Ser Nos Mesmos Incomodam Outras Pessoas

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Querido Diário,

Em uma sociedade que nos permite uma enorme variação em relação a identidades, a definição de autenticidade é facilmente confundida com a necessidade de diferenciar-se do comum. Ser si mesmo, portanto, implicaria em não ser o outro. E justamente aí está o problema desse tipo de compreensão, já que também somos resultados de uma série de identificações construídas ao longo de nossa história. E para alguns, isso chega a incomodar.

As pessoas nos julgam por sermos quem somos e isso as incomodam. O pior ainda é ouvir de uma pessoa próxima a você que você deve mudar suas atitudes, pois está incomodando, esta dando motivos para os outros comentar algo ruim sobre você, é difícil ouvir isso, mas é nossa atual realidade. Elas tentam te silenciar, e acabar com o seu brilho, porque estão infelizes com suas próprias vidas. 

Quem nos ama de verdade e está do nosso lado para o que der e vier, jamais irá nos julgar ou incriminar por um vacilo, ou por algo que não saiu conforme as expectativas que ele mesmo criou a nosso respeito. Quem coloca tudo a perder e te incrimina por qualquer deslize, não merece andar ao seu lado.

Durante muito tempo me preocupei muito mais em ser aceita pelos outros do que bancar quem eu realmente era, com toda gama de nuances que fazem parte do que sou. Durante muito tempo, a busca por ser aquilo que esperavam de mim tinha muito mais valor do que assumir minha identidade, sem tirar nem pôr.

Porém, com o tempo e alguma maturidade, fui percebendo o quão exaustivo era aquilo, o quão penoso poderia ser construir uma vida assim, em que "cumprir o combinado" tinha mais valor que experimentar minha própria narrativa, com todos os erros e acertos desta escolha.

No fundo, eu queria ser amada — todos nós queremos. Mas o olhar do outro sobre mim tinha um peso e um valor muito grandes, e não querer decepcioná-los era uma meta que me roubava, pouco a pouco, de mim mesma.

Há uma diferença grande entre autoestima e autoaceitação. Autoestima tem a ver com reconhecermos as nossas qualidades e fazermos uma autoavaliação positiva a respeito de nós mesmos. É claro que ela é poderosa, e nos ajuda a nos posicionarmos com "confiança no nosso taco", nos tornando conscientes de nosso valor.

Porém, a busca desenfreada por uma autoestima positiva, no qual os aspectos negativos ou não tão atraentes são considerados "ruins", nos faz rejeitar partes de nós mesmos que deveriam conviver harmoniosamente com os traços positivos, sem causar mal-estar por nossa totalidade.

É claro que é importante tentarmos evoluir a cada dia. Se uma gordurinha fora do lugar ou o desejo de estudar e crescer são incentivos para eu mudar e ser melhor — principalmente para mim mesmo — ótimo! Porém, isso difere de tentar passar uma imagem de perfeição, negando ou recusando minhas limitações, como se elas fossem anomalias que deveriam ser escondidas ou combatidas a qualquer custo.

A ditadura da perfeição e a busca por uma autoestima impecável é exaustiva. Pois, no fim das contas, estaremos querendo agradar a quem? À vitrine do Instagram? Ao binóculo da família, amigos, vizinhos, ou seus colegas de trabalho?

A perfeição é uma armadilha. Porque ao me exigir perfeição, me cobro além da conta, além do que é possível e humano, e acabo abrindo mão do que é do meu feitio e da minha vontade para cumprir um protocolo impossível, que fatalmente terá falhas, e me mostrará que tenho limites. E talvez, tarde demais, eu descubra a perfeição me roubou de mim.

Em diversas situações, nos sentimos constrangidos simplesmente por existirmos e tentarmos ser autênticos e coerentes com nossos desejos. Algumas vezes, temos necessidade de nos justificar pela vida que vivemos e por nossas escolhas. 

Esses dias, estava assistindo a um filme e uma personagem disse o seguinte: "Todo mundo falha em ser quem deveriam ser. O valor de uma pessoa... é o quanto eles dão certo em ser quem são." Essa citação me abraçou num momento em que atravesso um período de muitas reflexões acerca da coragem de me expôr e da necessidade de aprovação. Muitas vezes, a gente se sente impelido a pedir perdão por ser quem é.

Não deveríamos dar tantas explicações, mas damos. Não precisaríamos nos incomodar tanto com o que dizem e pensam a nosso respeito, mas nos incomodamos. Não devíamos nos afetar com quem julga nos conhecer melhor que nós mesmos, mas nos deixamos atormentar. Não deveria ser necessário querer provar algo a alguém — já que as pessoas acreditam no que lhes convém — mas insistimos em tentar não decepcionar ninguém.

De vez em quando iremos decepcionar alguns, e está tudo bem. Ninguém é perfeito nem infalível; também temos direito de seguir o coração, mesmo que isso não atenda às expectativas dos "donos da razão". Não devemos tentar agradar a elas, não estamos aqui para agradar ninguém, estamos aqui, para se realizar e ser feliz. A vida nos fez livre, autônomos, independentes, não devemos se importar se elas ficam incomodadas com a nossa forma de ser.

Fique em paz com suas decisões e escolhas; esteja tranquilo com a forma que você se expõe nas redes sociais — mesmo que isso incomode quem nunca se satisfaz; não perturbe o seu coração com exigências sobre-humanas. Muitas vezes as pessoas esperam muito de nós, e por querer cumprir o combinado, seguindo o script da expectativa alheia, acabamos numa prisão.

De repente você está vivendo a vida de outra pessoa, e não a sua, somente pelo desejo de agradar. De repente você deixa de olhar para seus anseios e necessidades e passa a querer cumprir o script daquilo que esperam de você somente pela obstinação de ser aceito e não decepcionar.

Que preço alto de viver! Então um dia você acorda e decide que é hora de mudar. E, de tanto fazer o "certo", quando você desiste de cumprir as expectativas externas, acaba sendo massacrado, pois não aprenderam que você também tem desejos, como todo mundo, e que você também quer ser senhor(a) de suas horas, como todo mundo.

Por fim, uma vez citei algo parecido e fez todo sentido: "Afastar-se de algumas pessoas é autocuidado". Preste atenção à sua volta. Nem todo mundo merece lugar de destaque no seu coração e na sua vida. Distanciar-se e manter apenas vínculos cordiais e diplomáticos com algumas pessoas pode ser questão de saúde mental. 

Nem todo mundo se relaciona de forma saudável, e muitas vezes você acaba doando seu tempo e energia às relações que cortam suas asas e minam sua autoestima, quando poderia simplesmente dar um basta. Aprender a colocar limites e dizer "não" é um grande passo, e representa um salto gigantesco na sua qualidade de vida. Afinal, ninguém percorreu seu caminho com seus sapatos para saber onde apertam os seus calos...

Gábito Nunes tem uma frase que adoro que diz: "A verdade, o que realmente importa mora dentro de mim, longe do binóculo alheio. O resto é cena, ego, poeira." E é isso que acredito. Não precisamos ser publicitários de nosso bem ou mal-estar, mas entender que somos um conjunto de bem e mal, sucesso e insucesso, conquistas e limitações, certezas e enganos. E se uma hora ou outra os desacertos superarem a excelência, tudo bem!!!

"Autoestima não significa eles vão gostar de mim, e sim tudo bem se eles não gostarem". Assuma os riscos de ser quem você é, e aprenda a dizer "está tudo bem!" mesmo quando o feijão queima, a meia calça desfia, o projeto atrasa, as mãos soam, você surta, o despertador não toca, o desodorante vence, você diz "não" àquela solicitação ou é rejeitado por alguém.

Se perdoe, se pegue no colo, acolha suas falhas e respeite seus momentos de insanidade e inadequação. Assuma seus desejos, mesmo que isso desagrade alguns ou signifique que você deixará de fazer parte daquele "clube-seleto-de-pessoas-perfeitas-que-fazem-ioga-e-meditam-às-5-da-manhã". Assuma sua vida, seus caminhos e, finalmente, aprenda a se acolher com compaixão, abraçando-se com aceitação e perdão.

Mas acima de tudo não se esqueça: "Seja você mesmo, independente de qualquer coisa ou situação!" 

Kate Miller

O Diário De Bordo De Kate MillerOnde histórias criam vida. Descubra agora