18. Encaixe

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Stephanie:

Antes de embarcamos no trem, envio uma mensagem a Jun-ho, avisando que estava bem. Eu provavelmente precisaria pensar em uma explicação para dar a minha avó, antes de chegar em casa. Aproveito e pergunto sobre a cicatriz no seu braço. Não que isso me importasse, mas de algum modo, aquela marca chamou a minha atenção.
Desligo a tela do celular e observo o mapa colado na parede do trem, enquanto Choi fotografava o céu.
Cerca de uma hora depois, chegamos ao nosso destino. As casas e ruas eram um pouco parecidas com as de Busan, exceto pela 83 Tower. Uma torre de turística de 230 metros de altura que ficava próximo ao endereço dado por Choi.
-Quer mesmo fazer isso? -Pergunta, se posicionando em frente a casa
Ele parecia estar um pouco mais ansioso do que eu.
-Não irei recuar agora! -Alego decidida
Aperto a campainha e em segundos uma menina loira de aparentemente doze anos abre a porta.
-Pois não?
-Essa é a casa de Lee Jang-me?
-Hum... Bem.. É sim. -Gagueja
-Eu poderia falar com ela?
Sem resposta, ela olha de um lado para o outro, como se estivesse prestes a fugir. Um homem alto - também loiro - surge atrás dela.
-Posso lhe ajudar? -Pergunta formalmente em um sotaque americano
-Me chamo Stephanie Lee. Vim aqui para falar com Lee Jang-me.
Ele me encara.
Se os seus olhos pudessem saltar do seu rosto e saírem correndo, com certeza eles fariam isso. A porta se abre por completo.
-Entre, por favor!
Choi entra logo atrás de mim, um tanto receoso. O homem nos pede para sentar no sofá largo enquanto prepara café na cozinha. O silêncio se instala sobre a sala, trazendo um enorme desconforto. A menina que nos atendeu senta na poltrona à esquerda e outra menina exatamente igual, na poltrona da direita.

Ah. São gêmeas. Filhas da Jang-me, imagino. O que faz delas.. minhas irmãs?!

Meu celular vibra com uma nova mensagem do Jun-ho.
Desbloqueio a tela para verificar.

(Jun-ho) -Foi em um acidente de carro, quando eu tinha cinco anos. -Explica, referente a pergunta que eu fiz sobre a cicatriz em seu braço

O homem volta da cozinha e coloca dois copos de café sobre a mesa. Ele não parecia coreano, mas sim americano. Cabelo curto, raspado nas laterais, com mechas douradas, queimadas por causa do sol. Barba mal feita e olhos escuros como os meus.
-Me desculpe lhe deixar esperando. - Diz sentando perto das filhas. Ele era forte e um pouco musculoso, o que fez com que uma das gêmeas trocasse de lugar para se acomodar melhor -Como nos encontrou?
-Meu amigo encontrou o endereço para mim. Vim aqui porque gostaria de perguntar algumas coisas a própria Jang-me. -Alego
-Sinto muito lhe informar, mas não poderá falar com ela.
-Porque não? -Pergunto
-Ela faleceu no ano passado. -Ele diz
Parecia que tudo a minha volta havia parado. Eu cheguei tarde de mais? Minha única esperança de descobrir sobre mim mesma se foi?
-Como isso aconteceu? -Pergunto ainda tentando entender
-Ela tinha uma doença do coração. Uma doença que foi acabando com ela aos poucos.
Ouço um zumbido agudo em meus ouvidos, ao ponto que chega a doer.
Olho para Choi e ele abaixa a cabeça. Ele sabia disso? Se ele viu o relatório médico, com certeza sabia, mas não estava na condição de questioná-lo.
-Você sabe algo sobre a casa na China? -Mudo o assunto
-O que sei é que a casa foi passada de geração em geração, até chegar em você. Porém, todos os seus parentes paternos moravam na Coreia e queriam que você vivesse aqui. Então, seus pais fizeram um acordo de ficarem 6 meses na Coreia e 6 meses na China. Todo ano, até você crescer. -Explica
-Espera. - Tudo estava indo rápido de mais e eu precisava respirar -Eu não falei que era filha da Jang-me.
-E nem precisa. Você tem o sobrenome dela e a mesma fisionomia. É impossível não saber.
Levanto de vagar por conta das minhas pernas que estavam tremendo e me coloco em sua frente, olhando para uma das gêmeas.
-Não é como se eu me importasse. Afinal a Jang-me foi embora. -Respondo friamente -Após o meu pai morrer, ela foi embora.
-Você sabe como o seu pai morreu? -Ele ergue uma das sobrancelhas
-Em um acidente de carro!
-Seu pai não apenas morreu como matou uma mulher e feriu uma criança! -Ele se levanta
Meu corpo esfria e minhas mãos também começam a tremer.

É mentira! É uma enorme mentira!

-Isso é impossível! -Digo irritada
-Ele aumentou a velocidade em uma pista escorregadia e o carro bateu. A amiga da sua mãe que estava no carro e o seu pai faleceram na hora. A criança foi a única que saiu com vida! -Uma de suas filhas segura a sua mão e ele volta a se sentar -A Jang-me não te abandonou pela doença, mas por causa disso.

Não pode ser verdade.
Não pode ser verdade.

Meu celular vibra mais uma vez. Uma mensagem não terminada de Jun-ho.
Tento desviar o olhar do homem a minha frente e desbloqueio novamente o celular.

(Jun-ho) -Foi nesse dia que minha mãe morreu. Fui o único que sobrevivi no carro. O motorista também morreu, mas não me lembro quem era, pois era muito pequeno.
-Meu Deus. - Coloco a mão sobre a boca quando lágrimas começam a descer pelo meu rosto
De repente tudo começou a se encaixar.
Agora eu finalmente entendia o porque da minha avó enviar dinheiro ao Jun-ho durante tanto tempo. Não era pelo fato da Jun Ji-hyun ser amiga dela e ter falecido, mas sim, por que o meu pai a matou. O garoto que estava na minha casa todos os dias, perdeu a sua família por causa da minha.

Sinos do VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora