Carta para avó

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—, 4 de julho de 2021

Oi, vózinha. Essa carta a ti nunca lerei. Nem escreverei num papel e enviarei por correio. Nem você nunca saberá sobre. Mas tem algumas perguntas que realmente preciso te fazer, apesar de não poder.

Hoje, estava na minha sala de estudos quando comecei a vagar pela minha mente. Lembrei de frases como a manipulação dos jovens atuais pela mídia para serem LGBTQI+s. Ou críticas a "normalização" desses "atos pecaminosos".

Dói, sabe? Dói pensar sobre isso. Choro para escrever isso. Incomoda ouvir tanto as pessoas falarem dessa normalização, que eu mesma mal vejo.
Claro, encontro ao pesquisar bem a fundo. Você não deve estar entendendo, vou te dizer o que até hoje vi.

Quando era pequena, tive um "namoradinho". Você deve se lembrar dele. Trocávamos presentes e coisas do tipo. Nosso "romance" terminou quando mudei de escola.

Depois disso, fiquei o resto da minha infância sem pensar muito sobre. Lá pelos 12, minhas primas começam a falar sobre garotos e beijar, eu raramente comentava.

Mais ou menos nessa época, o filtro de Orgulho LGBT explodiu pelo Facebook. Eu era totalmente contra aquilo! Era uma afronta a Deus! Então eu peguei o filtro e coloquei efeito preto e branco por cima, para mostrar esse luto.

Aos 15, meu mundo parou por segundos quando vi, pela primeira vez, minha atual ex-namorada. Ficamos por 5 meses, 3 deles namorando. Era mágico, vó! Era incrível! Até hoje fico feliz ao lembrar.

Ao mesmo tempo que vivi coisas maravilhosas, fiquei todo aquele tempo carregando um medo absurdo. Uma incerteza que me deixava mal. Que nos deixava mal, porque a Bê sofria com essa minha insegurança.

Quando terminamos, estava arrasada e precisava de colo. Chamei minha mãe para conversar, perdi parte de minha liberdade e ganhei bastante ansiedade.
Mais meses confusa, até que comecei a me encontrar. Era difícil, me abraçava nos poucos lgbtqis que conhecia, em alguns membros da família que me apoiaram e meus amigos.

Você me abraçou um dia, vó. Você não imagina como foi importante. Naquela hora, quis despejar e falar tudo, mas você me censurou. Ah, vó... Queria tanto que você quisesse me ouvir!

Na metade de 2018, me assumi. Mas só um ano depois vi um beijo lésbico em algo que não é censurado, hora de aventura.

Hora de aventura e minhas horas de alegria. Como me assumir me ajudou, vó! Como eu me amo e amo ser quem sou! Eu sou tão feliz pela minha sexualidade, por me apaixonar, por sorrir! Tão tão feliz!

Ah, mas tem hora que dói. Dói bastante. Mas não se preocupe, sempre que chorava eu evitava de fazer barulho. Toda vez que ficava triste, sorria na frente dos outros. Aprendi a segurar o que sinto. Sou bem experiente em viver no armário já.

Vó, você já se apaixonou? E por uma mulher? Você conhece alguém que foi feliz sendo gay? Eu sei que serei feliz, mas você consegue acreditar nisso?

Aí, vózinha. Queria outro daqueles seus abraços.
De sua neta favorita, Manu.

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