saído antes, pensa. Quando passa pelo hall do prédio, grita pela garota de costas, pronta para deixar a propriedade.

— Espera — pede. Fumaça quente sai de sua boca e Marcela corre na neblina até a pessoa. — Thais, por favor, espera. — Segura as mãos da menina de olhos inchados e a convence a voltar até o hall, onde está menos frio.

Sentam-se em puffs coloridos e Marcela observa Thais chorar a ponto de soluçar, com as mãos na frente do rosto e os ombros subindo e descendo.

Menos de dez minutos antes, houve uma confusão na casa de Marcela. A tia Beatriz não vem mais que uma vez ao ano para São Paulo e, apesar de Carlos não ter convidado a namorada para o jantar, Marcela o fez. É verdade que Marcela jogou na cara da loira que seu namorado não a tinha chamado para irritá-la, mas já se arrepende disso. Existia um motivo muito ruim para seu irmão não ter convidado a namorada para o aniversário da mãe deles.

— Carlos foi horrível — sussurra Marcela. Essa mesma não sabe muito bem o que fazer. — Desculpa por ter provocado tudo isso. Eu não sabia que...

— Cala a boca — pede Thais, com mais doçura do que essa sequência de palavras têm. — Eu só quero ir pra casa. — Ergue a cabeça e Marcela sente seu coração angustiado ao pegar o celular do bolso.

— Pede um carro, pode deixar na minha conta. — Estende o aparelho e Thais o pega.

Existem várias formas de se terminar um relacionamento. Infinitas, Marcela acredita, mas poucas incluem ser grosseiro e egoísta como seu irmão mais velho foi. Thais aguentou a barra dentro do quarto deles enquanto Marcela brincava com o bebê da tia na sala e os adultos cozinhavam. Okay, ela chegou de surpresa sem ser convidada, mas não custava nada para Carlos resolver isso depois. Não humilhar alguém tão de graça na frente da família.

Marcela não sabe exatamente do que falaram no quarto, mas viu Thais sair chorando e aguentou sua curiosidade quando Carlos saiu também. Ela não gosta de Thais, nunca gostou e provavelmente nunca vai gostar, mas vê-la sair naquele estado enquanto seu irmão, com sua camisa social roxo-claro, não demonstrou nada foi assustador. Carlos parecia uma versão nova e intragável do seu irmão. Carlos se sentou à mesa, como os outros já tinham feito, e agiu como se a garota que ele deveria tratar bem não tivesse acabado de desabar em sua frente. Quando ela o encarou, em busca de respostas, ele só disse:

— Nós terminamos.

E seu pai riu. Esse foi momento que Marcela percebeu que estava tudo errado. Roberto levou todos da mesa a rirem com ele, exceto Marcela, como se Thais fosse uma pessoa indigna de empatia. Seu pai disse:

— Já era hora de terminar, ela é muito nova e imatura pra você. — Deu dois tapas nas costas de Carlos, em parabéns, e Marcela sentiu um arrepio e repulsa dos dois.

Então ela notou. Foi isso que Giulia sentiu quando Marcela contou sobre a aposta por Daiana. Esse nojo, essa falta de compaixão e empatia absurdas. Entendia perfeitamente o que tinha provocado em Daiana quando não foi contra a aposta de Sérgio e Lucas. Quando brincou sobre isso como se Daiana fosse um brinquedo novo.

— Vocês não têm vergonha de serem assim? — Marcela perguntou quando recebeu toda aquela informação. Só então se levantou e, agora, lembrando de tudo isso enquanto observa Thais entrando no carro, sabe que está ferrada quando subir para casa.

Marcela, no entanto, não consegue se arrepender. Não sai da sua cabeça que foi o certo. O coração deveria estar acelerado e ela deveria ter medo de subir, mas não tem. Entra no elevador e limpa as lágrimas que caíram pela compaixão sentida para com Thais. Aperta o número 7 do prédio luxuoso na cidade de São Paulo.

Apesar de todos os olhares pousarem nela quando a Marcela ultrapassa a porta, ela não os encara. Pega seu prato de comida e vai para o quarto. Pragueja por saber que terá que dividir o espaço com seu irmão mais velho. Pensa em ir dormir no quarto abandonado de Eduarda, mas isso só a deixaria pior emocionalmente. Aquele quarto é uma zona morta dentro da casa.

Enquanto come, pergunta-se quando o seu irmão se tornou aquela pessoa e como ela não notou mesmo falando com ele por vídeo chamada quase todos os dias. O Carlos que saiu do Brasil, seis meses atrás, nunca deixaria Thais sair da casa daquela forma. Mais: ele nunca daria motivos para aquilo. O seu irmão mais velho, o garoto que ela chorou de saudade e que segurou a mão dela no dia que Eduarda morreu, nunca faria o que fez hoje. É um estranho que hoje divide o quarto com ela.

— São só umas semanas — sussurra para si mesma, porque Carlos irá embora de novo. Esse irmão que ela não conhece e não sente vontade alguma de conhecer. Encara o desenho feito por Daiana, pregado em sua parede e a culpa arrebate Marcela mais uma vez.

Encara o celular ao seu lado. Não tem mais nada pra perder, tem? pergunta-se. Deixa o prato vazio de lado, desbloqueia o aparelho com senha numérica e abre o aplicativo de mensagens. Quando vê o contato de Daiana, percebe que sua foto desapareceu. Ela me bloqueou? Claro que bloqueou. Fecha os olhos e solta a respiração pelo nariz. Que droga. Deita-se e encara o teto por alguns segundos. Toda a raiva se dilui em remorso e a angústia se multiplica em segundos, como uma bactéria infecciosa. Você estragou tudo, Marcela.

A vontade de chorar não é aquela comum por Lucas não falar mais com ela ou por seu irmão a decepcionar de forma tão bruta. Esse é um desconforto específico, em uma parte do coração que não costumava ser tocada. É como se Daiana tivesse desbloqueado um novo compartimento dentro do peito de Marcela e a garota não sabe lidar com essa área contaminada. Mesmo que seus olhos quisessem lagrimejar, isso não acontece antes de Marcela se levantar rápido e começar a gravar um áudio para Daiana.

— Eu sei que você me bloqueou. Sei que está chateada e que fomos horríveis. Você está certa, eu estou errada. Daiana, eu sabia da aposta. Deveria ter impedido, mas não impedi. Eu errei. Foi... — Suspira. — Caramba, foi um erro muito escroto. Desculpa, tá bom? Desculpa mesmo. Eu não queria que você se afastasse da gente. Escuta, eu não queria que você se afastasse de mim. E... — Fecha os olhos. — Desculpa. Se serve de alguma coisa, a aposta não foi comigo. Eu nunca apostaria beijar uma garota, eu nem... — Respira fundo e abre os olhos. — Desculpa. De verdade. Foi tudo culpa minha.

Libera o áudio, que é enviado, mas não recebido. As duas lágrimas pingam de apenas um olho. Então começar a gravar outro. Precisa colocar essa aflição em algum lugar.

— Daiana... Caramba! Eu quero muito falar com você. Nosso beijo foi. — Suspira, a voz está entalada. — Te beijar foi a coisa mais incrível que eu senti na vida. Eu penso em você todos os dias, parece que tô ficando louca. — Senta-se da cama. — Daiana, eu sou apaixonada por você. — Ela quase remove o dedo do gravador de áudio, mas o outro áudio enviado ganha duas setas que logo ficam azuis e Marcela se assusta. Puta que pariu.

⚢ Não Se Apaixone Por Ela ⚢ [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora