Estranha porcelana

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Oi, estranho
Sim, você que me vê vomitar
Olhe, olhe o brilho desse vaso
Esse vaso de descarga
Esse vaso sujo de um bar qualquer
Abraço-o
Cavalgo, neblina da ânsia, da droga, do tédio
Afogo-me no meu nojo

Olha, estranho
Eu sei que você não precisava nem queria estar aqui
Que deve estar me ouvindo porque...
Porque quer um lugar no céu
Porque seu dia estava chato
Porque quer história para contar para os outros
Você que quer ser útil uma vez na semana
Pode ir embora

Mas antes
Antes olhe nos meus olhos
Por cima dessas olheiras
Olhe a luta
Olhe o cansaço
Olhe o sucesso perdido

Nesse vômito
Olhe o esforço de ir bem na escola
De entrar numa faculdade boa
De ser gentil e bom com todos
De achar um estágio
De ganhar dinheiro
De amar sua esposa
De nunca trair, sempre se traindo

Eu sei, você não sabe do que penso
Não consigo falar com essa ânsia na garganta

Não consigo falar olhando todo esse nojo
Toda essa luta
Cansei, bebi, cai
Cansei de lutar
Bebi para fugir
Cai contigo nesse chão
Vomito todo o meu caos em porcelana
Vomito meu caos em palavras balbuciadas

***

Adeus, estranho
Vou pra casa e durmo
Esqueço, sumo
Te vejo, não reconheço
Não te reconheço nem revejo o vômito
Sóbria no cansaço da luta
Perdida no espaço do tempo
Nadando no nojo
Lutando para sobreviver

Até cair bêbada, de novo

18/01/19

Tudo: um grande nadaOnde histórias criam vida. Descubra agora