Este diário chegou ao fim. Aqui encontrei um lugar para desabafar, para expressar meus sentimentos e transparecer situações sobre a vida. Foi desde memórias até reflexões. Esta obra foi escrita com o intuito de chegar algum tipo de mensagem para as pessoas que viveram, vivenciou ou ainda irão viver o mesmo tipos de diferentes temas que aqui se identificaram tendo sido abordado. Então vamos para uma última postagem dessa obra, uma última lição de O Diário de Bordo de Kate Miller.
Querido Diário,
Existem os finais perfeitos e os finais necessários. E algumas vezes o ponto final acontece antes do fim. Onde caberia uma vírgula, ponto de interrogação ou reticências, se antecipa o ponto final. A folha continua, tem muitas linhas em branco até chegar ao rodapé da página, mas preenchê-la até o fim seria diminuir a intensidade do que foi escrito no início.
Não é preciso preencher um caderno inteiro para provar que foi bonito. Às vezes, escrever uma só linha basta. Algumas histórias nascem para serem curtas, mas isso não diminui a beleza nem a importância.
Insistir em vírgulas quando o ponto final é a única ferramenta possível para fazer a história resistir como uma lembrança inesquecível, é tornar aquilo que poderia ser marcante em algo maçante, que se prolonga além do necessário.
Algumas histórias nascem para serem curtas. Como quando você faz uma viagem para um lugar diferente, lindo e distante. Você se encanta com o frio dilacerante, aplaude o pôr do sol e não se importa de escalar uma montanha para chegar ao topo. A viagem terá curta duração, você sabe, por isso cada instante é vivido com intensidade e emoção. Se, ao contrário, a viagem se torna realidade cotidiana, o prazer se dissipa. E aquilo que seria inesquecível por ter um ponto final, se torna apenas mais uma entre as muitas vírgulas rotineiras da sua narrativa.
Pontos finais também são atos de amor. Partir antes do fim também é uma forma de eternizar o que foi vivido. É doloroso, mas insistir em parágrafos somente pela necessidade de chegar à última página transforma o amor bonito em ruínas. Às vezes é preciso finalizar antes da última palavra.
Adoro a frase de Rupi Kaur que diz: "Eu não fui embora porque deixei de te amar. Eu fui embora porque quanto mais eu ficava, menos eu me amava." Partir antes do fim é preservar a porção de dignidade que ainda resta, é poupar o amor de ser lembrado como um fardo, é restaurar o amor-próprio e dar uma chance para o tempo transformar a dor numa cicatriz-poema, capaz de nos lembrar que viver sem se machucar é o mesmo que viver sem amar.
A verdade é que a cada partida reconheço um pouco mais de quem sou, conheço um eu novo, torcendo pra deixar marcas boas, mesmo diante do extremismo de quem vive como se estivesse se despedindo, com a sede de quem sabe que as coisas esfriam e se perdem no tempo. Urgência de quem vive a vida com pressa, porque se acostumou com as partidas.
Com as chegadas e partidas, aprendi a valorizar o tempo de estar. Com tanto ir e vir, aprendi a abraçar quem quis ficar, mas, abraçar ainda mais forte quem não quis. Aprendi que por mais imenso que o mar seja, por mais peitos nos quais se possa atracar, cada chegada é única, ninguém parte o mesmo que chegou. A vida precisa fluir, chegar, partir, abraçar quem nos tornamos e esperar o que está por vir.
Despedidas são de lascar. Arrebentam com o nosso emocional e nos levam a nocaute rapidamente. A vantagem é que quando a dor passa nos levantamos mais fortes e começamos a entender que muitas despedidas são, na verdade, presentes.
Nenhuma despedida é fácil. Mesmo quando somos nós que decidimos partir, sempre fica aquele sentimento de "poderia ter tentado mais" ou "e se dessa vez fosse diferente?". Ouso comparar as despedidas como um corte de cordão umbilical. Parece que a vida nos tira a força de um lugar seguro e confortável para nos apresentar algo diferente e novo e isso é assustador.
Há vários motivos de despedidas, mas nenhum deles é fácil. Despedir-se de uma relação abusiva é tão difícil quanto despedir-se de um ente querido e o motivo é simples: em ambas as situações que ainda doí não é ausência física, é a ausência emocional.
Dói saber que a relação não deu certo e os projetos feitos a dois ficaram apenas no papel. Dói lembrar as ofensas, as agressões e as humilhações ditas por quem você julgava amar. Dói a mudança na rotina, nos hábitos, nos planos. Mas, é importante lembrar que, na mesma proporção que a dor vem, o amadurecimento emocional acompanha.
Contrariando Shakespeare que definia a despedida como "uma dor suave", acredito que ninguém se despede feliz de um ciclo. Despedidas são situações constrangedoras e dolorosas que envolvem muito autocontrole e inteligência emocional.
Porém, como tudo na vida tem dois lados, é preciso entender que muitas histórias começam nas despedidas. Às vezes, é preciso dar aquele "adeus" dolorido, fechar a porta e caminhar sem olhar para trás para que o novo chegue e nos surpreenda.
Pode ser que a despedida de um antigo amor abra às portas para um novo. Ou que a amizade desfeita na falsidade encontre uma nova sincera ou, até, que um novo emprego apareça quando você tiver coragem de abandonar o antigo. O fato é que muitas possibilidades se escondem atrás de uma despedida.
Tenha coragem de viver uma nova história. Permita-se experimentar novas emoções. Acredite que despedidas são também presentes. Como dizia Millôr Fernandes: "do mundo nada se leva. Mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus".
Nada é permanente. Tudo muda o tempo todo. Pessoas chegam e vão. Sentimentos se formam e se perdem. Corações se partem e se reconstituem. Risadas dominam e se dissipam. Lágrimas caem e secam. Tudo é temporário, tudo é inconstante. No fim do dia, a vida é uma eterna estação de despedidas.
Estação essa que é cheia de idas e vindas. Algumas idas gostaríamos de abortar, outras de antecipar. Algumas vindas nos fazem sonhar, outras palpitar. Vivemos uma narrativa que precisa continuar, mesmo que muitas vezes não saibamos muito bem aonde ela irá nos levar.
Saber que nada na vida é permanente é complexo. Nos momentos difíceis nossos amigos dizem: "É só uma fase, vai passar." Nos momentos bons só conseguimos fixar um único pensamento: "Queria que isso durasse para sempre." Não há como viver a metamorfose se não abrirmos mão das nossas fases de lagartas, já escrevi sobre isso. A despedida do que já cumpriu seu papel faz parte da transformação essencial nas nossas vidas. É assim que seremos melhores do que fomos ontem.
E justamente por isso que a vida ser uma eterna estação de despedidas é tão bom. O fato de sabermos que tudo é temporário é uma dádiva. E não me leve a mal. Isso não quer dizer que amores para a vida toda não existem, por exemplo.
Significa apenas que, em algum momento, seja por fatores da vida cotidiana ou por uma força maior, como a morte, isso será interrompido. O bom da vida ser uma estação de despedidas é que sabemos que situações de dor são passageiras e as alegrias sempre darão espaço para outras alegrias.
A princípio pode parecer melancólico definir a vida como uma estação de despedidas, mas pare e reflita mais um pouco e você se dará conta de como temos sorte por nada na vida ser eterno e estarmos o tempo todo aptos para reescrevermos nossas histórias e experienciarmos novos sentimentos.
Kate Miller.
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O Diário De Bordo De Kate Miller
Novela JuvenilDo mesmo universo de Lágrimas de Ferro "Seja forte, a vida exige isso de você!" Kathleen Miller, é uma garota que ainda está passando pelas aprovações da vida. Mas de um modo um tanto diferente. Pois, com apenas 20 anos, sempre aparentou ser uma pes...