Eu minto muito mal. Um detector de mentiras me entregaria facilmente. Mas talvez seja a ingenuidade de Nora Summer que não me entregou. Ela caiu como um patinho na minha mentira descarada e estou me sentindo mal por isso.
A verdade é que não vou me mudar. Eu moro na mesma rua, mesmo bairro, cidade, estado, país… desde que me entendo por gente. Ou seja, na casa dos meus pais. E eu não sou tão velho assim. Acabei de pular fora do ensino médio, então, com 19 anos, é óbivio que ainda devo estar morando com meus progenitores.
Essa desculpa furada em que Nora se meteu é só um pretexto. Eu quero me aproximar dela de novo. Sinto falta do que tínhamos. Aquela coisa de adolescentes bobos e caretas do colegial. Então, a melhor maneira de reatar um relacionamento com alguém é mentindo para ela. Ou quase isso. Pelo menos, era o que dizia o biscoitinho da sorte que comi no jantar de domingo.
Eu não vou me mudar. Não vou me mudar para um apê com amigos. Nem tenho amigos suficientes para isso. Eu tinha. Verbo conjugado no passado. Uns carinhas de jaqueta preta que tinham até barba, enquanto eu esperava nascer um mísero pelo no peito. Durante a formatura, eu percebi que eles eram barra pesada. Levaram drogas para o nosso ginásio. Então, eu em plena consciência, achei melhor manter distância. Por segurança. Obiviamente, não estava afim de ir em cana.
Depois da formatura, perdi o contato com a Nora. Então, já era a hora de arrumar novos amigos. Ser anti social era um problema, por isso não apareceram muitos. Tem o Jimmy, o ajudante do supermercado. E o Todd, quem está realmente se mudando para um apê, que vou roubar a chave e fingir que sou eu.
O Todd trabalha hora integral num restaurante chinês como garçon. Ele tem 17 anos e uma namorada super legal. O Todd só costuma chegar em casa tarde da noite, então até lá, o apartamento é temporariamente meu.
Enquanto subimos a rua, estou encarando Nora Summer. Seus cabelos são na altura da cintura e castanhos. Eu sempre gostei deles. Na forma como ela prendia nas aulas de educação física, como diminuíam de tamanho quando estavam molhados, como ficavam espichados depois que secavam e tal. E eles tem cheiro de canela.
Avisto a fachada tijolada dos alojamentos casa da vovó. Eu conheci o Todd numa festa. Eu e Jimmy fomos juntos e encontramos o pobre e ruivo Todd desolado em dos banquinhos do bar. Daí começamos a conversar. Papo vai, papo vem. Descobri que ele mora num apartamento alugado, onde o estabelecimento é da avó dele. Por isso o nome. Depois disso, começamos a sair os três juntos.
— Chegamos! — Anuncio ao estacarmos na calçada. — É aqui.
— Parece… legal. — Seus olhos estão divididos entre ser grata por ter um lugar para secar a roupa e não morrer por causa do frio gigantesco de St. John's, e achando a estrutura da casa horrenda.
Sinceramente, eu no seu lugar, pensaria o mesmo.
— Vamos entrar? — Sugiro, já abrindo a porta meio enferrujada.
De todas as coisas que poderiam acontecer até que a gente subisse ao apartamento de Todd, o que eu menos queria que acontecesse, aconteceu. Empurro a porta da frente e dou de cara com a própria cabeleira ruiva em pessoa.
— Hey, Josh! — Eu engulo em seco quando ele dá uns tapinhas no meu ombro. — Eu já estou de saída, veio fazer uma visita?
— Você passou lá em casa? Eu fui na biblioteca. — Minto, apontando escada acima. As sobrancelhas de Todd se franzem e ele finalmente repara Nora atrás de mim.
— Hum… quem é a garota? Sua nova namorada?— Ele sussurra, apesar de sair bastante audível. Suficiente, para a própria Nora ouvir.
— Uma amiga. — Respondo depressa.
— Hum, sei. — Ele sorri, malicioso, dando uma bela olhada de cima abaixo em Nora. — Olha, enfim. Eu realmente tenho que ir agora, passa aqui amanhã, a gente toma alguma coisa.
— Passa você amanhã. Cadê a chave do meu apartamento? — Sorrio, nervoso. Ele dá um passo para trás, arregalando tanto os olhos castanhos que, por um segundo, chego a duvidar que eles vão pular para fora.
— Do que você está falando?
— Fala sério, Todd! — Dou um tapinha sugestivo no ombro dele. — Você dormiu aí noite passada, sabe que tenho que me mudar.
— Está tudo…
— A chave, Todd! — Reforço, erguendo a mão na frente do peito dele e usando a outra para pressionar a carne da curva do seu pescoço. — A minha amiga vai me ajudar na mudança.
Sem reação, Todd desliza a chave para dentro da minha mão e com um braço, eu conduzo Nora até a escada.
— Eu te ligo mais tarde. — Murmuro, acompanhando o olhar dele confuso enquanto subimos os degraus.
Essa foi por pouco.
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O Josh é péssimo mentiroso. Assim como eu. Vocês também são assim, que mentem já se entregando? Hahaha
