Capítulo Dois

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Enrolei o macarrão no meu garfo e olhei para a minha irmã, encontrando seus olhos exatamente em mim.

– Luke, me dói bastante te ver desse jeito. – Ela disse, apoiando os cotovelos na mesa.

Não consegui dizer nada, continuei brincando com meu almoço. Era constrangedor, eu estava envergonhado e principalmente me sentindo um lixo. Por estar contagiando os outros com minha melancolia, e aquilo precisava mudar. Minha forma de protestar foi comendo a primeira garfada. Já faziam 15 minutos que eu só brincava com a comida.

– Nossa, tá gelado.
– Claro! Você demora um ano remexendo isso aí, e quer que esteja quente? – Julia falou, irônica. Aquela era sua principal característica, e, não vou mentir, irrita muito.
– Não quero mais comer isso – olhei para minha irmã e a vi revirar os olhos. Levantou-se da mesa e pegou seu prato vazio.

Ela é exatamente como minha mãe, não tem um pingo de paciência. Eu poderia dizer que era só comigo, por causa do jeito que eu estava, mas não, ela é assim com todo mundo. Alguns irmãos não se parecem na aparência, mas são iguais no jeito de agir. Nós dois somos o contrário disso.

Muitas vezes no colégio, quando haviam brigas no refeitório, Lia estava no meio. Eram sempre por coisas bobas, mas que, juntas ao temperamento nada calmo dela, resultavam numa explosão. Eu ia no centro da confusão, e a controlava.

Perdi as contas de quantas vezes já me disseram: "Lucas, se você não fosse tão parecido com a Julia, eu diria que você foi adotado".

De longe eu sou o mais sentimental da família, e isso já foi motivo de piada muitas vezes. Minha mãe não dá a mínima pra ninguém que não seja a Julia e eu - nem pro meu pai, que nos deixou quando tinha 12 anos, nem para nossos avós, que também não tão nem aí pra ela. Minha irmã é do jeito que é, e o meu irmão mais velho mora em Ohio por quase 4 anos, e nunca sequer mandou uma carta para nós. Acho que todo o sentimentalismo que poderia ter na minha família parou em mim, e isso é um saco.

– Me dá logo esse seu prato, Lucas – Julia disse, passando a esponja em um dos pratos da pia.

Me levantei e joguei fora o que sobrou. Era quase toda a comida que coloquei no meu prato. Pus o prato na pia e comecei a enxugar os que ela já havia lavado. Sabe aquele silêncio constrangedor, que parece que suga todo o oxigênio do recinto? Pois então, sou eu que sempre quebro ele, e daquela vez não foi diferente.

– Liaaaaa! –Ela me olhou de relance, e revirou os olhos de novo.
– Oi, Luke.
– Liga o rádio.
– Olhe a situação das minhas mãos, e olhe a situação das suas – ela levantou suas duas mãos, cobertas de sabão. Dei de ombros e liguei o rádio, estava terminando de tocar uma musica que não conhecíamos.
– O que você acha de depois de irmos à praia hoje, ver um filme? – Sugeri, e ela me olhou com espanto.
– Nossa, você é o mesmo Lucas de ontem? Que simplesmente me enxotou do quarto quando eu te chamei pra tomar sorvete? – Ironia, maldita ironia.
– Você quer ou nã... – Fui interrompido com sua mão na minha boca, ela olhou pro rádio e levantou o dedo indicador. Imediatamente comecei a prestar atenção na voz masculina que saía do rádio.

"Boa tarde, surfistas de Santa Bárbara, Califórnia! Eu sou o Brad Phillips."

"Vencedor de 4 torneios mundiais de surf, nascido e criado nas praias de Tampa Bay, Flórida!" — Uma voz feminina e jovial o interrompeu, mas logo em seguida ele continuou:

"Amanhã é a ultima chance de participar do campeonato de Surf Sunset California, patrocinado por mim e por minha comissão. O vencedor ganha dez pranchas da minha marca exclusiva, autografadas por mim, e 10 mil dólares. De 10h da manhã, serão as últimas avaliações em Summerland Beach, com apenas 3 vagas. Não perca essa chance!"

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