3. Sinos

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“A Música é o diálogo das notas musicais.”
-Wagner'd Rock


Três semanas se passam desde o anúncio dos projetos e acabei me esquecendo que hoje seria o grande dia da apresentação da Hedley. Ela passou mais de cinco dias aperfeiçoando o seu quadro e me mostraria quando chegássemos na universidade.
Em casa, enquanto me arrumava para a exposição, não sei de onde exatamente ecoava um som familiar, que me deixa trêmula e ofegante.

Minhas mãos gelam ao ouvir algo soando como uma melodia em meus ouvidos, fazendo meu coração estremecer e palpitar de uma forma que eu nunca havia sentido antes. O doce, mas enfurecido som de sinos me trazem o sentimento de estranheza. Distantes e confusos ao mesmo tempo.
O

barulho estava por toda a sala, aumentando cada vez mais conforme o vento se elevava.
Até que uma suposta lembrança aparece em minha mente, como se eu realmente estivesse lá. Naquela mesma sala, havia uma menina e um homem de meia-idade, sentados no banco do piano. Ela fechava os seus olhos enquando sorria e balançava suas curtas pernas alegremente que ainda não alcançavam o chão de madeira polida.
— Hoje irei te ensinar a tocar piano! — Diz o homem acariciando os lisos cabelos da menina
— Sério? — Ela pergunta, sem acreditar no que acabara de ouvir
Era emocionante e prazeroso para ela sentir seus pequenos dedos entrarem em contato com as teclas pretas e brancas.
— O que é isso? — Questionei a mim mesmo voltando a sã consciência
— Stephanie? Você está bem? — Indagou minha vó observando a expressão do meu rosto — Você está pálida!
— Ah! Eu... Sim! Estou bem sim! — Gaguejo, segurando minha mão trêmula
— Sente-se! Veja só o que encontrei no sótão.
— Sinos? — Pergunto antes mesmo de olhar, sentindo um nó em minha garganta

O que está acontecendo comigo?

— Se chamam sinos do vento! Não sei dizer a quanto tempo eles estão aqui. Irei prender na janela.
- De onde tirou isso? -Pergunto
-Do sótão. Você gostava deles quando era mais nova.
Não respondo. Pego o controle para ligar a televisão e disfarçar minha expressão de assustada.
Ouço atentamente as notícias da manhã.
Foi emitido um alerta de chuva intensa na cidade de Busan. Chove continuamente a três dias no estado de Seul, totalizando 72 horas de muita água. Toda essa chuva está vindo em direção a Busan. A temperatura máxima prevista para hoje é de 10 graus e minima de 3 graus. As regiões do norte, no momento estão sendo as mais afetadas pela chuva. Com isso, as equipes de limpeza urbana e os bombeiros já foram acionados.”

Nesse inverno a neve ainda não se atreve a aparece. Ao lado de fora, todos estavam com os seus pés molhados por encharca-los na chuva.
O ar estava impregnado com o aroma único de um dia chuvoso. Na cidade estava frio, mas em casa estava quente. Era capaz de sentir minha cabeça queimar.  Minhas roupas passavam uma imagem de uma pessoa séria e centrada. Tudo o que eu não era naquele momento, não depois daquela lembrança, se é que era uma lembrança. Estava vestida com um casaco longo de veludo vermelho que chegava ao joelho, uma camisa preta sobre a calça escura e meu cachecol quadriculado de lã feito pela minha avó. Prendi meus cabelos em um longo rabo de cavalo, deixando pequenas mechas soltas na frente.
— Não acredito que você me acordou cedo em pleno dia de chuva — Reclamou Ayla, entrando pela porta da cozinha, esfregando os olhos
— Uma me atrasa e a outra me acorda cedo! Devo parar de andar com vocês? Passei noites acordada para terminar meu quadro. — Hedley reclama logo atrás
— Pedi que viessem cedo, pois a chuva aumentará daqui a algumas horas. Então ficará difícil de sair! — Alerto pegando o guarda-chuva
Saímos duas horas antes do habitual.
Algumas estações de trem estavam impossibilitadas de sair, causando o atraso de muitas pessoas. A pista estava mais escorregadia, trazendo também os engarrafamentos e possíveis acidentes.

Eu não sabia, mas a minha decisão de chegar cedo, alterou completamente o destino. Fazendo eu te conhecer.

— Aigoo, eu preciso dormir! —  Ayla grita após chegarmos na universidade
— Nossos professores ainda não chegaram, então podemos dormir um pouco. Na verdade, nós somos as primeiras! — Observa Hedley, enquanto andávamos pelos corredores
— Irei ao auditório tocar um pouco! Se quiserem vir...
— Não, obrigada! — Dizem juntas
— Tudo bem! Podem ir dormir! — Rio da situação -Vocês estão precisando.
Sigo até o auditório, pensando na imagem da menina no piano. Conseguia me lembrar de cada nota que o homem ao seu lado tocava. Então me sento sobre o pequeno banco acolchoado e começo tocar, assim como ele.

Era fascinante!
Tão suave e inspirador!

No mesmo instante, pego um papel e uma caneta em meu bolso para começar escrever as notas musicais. Logo depois, passo para as folhas maiores do meu caderno. Acredito que horas tenham se passado, mas não conseguia me despedir do piano, sem terminar a música. O chão se encontrava repleto de papéis, alguns riscados, outros amassados e pouco organizados.
— Dó, ré, sí... Dó ré sí? Isso está certo? — Perguntei a mim mesma — Preciso ajeitar esses pape.. — Sou interrompida ao ouvir o barulho de algo cair
Olho para trás, mas não vejo ninguém. Então me levanto cautelosamente e caminho até a porta. Quem quer que estivesse ali, já tinha ido embora. Entretanto, havia um pequeno lápis preto no chão escrito “6b”.
— Um lápis de desenho?
Penso em alguém que saberia me responder. Então subo até o prédio de artes para me encontrar com Hedley.
— O que acha disso? — Lhe mostro o lápis
— Esse tipo de lápis é utilizado para fazer o desenho de enchimento, texturas e esboços. Para fazer traços mais escuros. Quase não utilizo esse tipo de lápis. Mas porque?
— Encontrei no auditório. — Explico
— Com certeza é de algum aluno de desenho. Eles andam para cima e para baixo com esses lápis. Quer que eu pergunte se é de alguém da minha turma?
— Não, obrigada! Talvez o dono do lápis volte.
— Como quiser! Não se esqueça que daqui a alguns minutos começa a exposição! Estou um pouco nervosa. Estão dizendo que tem um artista muito bom e ele sempre se destaca quando se trata de fazer quadros.
— Você vai se sair bem! Se você deu o seu melhor, já vai ser o suficiente. -Digo, porém não utilizo esse conselho para mim mesma
Descemos ao primeiro andar, onde começaria a apresentação. Me aproximo um pouco ao tumulto de pessoas, observando cada aluno que passava. Por algum motivo, Hedley cobriu os meus olhos com as suas mãos antes de me amostrar seu quadro que levara horas para ser concluído.
Ayla já havia chego e se acomodava ao meu lado, também de olhos fechados.
— Abram!
A minha frente se encontrava um lindo quadro florido. Representando um belo jardim de flores marrons, frésias amarelas e rosas azuis.
— Nossa... — Diz Ayla boquiaberto — Isso está incrível Hedley!
— Você com certeza é a próxima Van Gogh! Agora eu acredito! — Digo fascinada
— Não sejam exageradas! Eu fiz esse quadro inspirada em nós três. Todas elas são flores, mas cada um com a sua cor. A flor amarela passar a sensação de luz e calor, o amarelo estimula o raciocínio e a criatividade. Também pode ser usada para definir alegria, otimismo e jovialidade, no qual representa a Ayla. — Informa  — A flor azul, sendo uma cor fria, está relacionada com a nobreza e costuma ser usada para transmitir harmonia, tranquilidade e serenidade. Ela representa você Stephenie! — Continua apontando para a última flor do quadro — E por fim, a flor marrom considerada a cor da terra, expressa segurança, maturidade, conforto e simplicidade. Além disso, também é relacionada a produtos naturais e ao estilo de vida saudável, que sou eu. — Conclui sorrindo
— Aigoo! Eu vou chorar! Você é uma ótima amiga! — Choraminga Ayla
- Eu estou sem palavras. - Alego
- Só não molhem o meu quadro com suas lagrimas, por favor. -Hedley caçoa
— Aish. -Ayla faz bico
Um burburinho se forma atrás de nós, o que acaba chamando a minha atenção, aonde um quadro se encontrava rodeado por muitas pessoas.
— Vamos ver! — Hedley olha para mim
Alguns veteranos admiram a obra na parede por ser um desenho clássico, envolvendo conhecimentos de várias técnicas, que unem-se para criar a ilusão e a representação de movimento.

Eu acho que era isso que eles falavam.

Só me dou conta do desenho que era ao analisar cada detalhe da obra. Levanto uma das sobrancelhas, sentindo logo depois meu coração acelerar.
— Sou eu?


Sinos do VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora