Luísa

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Uryuu tomava seu café da manhã. Seu pai estava fora do estado aquela última semana e o adolescente podia agir mais normalmente podendo comer na cozinha, as vezes com Luísa, o que achava ótimo.

Luísa voltou e o estudante a observava enquanto ela explicava algo para a cozinheira. Ela estava estranha hoje, na opinião dele, parecia nervosa e inquieta, também até um pouco emotiva.

Ela liberou a cozinheira e se aproximou sorrindo minimamente sentando-se em sua frente. Era uma mulher já de idade, gostava muito de flores e suas roupas claras sempre continha elas desenhadas, os cabelos loiros estavam quase sempre amarrados em um coque para trás e sempre tinha aquela expressão gentil no rosto, mesmo que para repreender.

Para Uryuu não existia pessoa mais querida, não entendia o que ela ainda fazia naquela casa, por mais que ela sempre ressaltava que cuidaria até dos netos de ‘’seu menino’’. Mas para Uryuu uma pessoa tão gentil e de sorriso tão sincero não deveria estar naquele ambiente, não com aquele tipo de pessoa, não por uma pessoa como ele.

- Está me observando muito Uryuu, irá me desenhar novamente? – Ela perguntou já com os olhos brilhando. O conhecia bem, isso ele tinha que reconhecer.

- Quem sabe... Luísa – A chamou percebendo que a mesma estava meio perdida nos próprios pensamentos. – Algum problema? Você está esquisita.

Ela afastou um pouco o corpo para trás e sorriu triste.

- Estou ótima... Ora, o que há? Não me olhe assim eu estou bem – Ela estava realmente mais distante essa manhã, Uryuu tentou pensar em algo, mas nada veio a sua mente que pudesse explicar aquele comportamento.

- Vai para a pousada da praia hoje?

Era sexta e em alguns finais de semana ela tinha folga, como ela residia na mansão ele convenceu seu pai a anos atrás a deixar ela ir descansar na casa de praia da família Ishida para ter seu tempo só para ela mesma. Foi difícil até convece-la no tempo, mas era necessário insistir, odiava a ideia de sobrecarrega-la com trabalho.

- Talvez sim.

Ela mordeu novamente os lábios, inquieta e Uryuu suspirou apenas aguardando. Olhou em seus olhos azuis claros quando ela voltou a falar.

– Na verdade estou preocupada com você.

Ele não entendeu e Luísa se levantou dando a volta na mesinha. O olhar nervoso e as mãos tremendo.

- Com o que exatamente? - Surpreendeu-se quando ela abaixou na sua frente sentando nas próprias pernas. – Luísa?

- Uryuu... – O mesmo arregalou os olhos, ela quase nunca o chamava assim. – Eu queria te pedir para aceitar minhas desculpas, também por eu estar fazendo isso somente agora. – Sua voz saiu mais baixa.

Ele não gostou de ouvir aquilo e por algum motivo a cozinheira não estava mais na cozinha.

- O que está havendo? Pelo que está pedindo desculpas? – Sua expressão estava fechada, não que não estivesse preocupado, mas, era como se descobrisse de repente que não poderia confiar nela, em ninguém. Não gostava do sentimento.

Ela pegou suas mãos, em nenhum momento o encarou então as beijou cada uma com gentileza.

- Realmente... Eu nunca me perdoarei, mas preciso fazer isso. – As lagrimas foram para suas mãos então levantou o rosto da mulher.

- Luísa! Por favor...

- Me desculpe meu menino, me desculpe. – Ela deixou a cabeça ir para o colo de Uryuu que passou a alisar seus cabelos para acalma-la. Depois de um tempo ele voltou a falar.

- Luísa, por favor, me explique o que está havendo!

Ela pareceu ponderar, não chorando mais. Levantou a cabeça voltando a segurar as mãos de Uryuu.

- Um menino tão bom... – Disse calmamente o observando. – Quando te vi pela primeira vez, com fome e sujo em um berço fiquei muito chocada. Lembro de ter começado a dar vários gritinhos histéricos pelo quarto não sabendo por onde começar. – Acabou rindo e Uryuu apertou sua mão.

- Tá, você já me contou isso. Não me envergonhe...

- Mas eu preciso, me deixa falar. Eu não te contei que naquele dia sua mãe tinha me encontrado na porta e somente me indicou o quarto e falou que o dinheiro eu resolvia com seu pai. Fiquei, então, muito chocada quando te vi. Tão pequeno e inocente no meio daquilo tudo e sabe o que conseguiu me acalmar naquele momento?

Uryuu negou deixando a mulher continuar.

- Seus olhos Uryuu. Bastei olhar para eles me fitando com curiosidade que puf! Fiquei lá parada. Você não chorava, não reclamava, somente me olhava. Pensei naquele momento no que seria daquela criança crescendo em um ambiente daqueles e... fiquei para ver – Uryuu sorriu para ela, mas ela apertou suas mãos e foi o seu sorriso que sumiu. – Você não mudou muito... E por todos esses anos eu ignorei o fato de que mesmo que você não chorasse ou demostrasse não significava que não estivesse passando pelo pior. Eu fui dura com você por que pensei erradamente que você estava bem e acostumado... Olha isso! M-me desculpe. – Uryuu desviou o olhar, não estava gostando do rumo que a conversa tomava.

- Eu estou bem...

- Não, não está e eu te conheço muito bem para dizer que nunca esteve e que enquanto permanecer nesta casa você nunca vai conseguir estar bem...

- Luísa, por favor. – Uryuu pediu a interrompendo e puxando suas mãos querendo se levantar, mas a mulher voltou a segurá-las insistente fazendo o moreno permanecer na cadeira.

- Espere, me ouça. Eu preciso falar! – Disse nervosa.

- Por quê? Para que isso agora? - Perguntou da mesma forma. Só queria a Luísa de sempre, sorridente ou somente preocupada com sua alimentação.

- Eu só... Não aguento mais vê-lo assim... Todos esses anos você sofreu e esteve em perigo com o senhor Ishida. E eu tinha medo! – Uryuu levantou-se apenas impedindo que ela fosse ao chão, mas depois se afastou. Luísa o parou.

- Para. Já chega... Você estava certa em sentir medo. Ok? Chega, não vamos mais falar disso, por favor. – Pediu a encarando sério, mas da mesma forma ela o olhava agora.

- Não posso mais fugir, você não entende? Ouça! Uryuu, você sabe que precisa me ouvir! – Ele não falou nada não entendendo para quê aquela conversa. – Eu percebi! Eu sabia, é claro que sabia de onde suas marcas vinham, sempre soube. Eu tinha medo então não falava nada, você também nunca falou. Sempre em silêncio, e por mais quanto tempo? Mas eu sabia então entendo se me odiar. – Já estava desesperada.

- Eu não te odeio. Não adiantaria nada então eu não tinha por que falar. – Disse tentando controlar seu corpo que tremia, serrou os punhos. – Você é uma pessoa especial para mim, uma mãe que eu nunca tive... Eu não sou mais uma criança Luísa. Posso lidar com isso.

- O que eu faço com você? – Disse ainda aflita. – Me prometa então que vai procurar ser feliz, que vai se permitir ter sonhos e ir atrás deles, não mais algo que seu pai manda. Por favor! Prometa de verdade!

Uryuu ficou somente parado a observando, ela ficava cada vez mais aflita, ele sorriu um pouco e balançou a cabeça concordando. Luísa se aproximou sorrindo e puxou sua cabeça o beijando a testa.

- Obrigado e realmente algum dia me perdoe. – Ela disse. Ele murmurou um tudo bem e trocou agora depositando um beijo na testa da mulher. – Consolando uma velha, você é gentil demais, quem ganhar seu coração vai ser a pessoa mais sortuda desse mundo. Só quero poder conhecê-la.

Afastaram-se e Uryuu sorriu tímido. No mesmo momento o motorista entrou na cozinha perguntando se ele ainda iria para o colégio. Uryuu rapidamente olhou o relógio da cozinha. Muito mais que atrasado! Correu até seu quarto buscando a mochila e o celular depois voltou indo logo para o carro ouvindo Luísa o desejando boa aula.

Só se fosse metade dela agora!

Ponta Solta [Concluída]Onde histórias criam vida. Descubra agora