Capítulo XI

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Me vi ali sem opções. A Sra. Ewa, apesar de muito prestativa, não tinha disposição para carregar Khaleb adormecido até sua cama. Eu, por outro lado, estava nos últimos meses da gravidez e não poderia arriscar, mesmo que Khal fosse leve. Connor ninava o filho que estava um pouco doente naquele dia e costumava a ficar manhoso. Já sua esposa, Olívia, tentava levar Isla para o quarto, a mulher embriagada e sem vontade alguma de obedecer. Hassan cuidava de Laurie, levando-a no colo com certa dificuldade, sem vacilar em nenhum momento.

Assim que avistei a silhueta de Zayn a percorrer a cozinha, aparentemente em busca de um copo de água para se hidratar depois da nossa intensa discussão de minutos atrás, obriguei-me a chamá-lo. Seu nome saia da minha boca com um gosto amargo.

— Se importaria de chamar o Connor para me ajudar por um instante? — Perguntei..

— Ele está ocupado — Zayn pareceu nervoso com o que diria a seguir — Mas eu posso, hum... Ajudar, se quiser.

Sem reação, lhe encarei por breves segundos, atônita.

— Certo, claro. Tudo bem — Concordei, apontando para o corpo esticado de Khaleb no sofá.

Quando Malik colocou seu braço por baixo das costas de Khaleb, Hassan apareceu ao seu lado, desgostoso com sua atitude.

— Obrigado, mas eu consigo levar meu irmão sozinho — Decidido, informou.

Hassan até tentou, mas, diferente de Laurie, Khaleb tendia a ser maior, manhoso e mais difícil de carregar, pois, querendo ou não, eram praticamente três anos de crescimento que separavam as duas crianças.

Zayn não evitou de sorrir moderadamente da fúria de Hassan. Logo já estava tomando, com cautela, Khaleb nos braços, cuidando sempre para não acordá-lo. O garoto no seu colo se agarrou ao seu dorso e passou a sorrir.

— Você é tão forte... — Balbuciava Khal em divertimento — Quem é você? Hum... acha que meu pai é forte desse jeito? Eu acho que ele é!

— Já estamos chegando, amigão — Malik buscou fugir do assunto, desconfortável com as palavras do meu filho.

— Eu não quero ter aula amanhã — Bufando, confessou Khaleb — Aquelas letras são tão difíceis! Nunca consigo terminar de escrever meu nome. Eu digo à mamãe: "mamãe, eu preciso de ajuda!" Mas ela não tem tempo! — Ele era a típica pessoa a qual falava coisas sem sentido quando estava com sono — Queria que meu pai não tivesse ido embora... talvez ele pudesse me ajudar a entender aquilo. Ninguém tem paciência ou tempo!

Continuei caminhando em silêncio atrás dele, seguindo seus passos que nos levariam a um refúgio das lamúrias do pequeno. Zayn repousou ele em uma das três camas de solteiro próximas a uma maior e se ajoelhou ao seu lado.

— Ele vai te ajudar. E ter paciência, também. Eu prometo — Sussurrou analisando minuciosamente o rosto de Khaleb — Seu pai vai ser mais presente...

O menino, por outro lado, já não o ouvia há muito, dado o fato de que se encontrava de olhos fechados e agarrado a um urso peludo que Malik colocara em suas mãos e que eu nem sabia de onde tirara. Também pegou a corrente de um colar do seu pescoço e encaixou o anel presente no menor dos seus dedos, colocando assim o cordão, agora com um novo pingente, no pescoço de Khal. Aquele era o anel que dei-lhe uma vez, lembrei, o anel que pensei estar dando a quem amava-me.

— Esse urso é meu. Quando eu era criança, com a sua idade, meu pai me presenteou com ele para que meus pesadelos parassem — Explicou, mesmo que para o vento — Já o anel me fez dormir melhor quando mais velho. Alguém importante me deu certa vez. Pode ficar com eles. São seus. Talvez te ajudem a escrever seu nome algum dia.

— Obrigada, éhh... quem é você, mesmo? — Khaleb murmurou para nossa surpresa, indicando que prestava atenção, mesmo que seus olhos não estivessem abertos.

Malik hesitou.

— Zayn.

— Eu sou o Khal — Apresentou-se — Não brigue mais com a minha mãe como fez ontem, por favor, Zayn. Você a deixou triste e eu não gostei disso.

Ele assentiu antes de dar as costas, assustar-se com a presença de Hassan a observá-lo atento e partir inquieto pela escuridão do corredor.

[...]

Abri os olhos sem pressa e percebi que dormi tão rápido que mal pensei em Emma, no meu pai ou no resto da minha família. Mas, agora, à luz do dia, me recordava bem de como fiz de suas vidas a eternidade infeliz. Calcei as pantufas e olhei para o quarto, as malas todas espalhadas e Hassan, Khaleb e Laurie dormindo feito anjos. Havia uma cama para cada, de modo que não vieram dormir comigo na maior delas. Prendi meu cabelo em um rabo de cavalo no alto da cabeça e procurei o banheiro pela enorme casa. Desci e subi as escadas, entrando em mais corredores até finalmente encontrá-lo. A Sra. Lewandowski me disse que eu poderia ir aonde quisesse, sem me incomodar com nada. Foi o que fiz depois de tomar um banho e escovar os dentes. Caminhei por toda a residência, conhecendo um pouco mais do aconchego azul claro de madeira.

— Finalmente me encontrou?! — Ewa brincou no instante em que atingi a área da cozinha. Ela tomava seu café da manhã e olhava pela janela os cavalos no estábulo dormindo serenos e o galinheiro agitado. Um ar gelado, digno de uma manhã no campo, me invadiu. Era como uma brisa doce — Acordou cedo, querida.

— Preciso trabalhar, senhora Lewandowski — Expliquei, sorrindo — Costumo acordar esse horário todos os dias.

— Então sente-se e coma comigo, não tenho muita companhia pela manhã — Ela pediu apertando minha mão por cima da mesa — Fico tão feliz de acordar e saber que meus netos e você estão dormindo sob o mesmo teto que eu.

— Eu também, senhora Ewa.

Me servi de um pouco de chá e as tradicionais panquecas da Sra. Lewandowski. Lembro-me das vezes, à seis anos atrás, quando as comíamos ao dormir na sua casa em Bradford. Foram poucas as festas ou ocasiões como estas que participei, porém, foram as mais divertidas da minha vida, nada comparadas às da França.

— Bom dia, Ewa — Zayn surgiu do andar de cima. No corpo, usava uma camisa de mangas compridas branca de botões e calça jeans preta; um casaco escuro em uma das mãos e uma bolsa tipo a que carteiros usam com a alça atravessada no ombro. Ele me encarou brevemente antes de dizer baixo: — Bom dia.

— Já está indo? Coma alguma coisa, pelo menos — Ewa o repreendeu.

— Estou quase atrasado — Ele explicou, seu braço se esticando até o meio da mesa de onde pegou um potinho de iogurte, jogando-o para cima uma vez e o pegando novamente, como um ioiô. Zayn andou até a cadeira da Sra. Lewandowski e beijou sua testa — Ewa, a Isla está com dor de cabeça e ficará na cama provavelmente o dia todo. Pode cuidar do Shade para mim, por favor? Ah, e avise ao Hassan que iremos passear pela tarde.

Mas não iam mesmo.

— Claro. Tchau, querido. Te amo! — Gritou ao vê-lo se afastando para fora da residência — Estou tão orgulhosa do que ele se tornou!

— Ele trabalha? — Perguntei apenas por educação. Eu não tinha a mínima vontade de saber mais sobre sua nova vida.

— Sim! Ele é professor de literatura da escola aqui perto — Falou ela em tamanha empolgação — Nos mudamos para cá porque ele poderia ter uma vida mais tranquila longe de quem o conhecia e das lembranças. Zayn me disse certa vez que fez a promessa a alguém de que voltaria a lecionar quando tivesse oportunidade. Fico pensando em como essa pessoa especial para ele deve estar sentindo-se orgulhosa!

Era eu. Eu era essa pessoa. Uma vez Malik prometeu-me que voltaria a dar aulas um dia. Já que naquele dia ele havia acabado de sair de uma ressaca, não confiei que realmente cumpriria aquilo, mas cumpriu. Esse pensamento bateu contra meus pulmões que erraram o compasso e deixaram-me assim, com pouco ar.

Stockholm Syndrome? |2°temp.| [Z.M]Where stories live. Discover now