Capítulo 5

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1 mês antes do vôo...

Tinha acordado atrasada para aula de hoje.
Não gostava de faltar mas seriam horas chatas com professores ranzinzas então não me esforço para chegar a tempo da segunda aula pelo menos. Eu poderia dormir por uma semana inteira. Não, talvez um mês. Odiava rotinas e a minha estava me consumindo, todas aquelas aulas na faculdade que pareciam durar uma eternidade e as sessões de fotos entediantes começavam a me afetar mais do que eu queria.

Mas eu tinha que ser firme, nós tínhamos um plano. William estava cumprindo a parte dele e eu a minha. Mesmo que ele gostasse mais do que fazia, diferente de mim. Inteligente e bondoso como sempre foi não havia me surpreendido quando ele decidira por cursar medicina. Sabia que seu desejo de ajudar os outros falaria mais alto. Já eu não sentia o mesmo por administração. Não era um desejo meu mas a opção mais fácil que eu tinha. "Um futuro seguro" era o que William dizia. Depois do desfile - quando minha mãe havia voltado para o mundo da moda - sua marca só cresceu a cada ano. Hoje tinha uma grande empresa de moda e sua linha era aclamada pelas mais importantes revistas do mundo fashion, se juntando a grandes marcas ícones que existiam.

Com isso, minha mãe precisaria de alguém para administrar a empresa junto a ela. Aprender tudo que podia e manter o nome da família em destaque. Honrar tudo que minha mãe construiu. Mas não era isso que eu sentia que deveria fazer. Queria algo que eu sentisse ser o meu sonho. Mesmo que minha mãe nunca tenha me forçado ou pedido para que eu assumisse a empresa da família - talvez por meu irmão mais velho já trabalhar lá ou por me conhecer muito - eu sorria convincente para ela e dizia que eu também queria fazer parte disso, sempre que questionava a minha escolha de curso. Pois era parte do plano que William e eu fizemos desde crianças. Ganhar nosso dinheiro e viajar pelo mundo. E ele não via o plano dando certo quando eu insinuava que poderia me tornar escritora. Dizia que era incerto e poderia levar anos até ser reconhecida.
E ele estava certo.
Mesmo que me custasse muita coisa.
Mas tudo bem, contanto que estivesse com William, eu seria feliz.

Desço para a cozinha animada com meu dia livre, no fone tocava minha música favorita enquanto eu dançava no ritmo dela e cantarolava. Minha mãe já havia saído para trabalhar e meu irmão não estava assaltando nossa geladeira - já que mora sozinho e ser terrível na cozinha - então seria apenas eu hoje. Faço meu café da manhã sem pressa e deito no sofá passeando por canais sem assistir nada. Penso em mandar mensagem para o William e dividir meu bom humor com ele mas acabo tendo uma ideia melhor. Eu poderia visita-lo.

Estava com saudades dele, fazia algumas semanas que não nos víamos. Ele estava estudando muito para uma prova e vivia na biblioteca da faculdade. Não saia do seu dormitório a dias pelo que tinha me dito e como nossos horários não se alinhavam estávamos a semanas sem nos ver.
Minha faculdade era perto de casa e não tinha necessidade de morar no campus mas a de William não. Sua faculdade ficava algumas horas de onde morávamos e ele havia se mudado para o dormitório de lá.

Não foi fácil me acostumar com a ausência dele ao meu lado na sala, como costumávamos ficar no ensino médio. Ou da forma como ele fugia comigo das aulas de educação física para invadirmos a quadra de tênis da escola. Passávamos horas jogando até que o sinal tocasse. Ele era minha companhia desde que tinha caído da bicicleta em frente a minha casa e não nos separamos desde então. Nunca fui de ter muitos amigos e depois dele não precisava de mais ninguém. William era muito importante para mim.

Mas desde que nos tornamos namorados sentia que alguma coisa estava diferente. De início foi estranho, tenho que confessar. Afinal era o Will, o meu melhor amigo e aquele que insistia em me irritar junto com meu irmão.
Há mais ou menos um mês, enquanto eu voltava para casa chateada por comentários maldosos que Jessica Palmer tinha feito em aula sobre meu trabalho sobre poemas, Will estava a minutos falando como ela era invejosa e como meu poema estava bem escrito.
Will não entendia de poemas.

Ao chegarmos em frente a minha casa ele segurou minha mão e disse que sempre me defenderia. Afastou uma mecha do meu cabelo no meu rosto e me puxou para um abraço. Eu sabia que sempre poderia contar com ele. Não entendia sobre amor mas tinha quase certeza que o que sentia por ele era isso. Namorar com ele seria simples, afinal era meu melhor amigo. "O que poderia dar errado?" penso comigo quando ele se afasta e me encara aproximando seu rosto. Will era um garoto lindo, não poderia negar. Seus cabelos negros
tomaram forma e agora eram mais brilhantes e também cacheados. Seu rosto estava cada vez mais próximo até que nossas bocas se encostam. Foi um beijo tímido e rápido, mas no final dele veio o pedido de namoro.
As palavras 'fácil' e 'rápido' poderiam definir nosso início de namoro.

Depois desse dia tudo ficou confuso. Ele tinha recebido a carta da faculdade e correu para arrumar tudo e se mudar para o campus. Vi sua mãe vender algumas coisas com urgência para poder arcar com os custos da mudança e me despedi dele abraçada a ela. Logo depois eu também entrei na faculdade e durante esse tempo nos vimos duas vezes. Eu tinha dito para mim mesma que esse fato era o responsável pelas coisas estarem estranhas entre nós. Nos víamos todo dia e agora com a ausência dele tudo era diferente. Só podia ser. Mas hoje ficaríamos juntos. Pelo menos por algumas horas. Precisava contar a ele a última besteira que meu irmão tinha feito, contar sobre a faculdade, muita coisa tinha acontecido enquanto ele estava longe.

Levanto e vou até meu quarto para me arrumar. Escolho um vestido solto que ficava na altura do joelho e calço meu tênis, me arrumo rapidamente e logo já estou na moto do meu irmão. Seria o meio mais rápido de ir e voltar. Sigo pela estrada e faço apenas uma hora e meia, chego no estacionamento sem muitos problemas e deixo a moto em uma vaga qualquer. Prendo o capacete no braço e ando pelo campus procurando alguma placa que indicasse a biblioteca. Will dizia que sempre estava lá na parte da manhã. Ele gostava de estudar depois do café.

Me perco com tantos corredores, não tinha achado algo que me levasse a biblioteca e penso se teria que estragar a surpresa para achá-lo. Um homem que aparentava ter 40 anos passa por mim e pela idade imagino que seja algum professor. Me viro e ando apressada atrás dele para perguntar onde eu deveria ir. Cutuco seu ombro e ele me olha com cara de poucos amigos, mas me aponta o caminho. Agradeço sem graça e vou para a direita. No final do corredor encontro a placa.
Finalmente.

Passo pela porta e entro no que era uma linda biblioteca. Já tinha notado as paredes com estátuas que tinham nos corredores quando vim pela primeira vez mas não conhecia a biblioteca. Agora entendo o porquê Will passava tanto tempo aqui. Tento achá-lo com o olhar ficando na ponta dos pés mas não encontro. Me dirijo ao balcão e pergunto se ele estava por ali. A senhora com o humor um pouco melhor que o do professor diz que ele passou pelo balcão tinha pouco tempo e que perguntou sobre um livro, então deveria estar na fileira M.
Perfeito.

Pergunto se poderia ir até lá e mesmo um pouco relutante ela me deixa passar. Acho que ela só queria se livrar de mim e das minha perguntas. Agradeço sorrindo e vou procurar a fileira M. Ando pelas estantes em ordem alfabética e chegando perto ouço a voz dele. Era permitido conversar na biblioteca? Sigo desconfiada e entro no corredor ao lado de onde estava. Ele ri alto e alguns alunos sentados ali perto reclamam pedindo silêncio. A risada dele fica abafada com uma mão que tampa sua boca. Mas quem seria?
Tento enxergar através dos livros que atrapalhavam minha visão, tiro alguns da minha frente e seguro comigo enquanto focava meus olhos em Will que sorria como a muito tempo eu não via. Ele estava de frente para mim e parecia que não podia me ver ali, seu olhar estava direcionado para uma menina que tinha a mesma altura que a dele. Mantinha seus olhos nela como se seus olhares se sustentassem um no outro. Como nunca aconteceu comigo. Ou com a gente.

"William estava... apaixonado?" Não posso deixar de pensar e o choque me faz derrubar os livros que eu vinha segurando. Droga.

- Ellen? O que...?

Ele agora vira seu rosto em minha direção, no olhar que antes parecia brilhar - assim como seu sorriso - agora dá lugar para surpresa.
E culpa?

Constelações AustraisOnde histórias criam vida. Descubra agora