A morte de uma pessoa é uma tragédia; a de milhões, uma estatística.
Joseph Stalin
Quando o sol nasceu naquela manhã, a cidade estava diferente, Mandrake estava preso, os homens mortos, e a polícia fazia rondas pelas ruas , mas não encontraram nada, Davi sumiu com os cadáveres dos mercenários , e o corpo de Alice, não sei que fim levou . Figurante estava no hospital,em estado grave, mas vivo . O ponto alto das tragédias já havia passado , as revelações sido feitas, logo São José seria uma cidade tranquila novamente . Mas eu não estava tranquila, o pesadelo não saia da minha mente, nem a imagem de Ramiro matando minha família , tinha que ir até a cidade próxima ao Manicômio prestar meu depoimento,sou a única sobrevivente , o doutor estava preso ,e havia rumores de que estava louco ... Não acredito que esteja .
E quando o sol nasceu aquela manhã, os primeiros raios iluminaram o meu rosto ,no banco de trás de um casal ,amigos do meu pai,que me deram carona até próximo as ruínas do Manicômio, porque de lá ,seguiriam por outra direção . Desci do carro na encruzilhada, não sentia nada, nenhum tipo de emoção .
-Obrigada, boa viagem !
-Por nada, se cuida!
A mulher respondeu amistosa, e seguiram em frente . Coloquei a mochila nas costas, e segui apé, recolhendo algumas flores na beira da estrada .
As ruínas do Manicômio ainda estavam iguais ao dia que fui encontrar Saul. Havia flores espalhadas em frente ao portão ,e frases escritas no muro , os internos precisaram morrer,para que as pessoas que passavam ali na frente todos os dias, notarem que existiam . Até então ninguém ligava , ninguém visitava, quantos ali só queriam ver rostos diferentes , conversar sobre o mundo lá fora, e nunca receberam uma única visita . As atrocidades cometidas ali ,chocaram um país inteiro, repórteres vinham de todos os estados para gravar reportagens . Sou a única sobrevivente , meu depoimento será o mais importante , vou ter que contar tudo ... Ramiro será condenado, e sua vida dependerá disso ,se a pena for curta, o matarei .
Deixei as flores no portão.
- É a última vez que venho aqui , sabem como é difícil estar aqui revivendo tudo , o pior é que sinto falta de muitos de vocês , esse lugar era o inferno,mas havia almas que mereciam ser salvas, espero que Deus tenha os recompensado por tanto sofrimento , principalmente às crianças que nasceram e morreram entre esses muros,sem nunca saber como é o mundo aqui fora . Espero que tenham se reencontrado num lugar melhor , todos juntos novamente ,mas livres , a doutora também ,ah ,como sinto falta de olhar seu rosto cheio de sardas , a senhora seria uma boa ouvinte das minhas recentes desgraças ... Obrigada pessoal, vamos nos reencontrar algum dia ...
Segui em frente ,deixando aquela parte do meu passado ,no passado . Cheguei à cidade, já era quase três horas da tarde , fui direto para a delegacia , uma policial alta e com cara de brava , me guiou até a sala , onde dei meu depoimento .
A história era longa, tudo foi revivido ,desde o meu primeiro dia no Manicômio até o último, todas as pessoas que vi morrer, todas as agressões que presenciei,todos os suicídios, e todos os meus dias na sala úmida .
Permitiram que visitasse Ramiro , eu tinha que vê-lo pela última vez , enterrar aquela parte também . Quando cheguei no local , ele estava deitado numa cama confortável , numa cela especial . Fiquei parada próxima à grade ,esperando ele me notar . E quando seus olhos se fixaram no meu rosto , sua expressão mudou , começou a chorar .
-Oh!Pobrezinho !
Não acreditava na sua loucura ,muito menos nas lágrimas de crocodilo .
-Ele está vindo , as grades não são o bastante ...Diga ele !Diga que eu sinto muito ...por favor!
-Quem está vindo ,doutor?
Ele estava ajoelhado ,segurando a grade e chorando , implorando por salvação ...
- Não posso salvar ninguém, doutor... E não salvaria você ,caso pudesse .
-Me perdoa ...Eu não queria ...Eu!
-Nunca ! O senhor lembra de tudo que fez ,claro que lembra . Não está louco, não sabe nem fingir ! Pois estão grande doutor Ramiro, essa cela é um hotel cinco estrelas ,perto das que o senhor me prendia ...Está reclamando do que?
- Eu não quero morrer, não pelas mãos dele ... Me mata ! Eu sei que você quer !
- Não sou uma assassina.
Claro que não poderia dar indícios, eles estavam assistindo de algum lugar .
-Me mata...por favor ,estou implorando!
-Quem está vindo ?
Perguntei pela segunda vez, já desconfiada da resposta .
-O homem dos olhos cinzentos !
Não contei que Escriba ,o homem a quem se referia poderá estar morto . Era maravilhoso ver o medo nos seus olhos , não de morrer ,mas do processo até a morte ...As torturas !
-Ele pode estar aqui , já pensou ? Você viu o rosto dele , um dos únicos a ver ... Agora lide com isso !
- Não ,por favor!
-Adeus doutor , não sei se torço para que apodreça aqui sozinho ,ou para que ele o mate de uma forma horrível ...De qualquer forma , foi bom vê-lo como realmente é...Um covarde !
Não mostrei fraqueza,tentei esconder o máximo minhas cicatrizes antigas e recentes , ele nunca mais me verá frágil ... Mesmo que eu esteja destruída !
Quando sai, já era noite, procurei um hotel barato , e fiquei lá trancada no quarto,incapaz de sair até para comer .
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Sol das Almas (Livro II) CONCLUÍDO
TerrorO doce sabor amargo da meia liberdade, não posso reclamar tanto,estar presa entre os muros do manicômio é bem melhor do que presa apenas entre as paredes pinxadas da minha cela. Agora meus olhos estão mais acostumados com a claridade, ontem foi terr...