Um Novo Jardim - Parte três

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Já perdera a conta às canecas que tinha devorado, ansioso por se entorpecer, novamente, nos efeitos vorazes da bebida, rumo ao esquecimento deleitante que o iludia

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Já perdera a conta às canecas que tinha devorado, ansioso por se entorpecer, novamente, nos efeitos vorazes da bebida, rumo ao esquecimento deleitante que o iludia. Como já imaginava, durante toda a tarde não viu vestígios de Bana, que deveria andar à sua procura, espreitando em todas as tascas mais conhecidas da região. Tinha escolhido aquela por se localizar num espaço mais negro da cidade, onde as pessoas de bem costumavam evitar, sendo uma zona frequentada pelo estrato mais baixo da sociedade, entre os quais bandidos e assassinos. Sabia que deveria temer um lugar daqueles, contudo, sentia-se bem, como um peixe dentro de água, um animal no seu habitat natural, por mais inatural que aquilo fosse. Quase não havia iluminação presente, transformando o espaço num ambiente negro e taciturno, muito favorável aos crimes que deviam ocorrer, naqueles quatro cantos olvidados pelo mundo. A cerveja que descia pela sua goela, exaltava as suas papilas gustativas, num festim de sensações que não conseguiria descrever, mesmo que tentasse. Ainda que não fosse, propriamente, boa, servia perfeitamente para si, um usuário habitual dos seus predicados.

Os seus pensamentos ébrios, cada vez mais obscurecidos pelo efeito do álcool, ruminavam à volta das palavras de sua mãe, na noite anterior, pensando e repensando tudo o que tinha ouvido, numa tentativa, inglória, de as entender. Cada dia findado, conseguia sentir mais que não era filho deles, como um aviso nunca proferido no fundo da sua consciência sagaz. Se não sou filho deles, de quem sou? Indagou, observando o seu reflexo fosco, esbatido numa panela prateada à sua frente, do outro lado do balcão. Os seus cabelos cinzentos, sem qualquer vivacidade, gozavam-no sem disfarçar, marcando-o como um pária em qualquer sítio que visitasse, uma aberração sem nação.

Outra! Gritou, manuseando a caneca vazia com a mestria de um espadachim veterano.

Sua Alteza. Começou, a medo, o empregado. Já bebeu demais. Não seria melhor voltar para o Castelo? Pelo que sei, hoje é o banquete do seu irmão, não é?

O meu amigo, como sempre, está certíssimo. Afirmou, tropeçando nas palavras. No entanto, ainda tenho sede, e um homem com sede não é uma boa companhia em lugar algum. Argumentou, pousando a caneca à frente do empregado.

Posso ser sincero consigo, Príncipe? Questionou, secando as mãos num pano velho e esfiapado, preso à sua cintura.

Aqui, não sou Príncipe, sou um mero cliente. Assegurou, piscando-lhe o olho. Atira à vontade!

Por mais honrado que me sinta com a sua presença aqui, preferia que viesse menos vezes. Sugeriu, com uma expressão temerosa. Mesmo com o mau aspecto que devia emanar, ainda pertencia à família real, o que inibia a maioria das pessoas à sua volta.

Porquê? Indagou, escandalizado. Não trago tostões como todos os que aqui bebem?

Claro que sim. É um excelente freguês, no entanto, a minha clientela habitual evita o local quando aqui se encontra. Admitiu, olhando em redor.

O Nascer da Rosa BrancaOnde histórias criam vida. Descubra agora