Volta

45 12 2
                                    

Seus passos foram lentos para dentro do escritório e Ryuken foi para trás da mesa.

- Finalmente em casa, não sentiu falta? – Ele perguntou irônico olhando o garoto que ainda tremia.

- Eu não sei se consigo mais ficar aqui... – Disse devagar.

Sim, aceitou ir com o pai, mas foi porque ele estava ameaçando a família Kurosaki. Mas se Uryuu realmente desistisse de tudo e voltasse para aquela casa, para tudo que tinha que passar. Não aguentaria viver assim. Não mais. E prometeu para Ichigo que se cuidaria.

Ryuken riu curto buscando um envelope grande da mesa.

- É? Não que eu me importe, mas como acha que iria viver sem meu dinheiro Uryuu?

- Eu dou um jeito. Ryuken, o senhor me odeia, não me suporta. Para que fazer tudo isso? Só me deixa ir embora, esquece esse filho que você nunca quis nem amou! – Seus lábios estavam trêmulos, olhos raivosos.

Ryuken o encarou por pouco tempo antes de voltar ao envelope e puxar o que inicialmente pareceram papéis, mas que se mostrou serem fotos reveladas. Foram jogadas sobre a mesa de forma que Uryuu podia vê-las cada uma muito bem.

Surpreso arregalou os olhos.

- Tentador, mas você não vai a lugar algum porque você ainda é um Ishida. – Deu ênfase em cada palavra.

Foi naquele dia. Uryuu pensou. Foi no dia que ele e Ichigo saíram a noite para poderem distrair a cabeça... As fotos comprovavam isso. Comprovavam os abraços, os olhares carinhosos, o beijo, comprovavam o amor que sentiam. Mas com certeza não era isso que seu pai via.

- Q-Quem tirou... – Não conseguiu terminar. As pernas fracas sob o olhar pesado do homem que o deu tanto medo na infância, tanta raiva e revolta na adolescência, tanto ódio. Não entendia aquele homem com o qual conviveu a vida toda.

- Não interessa. – Puxou uma garrafa de Whisky na mesa e derramou no copo até a metade, havia um balde de gelo recém colocado ao lado, colocou dois cubos. Calmo demais. – Sabe... – Ele bebeu um gole e suspirou. – Eu custei um pouco a acreditar nessas fotos. Não achei que você fosse tão idiota a esse ponto, mas depois... Eu lembrei da sua inclinação a me decepcionar e também dos seus desenhos patéticos. Conseguiu me enojar mais ainda, quer parabéns?

Uryuu se encolheu mesmo que involuntariamente, os olhos embaçando. Ryuken logo voltou a falar depois de alguns goles e o fim do primeiro copo.

- Eu realmente não sabia o que fazer para concertar tudo que você fez. Confesso que ameaçar matar aquela família foi um exagero. Não quero que esse seu segredinho sujo seja enterrado e esquecido, não, não, não. – Ele deu a volta na mesa, o copo novamente cheio.

Ichigo... Eu sinto muito. Uryuu pensou, se segurando para não voltar a cair no chão. Porque sabia que era o fim. Ryuken tremia de raiva, ele não permitiria que o filho saísse, não permitiria nada.

- Eu prefiro destruir cada um deles, de todas as formas possíveis só p’ra te ensinar essa valiosa lição. Quantas vezes eu já disse para não me desafiar Uryuu? Responde!

- M-muitas.

- Exato. Foram anos e anos de ensinamentos, tudo por que eu queria meu filho, um Ishida, liderando a empresa junto comigo. Levando adiante tudo pelo o qual eu trabalhei minha vida inteira! Em vez disso você foge de casa para dar a bunda envergonhando nosso nome e pisando em tudo que eu já te dei! – A voz alta enaltecia muito bem que aquilo não seria perdoado facilmente, não seria esquecido.

- O q-que?... – Começou trêmulo, as lagrimas deslizando sem controle. – O que você me deu? – O encarou magoado limpando o rosto. – Você me espancou várias vezes, me humilhou, me torturou ao ponto de eu preferir morrer! Eu não consigo nem dormir pelos pesadelos a noite. Eu tenho que usar roupas longas o tempo todo porque suas marcas estão aqui! – Mostrou os braços. – Esse sobrenome não me trouxe nada além de uma vida horrível! Eu nem sequer consigo te chamar de pai! Você nunca foi um para mim! Nunca me amou ou cuidou de mim, nunca me reconheceu e por mais que eu tentasse te orgulhar, você continuou e sempre vai continuar me olhando com nojo! E mesmo se eu me casar com uma mulher ou trabalhar nessa empresa nada irá mudar e isso não é o que eu quero para mim!

Engasgou em um choro e Ryuken levou o copo aos lábios depois de todo o discurso do filho. Sorveu um pouco do líquido quieto, a expressão impassível.

- Você tem razão, você nunca será bom o suficiente. Eu nunca irei te reconhecer realmente ou te amar. Sugiro que supere isso e priorize outras coisas. Como a fidelidade. Eu só preciso disso de você.

Caminhou pelo escritório, ignorante ao choro compulsivo do filho.

- Vamos fazer assim. Eu não vou mexer em um só fio de cabelo daquela família e você nunca mais vai ver nenhum deles ou me desobedecer... Você irá para minha nova filial em Xangai e ficará por lá. Em dois meses mais ou menos eu vou ir ver como as coisas estão e espero que estejam ótimas. Você terá um bom tempinho para colocar a cabeça no lugar e dar valor ao que eu dou a você.

Uryuu chocado desviou o olhar, os punhos tremendo.

Nunca mais ver Ichigo?

- Caso queira voltar a discutir ou reclamar que papai não te mimou o suficiente eu resolvo logo com meus contatos, vamos ver quanto tempo aquela família consegue lidar com a marfia. Eles adoram cobrar dinheiro até não sobrar mais nada além do corpo para dá. Seu namoradinho punk pode entender assim o erro que fez.

Nunca mais falar com Ichigo? Senti-lo? Ouvir suas palavras de carinho, acompanhar ele mexer no cabelo ruivo e sorrir?  

Era isso, o fim para eles?

Nunca arriscaria destruir a vida dele ou de sua família, se próprio destruiria várias vezes para isso não acontecer.

- V-ou... – Sua voz falhou, mas respirou fundo. – Eu vou tentar fazer um bom trabalho. Por favor, esqueça esses erros.

Sentia dor, mas implorou.

Você nunca foi um erro Ichigo, você foi um sonho. Me desculpe por desistir, por quebrar promessas e voltar a te magoar. Você nunca foi nem seria um segredo sujo para mim. Você é e sempre foi bom demais para mim e eu nunca te mereci. Não me esqueça, por favor, mas seja feliz mesmo assim, com alguém que cuide de você sem ter tantos problemas em si mesmo.

Eu tenho que te deixar ir apenas porque te amo demais.

Ponta Solta [Concluída]Onde histórias criam vida. Descubra agora