DECISÃO

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Raabe estava postada frente à janela do seu quarto, pela qual podia avistar as pequenas montanhas que separavam Jericó do rio Jordão. Seus pensamentos vagavam longe, e seu coração estava profundamente turbado. Enquanto limpava uma lágrima que lhe escorria pelo rosto, experimentou novamente a sensação desesperadora de que sua vida valia tão pouco que nem ao menos deveria ser vivida. Todos os seus sonhos estavam enterrados debaixo da realidade brutal daquilo que fora obrigada a se transformar; uma prostituta. E nem ao menos uma prostituta do templo, que faria com que fosse vista com menos desdém. Não, ela era a pior espécie de rameira que existia, pois se prostituía na casa de seu pai, à vista de toda a cidade. Olhou as estrelas e suspirou, pensando que talvez algum milagre pudesse mudar a sua história. Imediatamente, ao pensar em milagres, lembrou-se dos israelitas e das histórias de seu poderoso deus.

- Eu não sei o seu nome, e nem ao menos tenho certeza de que você existe, - Sussurrou entre lágrimas. - Mas sei que não é como os ídolos de pedra que meu povo adora. Também não sei se pode me ouvir...mas se estiver ouvindo, tenha misericórdia de mim, e transforme a minha vida... pois eu não suporto mais esse jugo sobre mim.

O silêncio de longos instantes sozinha, sem ouvir ou sentir qualquer tipo de resposta, trouxe ainda mais amargura ao seu coração, pois entendeu que esta era na realidade a resposta que ela não queria ouvir. Estava, como sempre, sozinha. Limpou pela última vez o rosto molhado pelas lágrimas, respirou fundo e caminhou na direção da porta do quarto, pois sabia que teria de se preparar para receber novos clientes.

Um barulho seco, como de uma pedra caindo ao chão, a fez parar. Tentou perceber de onde havia vindo o ruído, mas o único local possível era a janela de onde acabara de se afastar. Foi até ela lentamente, com medo, mesmo sabendo que sua casa estava edificada sobre a muralha da cidade, e que a altura impediria que alguém ou alguma coisa viesse até ela pelo lado de fora. Colocou cuidadosamente a cabeça para fora, temerosa de que algo estivesse ali.

E para seu espanto, seu temor tornou-se realidade. Dois homens, que pelas vestimentas eram soldados, e não de Jericó, estavam escalando a superfície quase lisa da parede exterior da muralha, e já estavam praticamente a um metro de distância da sua janela.

- Por favor, não grite! - Disse o que estava mais próximo da janela, assim que a viu.

- Quem... quem são vocês?

- Deixe-nos entrar, e lhe explicaremos tudo.

Sacando um dos dois punhais que sempre carregava consigo, Raabe apontou-o na direção do soldado e vaticinou - Diga-me quem são e o que querem, ou eu mesmo corto o seu pescoço!

- Fique calma mulher... - Pediu o primeiro, enquanto continuava a escalada, agora chegando praticamente na janela.

- É sua última chance...ou diz quem é, ou...

- Nós somos israelitas mulher!

- Is...Israelitas? - Balbuciou, atônita.

Numa súbita mudança de comportamento, incompreensível para os soldados, ela os ajudou a alcançar a janela e os pôs para dentro do quarto, sem, no entanto, soltar o punhal.

- Pode guardar sua faca mulher, nós não lhe faremos mal.

- Tenho por acaso, cara de idiota?

- Você tem a nossa palavra, na presença de Yahweh, de que não lhes faremos mal algum.

- E quem é esse tal de Yahweh, para que eu aceite o seu juramento?

- Ele é nosso Deus, criador dos céus e da terra, o único e verdadeiro Deus.

Raabe sentiu seu coração descompassar e bater de forma mais intensa, ao ouvir tais palavras. Não sabia como, e nem entendia de que forma, mas agora sabia que o deus dos israelitas havia ouvido suas súplicas. E agora, ela sabia como deveria chamá-lo; Yahweh.

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