8. Contratempo

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Por mais perto que a China fosse da Coreia, ainda era preciso gastar dinheiro, algo que eu não tinha.
Durante dez longos dias, planejei como poderia economizar para viajar com Choi, sem que minha avó soubesse.
Contei com a ajuda de Ayla, dizendo que passaria três dias na casa dela, colocando a matéria da universidade em dia, conversando, fazendo biscoitos e guerra de travesseiro a noite.
Eu não era do tipo de pessoa que mentia, na verdade, essa seria a primeira vez que mentiria para sair de casa.
Mas no fundo era por um bom motivo.
Ou eu achava que fosse.
-

Você está louca? -Ayla faz uma expressão exagerada
-É só por três dias. -Explico
-E porque você iria para a China com um garoto que acabou de conhecer?
-Tem alguém lá. Preciso encontrar essa pessoa.
-Realmente precisa ou você que quer? -Ela indaga
Odiava o fato de saber que eu estava errada e que tinha que convencer as pessoas do contrário.
-Ayla, juro que não vou fazer nada de errado. Eu só preciso que me ajude dessa vez.
Ela revira os olhos e consente.

Os dias se passam e agora falta menos de 12 horas para a tão esperada viajem. Quando o meu celular vibra.
"Tudo certo para amanhã?"
Esboço um sorriso. Ainda não tinha o dinheiro, mas Choi garantiu que poderia me ajudar com isso. Embora não seja do meu feitio aceitar dinheiro de alguém, eu o pagaria depois. Mesmo que ele não quisesse.
Em poucas horas poderia descobrir tudo sobre o desaparecimento da minha mãe que ainda não conheço e sobre a morte do meu pai. Havia dito a mim mesma para não procura-lá, mas essa oferta de viagem acendeu uma profunda curiosidade.
Meus dedos digitaram sutilmente as palavras "Está sim!", quando ouço o forte som de algo caindo, vindo da cozinha. Ao caminhar até a porta, meu coração acelera de uma forma que nunca havia sentido. Uma única palavra fui capaz de pronunciar.
- Vó! - Grito

*

Não fazia ideia de quanto tempo estava sentada na mesma cadeira de plástico frio e desconfortável do hospital. Meus pés batiam fortemente no chão, denunciando a minha inquietação. Médicos andavam de um lado para o outro, entrando e saindo de salas de cirurgias, porém ninguém falava comigo.
Não me atreveria a incomodar a recepcionista pela quinta vez, que já estava aos nervos pelas minhas diversas perguntas sobre como minha avó estava.
Durante horas e horas estive sozinha no enorme saguão do hospital, até que enfim, uma enfermeira se aproxima de mim.
- Stephanie Lee?
- Sim! - Afirmo, me levantando rapidamente
- A sua avó teve uma queda de pressão e por isso acabou desmaiando. Com isso, ela deslocou o braço, mas já fizemos todos os procedimentos necessários e agora está bem! Graças a Deus ela não bateu com a cabeça, o que seria bem ruim, ainda mais na idade dela. Hoje ela tomará a medicação e ficará em observação pelos médicos e se melhorar, amanhã ou depois de amanhã já poderá voltar para casa.
Nesse momento senti como se um peso de 20 quilos fosse retirado das minhas costas. Pude finalmente regularizar minha respiração e aquietar minhas trêmulas mãos.
- Muito obrigada! - Agradeci fazendo uma reverência demorada
- Recomendo que durma um pouco.
- Não acredito que consiga.
Mesmo que a situação estivesse controlada, era difícil ignorar o que aconteceu. Ver alguém que você ama em perigo e não saber o que fazer, além de esperar a ambulância chegar é uma sensação terrível.
Foram os piores 15 minutos da minha vida entre ver minha avó no chão e a demora dos bombeiros.

- O pior já passou. - Diz olhando para o relógio em seu pulso - Já são três horas da manhã. Depois de todo esse susto, você merece dormir.
-Mais uma vez, muito obrigada!

Ao entrar na sala em que ela estava dormindo, pego a uma manta quente e macia que havia trazido de casa e cubro Eliza.
Imagino coisas ruins, como por exemplo, se a ambulância demorasse muito para chegar ou se ao invés de ter machucado o braço, machucasse a cabeça ou até mesmo se isso acontecesse após eu mentir e viajar. Isso fez com que as lágrimas descessem pelo meu rosto. Balanço a cabeça para me livrar desses pensamentos intrusivos e me assento em uma poltrona reclinável ao seu lado. Não sei dizer ao certo quando adormeci.

A família de Choi embarcou no avião por volta das dez horas da manhã, no mesmo horário que a enfermeira trouxe o café da manhã. Ao olhar para mim, imaginou que minha expressão de descontentamento seria por conta do ocorrido com minha avó. Então deu tapinhas nas minhas costas e abriu um largo sorriso, como se tudo estivesse bem.
Encosto novamente na poutrona e fecho os olhos.
Repito diversas vezes à mim mesma:
Estou onde deveria estar. Estou onde precisam de mim.

Sinos do VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora