10. Antigo amigo

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Todos os dias em que saía da Universidade, me deslocava para o meu novo emprego no café. Eu era a responsável por fazer as bebidas quentes e servi-las, enquanto Taeyang - o dono da loja - produzia os deliciosos doces da vitrine. Um jovem alto e sorridente de cabelos loiros, por volta de seus vinte e sete anos. Ele nunca dizia a sua idade, pois não queria se achar velho.
Com o passar dos dias, conheci sua noiva, Yuna. A gerente da loja que me contratou. Ela aparenta ter uma personalidade fria de primeira, mas entendi que gosta de separar trabalho de amizade.
- Stephanie, prove esse doce novo que eu fiz! - Taeyang aponta para a bancada
- É uma delícia! - Aleguei ao morder primeiro pedaço da tortinha - Tem gosto de morango, chocolate e menta. - Era uma explosão de sabores na minha boca
- Deveriam estar trabalhando e não comendo. - Diz Yuna, massageando suas têmporas.
Apesar de nova, estava sempre cansada.
- Steph, você sabe o significado do nome da Yuna? - Taeyang sorri maliciosamente - Significa menina delicada com ternura e meiga. - Ele limpou as mãos no avental e se aproximou dela, colocando o seu braço envolta do seu ombro - Ela é totalmente diferente do significado que os pais dela colocaram! Já o meu nome...
- Significa luz por onde passa. - Completo
- E de fato sou! - Afirma mostrando um sorriso exagerado

Na Coreia, o significado do nome é muito importante, como se determinasse o tipo de pessoa ou futuro que devemos ter.
- O meu destino deve ser namorar um idiota. -Ela ri
- O idiota que vai te levar ao altar daqui a sete meses. -Ele pisca
Ver pessoas alegres me faz esquecer da minha situação real. Me lembro do que ela me disse quando falei que iria começar a trabalhar para ajudar em casa e comprar todos os seus remédios.
"Talvez eu tenha falhado com o seu pai." Foi apenas um sussuro, mas alto e áspero o suficiente para que eu pudesse ouvir.

*

Os primeiros trinta dias de trabalho se passam. Hoje, Yuna me liberou duas horas antes do habitual para fazer as compras do seu casamento. Com o meu primeiro salário, passo primeiro na farmácia e compro os remédios necessários para uma semana e vou para casa. Ao abrir a porta de casa, escuto o barulho das teclas do piano. Não era uma melodia, apenas notas perdidas, sem uma sintonia. Me aproximo da sala e vejo um garoto de pele morena e de cabelos bagunçado, sentado de frente para o instrumento que define a minha existência. O encaro durante alguns minutos, ouvindo atentamente cada nota, a transformando em uma música dançante na minha cabeça. Até que ele nota a minha presença e para de tocar.
-

Deve ser a Stephanie, certo?! - Ele dá um sorriso de canto - Meu nome é Jun-ho.
-Por que está aqui? - Minha voz acaba saindo mais rude do que eu esperava. Afinal, não é todo dia que você encontra um estranho tocando piano na sua casa
-Bem, já que agora você tem uma vida ocupada por conta da universidade e o seu novo trabalho, sua avó me pediu para ficar com ela enquanto você estivesse fora. - Respondeu no mesmo tom
- Como? Desde quando?
- A um mês! - Diz desinteressado, voltando a sua atenção para o piano
- Eu não entendendo. - Era uma verdadeira confusão - Como ela te conheceu?
- Acredito que você não se lembre de Jun Ji-Hyun.
Esse nome me era famíliar.
Busco no fundo da minha memória pelo nome mencionado e recordo de uma mulher de cabelos compridos, de olhos cor caramelo que brilhavam no sol. Uma mulher gentil que amava fazer companhia para a vovó, quando eu era criança.
- Sim, eu me lembro. Era uma velha amiga da minha avó. Ela faleceu quando eu tinha uns quatro anos.
- Era a minha mãe. - Diz calmamente enquanto aperta as teclas - Desde então, sua avó me ajuda com dinheiro. Todos os meses, à quinze anos.
Provavelmente meu rosto anunciava o espanto e surpresa. Como ela nunca me contou sobre isso? Como pode ajudar alguém por tanto tempo e essa mesma pessoa vir na minha casa a exatamente um mês, enquanto eu não estava presente. O vento sopra forte e os sinos na janela começam a se agitar. O doce som tintila e me faz lembrar de um curto momento, onde duas crianças felizes correm um atrás do outro na areia da praia, gritando e rindo como se fosse o melhor dia de suas vidas. Uma menina e um menino, ambos com a mesma idade.
Jun-ho. A lembrança que tive na rua, quando a menina perguntou ao pai se poderia chamar o Jun-ho oppa para o seu aniversário, era ele!
Nós brincávamos juntos! Éramos amigos.
- Ela me ligou.. - Ele continua, me trazendo para a realidade - Como eu poderia recusar ajudar alguém que praticamente salvou a minha vida?
- Eu não sabia.. - Também não sabia mais o que dizer
- Imagino. - As notas cessam - Acredito que por hoje não precise mais de mim. - Diz ao se levantar - Foi um prazer lhe reencontrar, Stephanie.
- O prazer foi meu! - Lhe mostro um sorriso um tanto desconfortável
Me aproximo da cozinha ao ter certeza de que ele já havia ido embora e lá estava ela. Uma senhora com um ar cansado, sentada na cadeira de ferro estofado, lendo um de seus livros poéticos, enquanto saboreava um chá quente. Estava com mais olheiras do que eu costumava lembrar. Coloco a bolsa com remédios sobre a mesa e me sento ao seu lado.
- Porque não me falou nada? -Pergunto intrigada
- O que mudaria se eu te contasse? - Ela retorna a pergunta com sua voz suave, sem me encarar - Iria se demitir? Iria sair da Universidade para cuidar de mim? Ou pediria para eu não ajudá-lo?
- Nenhuma das opções. Apenas queria que confiasse em mim.

Mesmo que eu tivesse mentido para você.

- Apenas... - Tentei encontrar as palavras certas - Quero que acredite em mim, quando digo que posso cuidar de você. Que posso cuidar de nós.
- Me desculpe. - Ela finalmente olha para mim - Você está certa! Se tornou uma mulher melhor do que eu criei para ser. Obrigada por se preocupar comigo. - Ela sorri - Sabia que vocês dois tem quase a mesma idade?
- Sim, eu sei. Ele me disse que a senhora salvou a vida dele. - Minha curiosidade acaba sendo maior
- Assim que a Jin-Hyun morreu, ele e o seu irmão mais velho viveram sozinhos. Os dois morreriam de fome sem ela. Por isso os ajudei. A mãe deles era uma grande amiga minha e também dos seus pais. -Ela abaixa a cabeça ao se lembrar de algo - Não poderia deixar que os filhos dela sofressem tanto.
-Me desculpe por exigir uma resposta. Eu não sabia disso. -Confesso
Ela coloca a mão sobre as minhas mãos em um sinal de reconforto
- Eu estou bem, minha querida! Pode ficar tranquila. -Ela diz

Eu espero mesmo que esteja.

Havia muitas coisas no qual eu não sabia, mas talvez, por um bom motivo. Será que a história da minha mãe se encaixava nisso também?
Era a única coisa que eu gostaria de perguntar.

Sinos do VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora