Hasu No Hana

Nijyuu Go

Hikaru acordou, piscando os olhos lentamente enquanto tentava se manter acordado. Ele despertou imediatamente ao perceber que estava em um lugar muito diferente da casa em que ele e os dois youkai estavam ocupando antes.

Quando se sentou, percebeu que estava em um quarto um tanto quanto familiar. O fusuma[1] que sua própria mãe tinha pintado para ele e seu irmão tinha um erro, fazendo o dragão ter uma cara engraçada. Eles brincavam que o dragão era vesgo e por isso tinha olhos tão desiguais. Era uma daquelas lembranças alegres que se tornavam dolorosas de lembrar, pois nunca ocorreriam novamente.

E aquele fusuma estava bem ali, diante de seus olhos.

Hikaru pôde ver pelo canto dos olhos uma movimentação e sua mão imediatamente se moveu para pegar sua ko-wakizashi escondida debaixo do travesseiro, mas quão grande foi sua surpresa ao perceber que estava desarmado. Ele olhou na direção da movimentação e seus olhos se arregalaram quando a pessoa deitada em seu próprio futon se sentou, parecendo ter acabado de acordar também. Hikaru sentia como se estivesse vendo um fantasma e ele normalmente não sentia que estava olhando para um, mesmo que um yurei estivesse em sua frente. Era como se os youkai e yurei fossem coisas normais para ele, mais normais do que falar com humanos.

Minoru bocejou e coçou os olhos, ele sentiu que estava sendo observado e olhou diretamente para Hikaru, arqueando uma sobrancelha ao notar o semblante quase que perturbado de seu irmão mais novo.

— O que foi, Hikaru...? Teve um pesadelo?

Ele não conseguiu reagir ou pensar em como responder. Aquilo era um sonho?

Minoru adquiriu uma face levemente preocupada ao ver que ele não respondia suas perguntas, ele se aproximou do mais novo e colocou uma mão em sua testa.

— Sua temperatura está normal. Aconteceu alguma coisa? Você precisa me dizer, se não eu não posso te ajudar.

O toque em sua testa foi tão real que Hikaru sentiu como se tivesse sido picado por um inseto, ele imediatamente afastou a mão do mais alto com um tapa de forma instintiva. Seu rosto mostrava que ele estava ainda mais aterrorizado do que antes.

Minoru retraiu a mão, seu rosto adquiriu uma feição confusa ao mesmo tempo que culpada.

— Você... Está com medo de mim...? — Ele desviou o olhar, suspirando. — Desculpe, eu peguei pesado demais com você ontem?

Hikaru abriu e fechou a boca, tentando formular uma palavra. No fim, ele decidiu fugir, saindo correndo para fora do quarto. Ele pôde escutar o chamado de Minoru para que retornasse, mas ele se fez de surdo e continuou correndo, seus pensamentos correndo a mil. Aquilo tudo devia ser apenas um sonho, um sonho cruel, mas ainda assim um sonho.

Minoru estava morto. Era impossível que aquele fosse seu irmão mais velho.

Ele parou em um lago ornamental que ficava nos fundos da casa, onde carpas nadavam livremente, até aquele detalhe foi acrescentado na ilusão. Quando olhou para seu reflexo na água, a única coisa que viu foi uma criança. Se não fosse pelos olhos claros e o sinal de beleza em sua bochecha direita, Hikaru não teria reconhecido a si mesmo. Ele colocou suas mãos na água, espantando as carpas curiosas que tinham se aproximado, e se surpreendeu quando conseguiu sentir o líquido frio lambendo sua pele.

Qual era o significado daquilo? Nenhuma ilusão conseguia ser assim tão perfeita ao ponto de alguém conseguir sentir sensações físicas, então como aquilo tudo podia ser tão real?

— Ah, eu sabia que você estaria aqui.

Hikaru se virou para a pessoa que falou em suas costas e, mesmo sabendo quem era apenas pela voz, ainda assim, ele não conseguiu acreditar na visão que estava diante de seus olhos.