Capítulo 4- Any

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Vou bater! Eu vou bater!

Desculpe. Me desculpe!

Saia da frente por favor, eu vou bater!

Saia, preciso que pare agora!

O freio não funciona, não está funcionando!

Me desculpa!

Eu vou bater!

Bati, voei, ofeguei, me afoguei. Preto, tudo escuro.

Dói, meu pescoço arde. Quero vomitar, quero me mover.

Estou presa, preciso de ar.

Barulhos e mais barulhos.

- Eu vou bater.- sussurrei.- Saia, por favor

Apaguei e acordei. Uma, duas, três vezes.

Dói, dói demais.

Ele morreu, Any!

Não, não, não. Eu pedi, mandei sair, mandei parar. Falei que ia bater.

Você matou ele.

O que? Não, eu não queria, meu freio... não queria funcionar.

O sinal estava verde, estava verde! Ele não parou, o homem não me viu.

- Eu não queria!- gritei.

Olhos surpresos, dor, desespero. Afogar, debater. Eu não queria, não conseguia.

Eu avisei!

Eu gritei.

Eu gritei alto.

- Eu vou...

- Bater.- sussurro, abrindo os olhos.

Pesadelo mais uma vez, mesmo horário, a hora do acidente.

Esfreguei os olhos sentando na cama. Meu corpo treme, minha respiração está ofegante, minha pele suada pelo desespero.

Abracei meu joelhos os trazendo até meu peito. Meu celular clareou mostrando as horas, cinco e meia da manhã. Uma noite de sono completo é tudo que eu preciso, e tudo que eu não consigo ter.

Me levantei, cambaleando pelo quarto até chegar no banheiro. Saí rápido do chuveiro, a água forte caindo me lembra a chuva aterrorizante daquela madrugada.

Talvez hoje de certo, talvez algum lugar me aceite para trabalhar. Uma senhora foi com a minha cara na lanchonete, ela pode ter perda de memória e não se lembrar de mim.

- Já acordada, Any?- meu pai perguntou quando cheguei na cozinha.

Ele não é tão diferente da minha mãe, me julgou e me culpou da mesma maneira que ela. Até anunciarem que o freio do carro estava danificado.

Em sua testa parecia ter um "Eu avisei" escrito. Ele sempre tentou alertar sobre o homem com quem eu estava. Mas suas palavras nunca foram suficientes para meu coração entender.

- Perdi o sono novamente.- sussurrei, abrindo a geladeira.

- Tem torradas no microondas.

Realmente tem, um prato lotado delas. Ele não tentaria me envenenar também, tentaria?

- Não tem veneno, acabei de comer várias.- ele murmurou, mostrando a camisa do trabalho lotada de farelos, provavelmente notando minha dúvida sobre comer.

De repente... Você!Onde histórias criam vida. Descubra agora