Talvez ainda fosse muito tarde da noite quando avistei, da cadeira onde estava sentada averiguando novos contratos das empresas Moreau e balançando Pierre no carrinho com o pé, a silhueta de Zayn encostado no batente da porta, encarando-me de braços cruzados com um pijama para noites quentes. Olhei para onde meu avô estava e aliviei-me por ele ainda dormir tranquilo. O mais importante era que seu peito subia e descia em ritmo comum.
— Era para você estar dormindo — Comunicou Zayn com a voz baixa. Semicerrei os olhos, mesmo que ele não pudesse ver devido a todas as luzes da casa estarem apagadas.
— E você também — Rebati fechando a tela do computador e deixando-o ao meu lado.
— Que eu me lembre, você estava proibida de trabalhar — Continuou, ocupando uma poltrona próxima ao meu avô.
— Que eu me lembre, você trabalha amanhã — Imitei-o, segurando o riso — Estou cansada de não ter o que fazer.
— E por isso resolveu vigiar seu avô as quatro da manhã? — Presumiu Zayn deitando sua cabeça no apoio de trás do assento onde estava — Ele não parece muito bem para fugir, não se preocupe.
— Ah, você não o conhece, Malik. Ele é terrível.
— Igual a sua versão criança maldosa? — Provocou parecendo divertir-se com isso.
— Cale a boca! — Exclamei sem conseguir conter uma risada baixa — Não me orgulho dela. Eu era horrível, especialmente com a minha irmã mais nova...
Ele voltou a encarar-me, dessa vez sério.
— Sabe, por muitos anos eu me culpei por algo que não consegui impedir, algo que eu nem conseguiria, para falar a verdade — Malik disse — O que quero dizer é que não foi sua culpa o que houve com a sua irmã. As coisas não poderiam ter sido diferentes, mesmo se você quisesse. Mas isso não quer dizer que não doa. Pelo contrário, dói e muito. Pelo menos foi isso que uma certa pessoa me disse uma vez.
Ofereci a ele um sorriso fraco, quase apagado pela tristeza que compartilhavámos naquele instante. No meio do silêncio que instaurou-se, não consegui conter um sorriso bobo.
— Do que você está rindo, sua maluca? — Perguntou ele contagiando-se pelo meu divertimento sem ao menos saber os motivos de tal.
— É que... a senhora Angelle, uma empregada da casa do meu pai há muito tempo — Comecei, olhando para o nada — Contava para mim que meus pais costumavam ter uma espécie de fim de noite sempre planejado. Eles conversavam sobre como tinha sido o dia de cada um, contavam seus novos sonhos e aí dançavam pela casa durante muito tempo repetindo a mesma música sempre. E então meu pai enchia minha mãe de beijos e dizia muitos "eu te amo". É idiota, eu sei, mas fico pensando se algum dia vou ser como eles. Se vou aturar dançar com alguém por tanto tempo ou então ter minha própria música e nunca enjoar dela.
Após processar o que eu disse, Zayn se levantou e estendeu a mão para mim, sorrindo.
— O que você está fazendo, Malik? — Indaguei encolhendo-me na cadeira.
— Te chamando para uma dança, não é óbvio? — Fiz que não muitas vezes, negando a prestar-me aquilo — Vamos, temos que seguir os passos. Já conversamos e agora temos que dançar. Lembra que prometemos ser melhores amigos? Enquanto você não acha um alguém como esse, eu posso ser o seu alguém provisório. Só por agora. Vamos!
Cedendo relutante, aceitei sua mão, segurando-a firme.
— Você é louco.
— E você não é muito diferente disso.
Ele então procurou dentro de uma gaveta a direita fones de ouvido, colocando um na minha orelha e outro na dele, aproximando seu corpo do meu para que o fio não puxasse um dos lados para baixo. Ao conectar no seu celular e decidir a música, arregalei os olhos, surpresa com sua escolha.
— Dandelions? Jura?!
— Eu tenho que assumir, ela é boa — Respondeu posicionando uma de suas mãos na minha cintura e a outra segurando a minha. Zayn cantarolava a letra em sussurros.
— Da última vez que ouvimos, você odiava essa música — Murmurei, fazendo-o rir.
Seus dedos, quentes e ásperos pelo trabalho na fazenda, soltavam pequenas faíscas eletrizantes que espalhavam-se pelo meu corpo de modo ágil, causando arrepios.
— Essa música é rápida demais para dançar assim, Malik — Protestei, confusa para encontrar os passos certos.
— Depende do jeito — Ponderou ele movimentando nossos pés num estranho ritmo que combinava exatamente com a música, me fazendo sorrir.
— Vamos acabar acordando a casa inteira — Falei.
— Se você continuar gritando desse jeito, sim, nós vamos mesmo — Brincou ele com o tom elevado da minha voz. Que culpa tinha eu se o volume do fone estava muito alto?!
Assim que a música acabou, Zayn a colocou de novo, de novo e de novo. Devíamos ter escutado a mesma música umas dez vezes antes de cansarmos por completo.
— Como seus pais aguentavam isso? — Ele quis saber, visivelmente curioso.
— Sinceramente? Não faço ideia! Só sei que estou finalmente cansada. Boa noite, Malik.
No momento em que eu ia pegar o carrinho onde Pierre dormia e o notebook que estava em cima da cadeira, Malik negou com a cabeça, me puxando pelas mãos até bem perto dele.
— Não seguimos todos os passos ainda, Louise.
— Esses passos são idiotas. Nem sei se meu pai amava tanto assim minha mãe.
— Não somos eles — Ele disse segurando meu rosto com as suas mãos — E precisamos seguir tudo, como você sempre quis — Zayn então beijou meu rosto por inteiro. Minha testa, bochechas, nariz, queixo e o canto da minha boca, provocando-me — Qual era a última parte, mesmo? — Em seguida cochichou: — Ah, sim. Eu te amo, te amo. Te amo... te amo... te amo.
Por um impulso enlouquecido, beijei-o. Aquilo era loucura, mas não pude evitar. Seus lábios tinham o gosto da saudade que por muito guardei em um canto afastado de tudo. Todo aquele momento em uma mistura com o beijo me relembrou o que vivemos e o porquê de eu estar sempre tão nervosa perto dele. Meu coração costuma trair-me e dessa vez não foi diferente.
— Sabe... — Disse ele antes de beijar-me de modo rápido enquanto sorria. Nunca esqueci de como seu sorriso costumava brilhar em meio a escuridão — Estou começando a gostar disso. Talvez pudéssemos seguir esses passos mais vezes, tipo todos os dias...
— Não sei se quero — Brinquei — Principalmente a última parte...
Ele revirou os olhos e puxou-me pela cintura, unindo nossos corpos e beijando-me outra vez.
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Stockholm Syndrome? |2°temp.| [Z.M]
Fanfiction•Livro 2 da duologia "Stockholm Syndrome?"• Louise tem um desfecho trágico para o que achava ser sua grande história de amor, e o que resta à ela agora é recolher os cacos do seu coração despedaçado e seguir em frente. Após colocar em jogo sua felic...