A tortura é uma invenção maravilhosa e absolutamente segura para causar a perda de um inocênte.
Jean de La Bruyere
////////////////////////////////////
Uryuu não entendia direito, mas se sentia mal naquele carro, as mãos sempre tremendo, a vontade de vomitar. Tentava respirar fundo, dar energia ao seu corpo ansioso, e nada resolvendo o desanimada. Era assim toda vez que entrava naquele carro para voltar para a mansão.
Pensava que sua vida e emoções pareciam uma montanha russa. Um momento estava lá em cima, bem, calmo e podia sim dizer feliz, isso quando estava com Ichigo ou no clube pintando; porém quando em casa ou na empresa, ou quando pensava nesses lugares parecia uma descida bruta dessa montanha, e o precipício mais fundo sendo seu pai.
Aquela montanha russa não decidida entre subidas e decidas estava o deteriorando pouco a pouco. Tudo bem que eram as subidas que faziam do moreno mais confiante, mas só ele sabia o quanto a descida doia.
Já confuso com aqueles pensamentos resolveu mandar uma mensagem para Ichigo que logo o respondeu, pois estava o esperando chegar na mansão para conversarem. Guardou o celular quando depois de pouco tempo chegou.
Desceu do carro nervoso novamente, parecia já prever que todo o resto do dia seria uma merda total porque seu pai estava de volta de viagem. Entrou na mansão indo em direção as escadas por onde subiu para seu quarto, mas parou arregalando os olhos perto da porta quando a notou toda aberta.
Mais lento entrou no lugar sentindo o coração acelerando cada vez mais. Os quadros de todos os tamanhos que antes estavam encostados nas paredes não estavam mais, nenhum dos vários que Uryuu tinha trazido da escola, os que tinha guardado atrás do guarda roupa ou em baixo da cama. Nenhum portfólio ou folha de desenho em cima da escrivaninha ou dentro das comodas.
Nada
Não tinha sobrado nada.
Sentiu as pernas fraquejarem próximo ao guarda roupa no meio do quarto e foi ao chão. A vista embasada, mas sabia que eram as lágrimas, o peito doendo tanto que agarrou a camisa com força.
Grunhiu rouco, o que pareceu rasgar seu peito, seus óculos indo ao chão.
Um som de estalo chamou sua atenção para a janela aberta, tremendo conseguiu se levantar se aproximando e vendo o que acontecia no jardim em frente. Enxergou fogo antes de suas pernas se moverem para correr daquele quarto desejando parar aquilo e salvar algo.
Parou somente no jardim vendo a fogueira queimar tudo, cada imagem que desenhou, cada rabisco ou tinta no papel. Queimava tudo. Enchergou a moldura que havia colocado em um dos quadros - comprou e colocou nesse único porque fez pensando tão intensamente em Ichigo, tinha tanto laranja nele – mas agora ela se perdia.
Voltou a correr para buscá-la, tentar a salvar nem que se queimasse junto, porém sentiu seu corpo sendo agarrado de repente o parando.
- Já era garoto! – Roberto alertou o segurando com força. Uryuu se debateu.
- N-não! Por favor não! – Gritou e abaixou a cabeça chocado com a visão do fogo cobrindo a moldura e ouviu a risada do pai próxima.
- Vamos, me dê isso logo! – O patrão mandou e Uryuu olhou um dos guardas que trazia sua bolsa escolar a abrindo e mexendo dentro.
- Não! – Tentou correr, mas Roberto o agarrou mais forte.
O guarda tirou o caderno de dentro da bolsa o olhando rapidamente confirmando ter vários desenhos e entregou ao patrão que parecia mais estar em um jogo. Ryuken negou um pouco com a boca folheando tudo rapidamente, porém se deteve espantado em uma página, no desenho de um homem seminu deitado, lhe parecia familiar. Viu que tinha vários desenhos do mesmo homem.
- Ryuken, por favor, me devolve, pai, não faz isso! Por favor! Por favor! – O mais jovem falava desesperado. Aquilo não podia estar acontecendo!
Ryuken o mostrou o desenho de Ichigo que fizera aquele dia.
- O que é isso Uryuu? Está virando uma dessas bixas artísticas? Que coisa nojenta ronda por sua mente seu perturbado? – Ele riu enojado. – Isso já foi longe demais garoto, chega de brincar de Monet. Você está se distraindo demais... Hora de voltar para a realidade.
Ele se aproximou da fogueira que mandou as empregadas prepararem a pouco tempo e Uryuu se remexeu em pânico mas foi segurado mais forte. Gritou pedindo que ele não fizesse aquilo, que iria realizar todos os trabalhos. Que faria tudo!
– Claro que vai Uryuu, você está aqui para isso. É sua obrigação como Ishida... – Sorriu torto. - O curioso foi que recebi outra ligação do seu diretor hoje, isso está acontecendo demais. – Ele voltou a abrir o caderno, a puxar algumas folhas e joga-las para o fogo enquanto falava. Uryuu mal o escutava. – Ele falou e falou do seu talento incrível, do curso que o indicou já mandando até carta de recomendação. Engraçado que eu não me lembro de ter permitido nada disso, na verdade nada dessa palhaçada toda!
Arrancou mais folha as descartando.
- Eu não vou! Por favor para, eu não vou!
Mas ele não careceu de mais palavras antes de continuar arrancando páginas as atirando ao fogo logo jogando o que restou do caderno também. Uryuu caiu no chão chocado, o homem maior ainda o segurando. As lágrimas não foram controladas, nem existia meios para tal. Cobriram seu rosto, a cada folha, a cada desenho sentia partes de si arrancadas brutalmente.
Preferia mil vezes que ele o espancasse, que o jogasse no porão mais escuro, que o queimasse, seja o que for, mas que não o marcasse daquele jeito, não destruísse o que ele era.
Uryuu escondeu o rosto no chão quando o fogo cobriu a capa do que foi seu caderno, não mais o fazendo capaz de encarar as chamas. Seu peito mexia freneticamente, seus punhos fechados.
- Você deveria me agradecer, limpei aquele quarto imundo e encerrei essa besteira chata sua. Se concentre no seu trabalho, em um curso de verdade, isso que vai te dá dinheiro, afinal! – terminou irônico e se afastou.
-... Parecia importante, mas esquece Uryuu, depois você desenha mais.
Ouviu alguém falando, mas não conseguia controlar aquela dor no peito. Aquele sentimento horrível.
Não soube quanto tempo ficou encolhido naquele chão, o fogo já tinha parado e estava escuro e frio quando sentiu seu braço sendo agarrado. Gritou rouco para o soltarem, mas Roberto só o largou em seu quarto.
Preferia ficar perto das cinzas dos seus quadros no escuro do que estar naquele quarto vazio. Mas não demorou tanto Ryuken estar de volta.
- Vá se preparar garoto, temos uma reunião agora. – Avisou sério. Uryuu levantou-se do chão. Não pensava, apenas se aproximou do homem de terno o empurrando.
-Saí daqui! – Gritou magoado.
Ryuken incrédulo demais só acordou da surpresa quando o filho tentou empurrá-lo novamente, dessa vez agarrou seus braços o afastando, mas Uryuu se soltou e o empurrou outra vez.
- Eu disse para sair daqui porra! – Gritou mais auto e mais facilmente empurrou o peito do pai para fora do quarto o jogando no chão, bateu a porta e trancou.
Encostado contra a porta voltou a chorar escorregando até o chão e tampou a cabeça deixando todas as lágrimas saírem, a mente em desespero.
O que tinha feito para merecer aquela vida, o ódio daquele homem?
Por que ele fez aquilo? Por que o destruía todos os dias, o matava pouco a pouco durante 18 anos?!
Não entendia, não podia mais entender, se entender do por que aguentava aquilo! Ouviu o barulho na trinca da porta, ela sendo aberta e tampou os ouvidos.
Foi ali que desejou desaparecer, mas no segundo seguinte lembrou-se de Ichigo e chorando mais se encolheu contra uma parede recebendo as cintadas de Ryuken. Escondeu a cabeça sentindo-se distante daquilo tudo, da agressão, das palavras do pai, daquela casa... Sentia-se morto. Preferia estar.
![](https://img.wattpad.com/cover/170657403-288-k254803.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
Ponta Solta [Concluída]
Fanfiction[Finalizada] ❤ Um era totalmente na dele, o nerd conhecido por todo o colégio. Com o abismo de problemas que escondia em baixo de suas roupas largas o ameaçando a todo instante do isolamento. Enquanto o outro era o excluído do colégio por seu perf...